(Luciana Araújo/Agência Patrícia Galvão) O documento síntese da 1ª Conferência Regional sobre População e Desenvolvimento da América Latina e Caribe, realizada em Montevidéu, Uruguai, de 12 a 15 deste mês, destaca a plena integração dos povos da região com garantia de direitos e igualdade. Já no título, a declaração do evento afirma que esta é a “chave para o Programa de Ação do Cairo após 2014”.
O foco central da Conferência foi a avaliação dos avanços alcançados pelos países da América Latina e do Caribe em relação ao Programa da Conferência Internacional de População e Desenvolvimento (CIPD), realizada pela ONU no Cairo, em 1994. Os representantes dos governos da região também discutiram propostas e estratégias para atingir os objetivos postos pela CIPD.
A temática de gênero teve destaque no evento. Entre as bases orientadoras dos debates nesta questão estiveram a Plataforma de Ação da Quarta Conferência Mundial sobre a Mulher (Beijing, China, 1995), o Consenso de Quito (resultado da 10ª Conferência Regional sobre a Mulher Latino-Americana e Caribenha, 2007) e o Consenso de Brasília (documento síntese da 11ª Conferência Regional, ocorrida em Brasília, em 2010). Além das orientações para eliminação e prevenção de todas as formas de violência contra aa mulheres da Comissão das Nações Unidas sobre Condição Jurídica e Social da Mulher, de 2013.
O texto síntese afirma que apesar dos significativos avanços obtidos na região na promoção, proteção e garantia dos direitos humanos nos últimos 20 anos, ainda não são asseguradas a todas as pessoas que vivem nos países participantes todas as condições mínimas de sobrevivência digna. “Embora as políticas de inclusão econômica e social tenham ampliado as oportunidades e o bem-estar social, muitas pessoas continuam vivendo em condições de extrema pobreza, enfrentando desigualdades como consequência de arraigados padrões históricos e novas formas de discriminação, e sem o pleno exercício de direitos”.
Na perspectiva de mudança dessa realidade podem ser destacados alguns acordos genéricos, como: o aprofundamento de políticas públicas e ações para erradicação da pobreza e inclusão social; a aplicação das perspectivas de gênero e interculturais no tratamento de questões sobre população e desenvolvimento; o fortalecimento das instituições encarregadas de políticas voltadas às populações e ao desenvolvimento, de forma sustentável, em todos os níveis; e o combate à violência contra a mulher.
Liberdades fundamentais – Em relação à temática dos direitos sexuais e reprodutivos, foram estabelecidos doze pontos de acordo, entre eles: o combate a todas as formas de discriminação; e a promoção de políticas que contribuam para assegurar que as pessoas exerçam seus direitos sexuais – entre eles o da sexualidade plena com respeito às distintas orientações e identidades de gênero – com condições de segurança e saúde.
Destaca-se entre os acordos o que prevê a garantia do acesso universal e humanizado a serviços de saúde sexual e reprodutiva de qualidade, levando em conta as necessidades de homens e mulheres, LGBTs, adolescentes, jovens, adultos e deficientes, e com particular atenção a pessoas em situação de vulnerabilidade e moradores de áreas rurais e remotas, promovendo a participação cidadã na implementação dos compromissos.
Autonomia às mulheres – Além dos direitos sexuais e reprodutivos, o documento destaca ainda o compromisso dos Estados de fortalecer os mecanismos de construção de políticas de desenvolvimento que assegurem a igualdade de gênero e autonomia das mulheres, entre elas a garantia de emprego decente.
A impulsão à participação feminina igualitária nos espaços decisórios, na destinação de recursos das políticas públicas e outros mecanismos de acesso ao poder nos sistemas eleitorais são citados como condicionantes democráticos.
Garantir a corresponsabilidade dos Estados nacionais, do setor privado, das comunidades, famílias e homens no trabalho doméstico e no cuidado não remunerado, integrando-os nos sistemas de proteção social, de forma a garantir tempo livre, bem-estar e dignidade às mulheres é outra meta.
Os recortes de atenção aos direitos das crianças, adolescentes, migrantes, terra e territorialidade, povos indígenas e afrodescendentes também permeiam as intenções firmadas pelos governantes presentes à Conferência.
Outros destaques
O ‘Consenso’ também destaca o acesso à detecção oportuna e tratamento integral aos portadores do vírus HIV e outras doenças sexualmente transmissíveis, sem discriminação e estigmatização, bem como o fortalecimento de políticas de prevenção da transmissão do HIV por mulheres grávidas.
Eliminação da mortalidade materna, medidas para prevenção do aborto inseguro que incluam educação sexual e atenção integral aos casos de gravidez indesejada, modernização das políticas de atenção à contracepção, atendimento pós-aborto com políticas de redução de danos e riscos. Programas voltados também à educação sexual e reprodutiva dos homens. Garantia de serviços de abortamento seguros e de qualidade nos países onde a intervenção foi legalizada – como recentemente ocorreu no Uruguai – e incentivo aos Estados para modificar as legislações sobre abortamento visando salvaguardar a vida das mulheres com dignidade e reduzir os abortos em geral e os clandestinos em particular.
A necessidade de garantir dotação orçamentária e recursos humanos suficientes para assegurar o acesso universal à saúde de qualidade também aparece no documento.
Papel estratégico
E para fazer avançar esta agenda foi reafirmado o papel da Conferência Regional na revisão do Programa do Cairo e das prioridades de sua implementação, inclusive buscando formas de assegurar a participação das organizações da sociedade civil e a criação de mecanismos de monitoramento das políticas públicas.
À próxima cúpula dirigente das Américas será levada também a proposta de harmonização dos indicadores de saúde, com vistas a facilitar as análises de tendências regionais e a comparação de dados entre os diversos países.
À secretaria-Geral Ibero-Americana o documento solicita que siga dando prioridade aos estudos sobre os determinantes e consequências das tendências demográficas para o desenvolvimento regional, sempre com a perspectiva de gênero. Também é cobrado o apoio necessário à realização da Conferência Mundial sobre os Povos Indígenas, marcada para 22 e 23 de setembro de 2014, bem como ao processo preparatório já em curso para a Década Internacional dos Afrodescendentes.
A próxima Conferência Regional, marcada para 2015, acontecerá no México.
Leia aqui a íntegra do documento (em espanhol).