Nota pública: Resolução do CFM com restrição ao aborto legal foge de sua competência e é discriminatória

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05 de abril, 2024 Nem Presa Nem Morta Por Redação

Campanha Nem Presa Nem Morta divulga a seguinte nota pública: Decisão do órgão proíbe médicos de realizarem procedimento necessário para interrupção de gestações acima de 22 semanas em casos de estupro. Grupo mais afetado são crianças até 14 anos

Foi publicada no Diário Oficial desta quarta-feira, 3 de abril, a Resolução CFM Nº 2.378, que proíbe o médico de realizar assistolia fetal, uma das técnicas avalizadas pela Organização Mundial da Saúde para os procedimentos de aborto em caso de gestação avançada.

O CFM contraria a lei brasileira com esta Resolução. Nossa lei não determina prazo limite para a realização do aborto legal e, apesar de não ter valor de lei, a Resolução coloca sob pena de punição qualquer médico ou médica que a contrarie. Na prática, ela dificulta a realização do procedimento e ainda viola a liberdade médica de escolher a melhor forma de tratamento para seus pacientes.

O texto da Resolução é inconstitucional e provoca uma confusão jurídica ao presumir que nosso marco legal protege o direito à vida desde a concepção. A Constituição brasileira não acolheu este conceito. O que nela vigora é que são titulares de direitos as pessoas “nascidas” no Brasil, o que não inclui nascituros.

Além disso, a decisão é discriminatória porque afeta exclusivamente o acesso ao aborto legal por parte das vítimas de estupro. Neste sentido, a população mais prejudicada são crianças de até 14 anos – que são maioria entre as vítimas de violência sexual no país. De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2023, o ano de 2022 registrou o maior número de estupros da história, com aproximadamente 75 mil casos, desses 40.659 vítimas eram crianças entre zero e 13 anos. Não à toa, os números de gestações de crianças também são assustadores: somente no ano de 2022, foram registrados 14.265 nascidos vivos de meninas com menos de 14 anos, lembrando que todo contato sexual com crianças de menos de 14 anos é considerado por lei como estupro de vulnerável, e que certamente nem todos esses casos entram no cômputo do Anuário.

Em tese, todas essas crianças teriam direito a interromper a gestação legalmente. O fato de não acessarem esse direito se relaciona, por exemplo, com problemas de falta de informação, estigma e dificuldade de acesso aos serviços.

Importante destacar que o risco de morte durante a gestação e o parto é 4 vezes maior para meninas abaixo de 14 anos, em comparação com mulheres entre 20 e 24 anos.

Além disso, é comum que crianças, por desconhecimento dos seus sistemas reprodutivos e de seus corpos de maneira geral, estão menos equipadas para identificar uma gestação e, em decorrência, são colocadas em situações de demora na busca pelo direito ao aborto legal.

Também são afetados pela Resolução outros grupos fragilizados que necessitam dos serviços de aborto legal, principalmente pessoas que moram fora das capitas brasileiras. Quatro em cada 10 abortos legais realizados no país acontecem fora da cidade onde a pessoa reside, uma vez que só 2% dos municípios contam com um serviço de aborto legal, o que representa maior dificuldade em acessar o direito nos estágios iniciais da gestação.

Para mais informações e contatos de fontes especializadas de diversas áreas (direito, saúde, políticas públicas), entre em contato com Helena Bertho, Coordenação de Comunidade e Imprensa da Campanha Nem Presa Nem Morta: (11) 98162-1032.

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