(Agência Brasil, 27/03/2016) Especialistas e entidades ligadas à causa LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e transgêneros) criticam a iniciativa dos vereadores do Recife de proibir livros didáticos que falem de diversidade sexual e dizem que a exclusão desses temas da sala de aula é preconceito.
“Se você é contra qualquer forma de discriminação você não pode excluir essa expressão [homossexualidade] dos livros. Preconceito não é só agressão física”, defende o professor de psicologia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Benedito Medrado.
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“Para mim, é extremamente discriminatório você poder colocar a história de um príncipe e de uma princesa no livro e não poder colocar duas princesas. Então você só está ensinando uma forma de sexualidade. Se você não aceita as possibilidades diversas de expressão da sexualidade está praticando homofobia tanto quanto a pessoa que agride diretamente uma pessoa que beija outra do mesmo sexo. É uma lógica muito sutil. Eu chamo de homofobia cordial”, completou Medrado que integra o Fórum Nacional de Pesquisas em Gênero, Sexualidade e Educação, formado por mais de 80 núcleos de pesquisa de universidades brasileiras.

Livro de ciências para alunos do 5º ano está no centro da polêmica com vereadores sobre ensino de questões de gênero e sexualidade na rede municipal do Recife (Foto: Sumaia Vilela / Agência Brasil)
“Como a gente aprovou recentemente uma lei contra o bullying e vai tirar dos livros didáticos a discussão sobre direitos sexuais? É contraditório”, critica Medrado.
O especialista argumenta que levar a discussão para a escola ajuda a manter os adolescentes seguros. “O fato de não ter no livro didático não vai mudar em nada o acesso à informação. O que vai tirar é qualidade. Eles vão continuar vendo tudo o que veriam no livro didático de uma forma explorada, bem elaborada, bem discutida. Vão ver na internet, sem a possibilidade de intervenção de um profissional de educação que poderia contribuir para tornar a experiência mais saudável. E a gente só contribui de fato para a violência e a discriminação”.
De acordo com a pesquisa Juventudes na Escola, Sentidos e Buscas: Por que frequentam?, feita em 2013 e coordenada pela socióloga Miriam Abramovay, 19,3% dos estudantes da rede pública não gostariam de ter um colega de classe travesti, homossexual, transsexual ou transgênero.
O estudo, feito com o apoio da Organização dos Estados Ibero-americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura (OEI), indicou que esse é o terceiro grupo mais rejeitado na escola, atrás de bagunceiros e puxa-sacos dos professores. Mais da metade (52,5%) dos alunos consultados também se declararam contra o casamento de pessoas do mesmo sexo.
Para Jô Menezes, da organização não governamental (ONG) Gestos, que trabalha com populações vulneráveis a doenças sexualmente transmissíveis e ao vírus HIV, a intenção dos parlamentares é evitar a discussão sobre diversidade sexual.
“O que eles querem defender é que isso não seja discutido, não seja possibilitado porque abre as possibilidades de entender que sexualidade é algo que se sente, que se vive no corpo, mas que está relacionado a várias questões e não pode ser normatizado pela religião x, y ou z”, critica.
Ela também destaca que o Estado brasileiro é laico e, portanto, não poderia ser regido pelos dogmas de representantes de igrejas. “Embora muito mais teórico do que na prática, é um estado laico. Então eu acho que a escola tem sim a possibilidade de fazer uma discussão boa, esclarecedora, sem ser com informações erradas, que mais confundem os jovens do que os deixa livres para viver a sexualidade com responsabilidade”.
Os dois especialistas ouvidos pela Agência Brasil defendem que o conteúdo seja adequado à idade das crianças. “É óbvio que você equaciona a informação de acordo com a geração da criança. Para a quinta série não é o mesmo que para o ensino médio. É proporcional ao número de informações que elas trazem. E muitas vezes a gente trabalha com as dúvidas que chegam, é isso que a gente orienta aos educadores”, explica Benedito Medrado.
Sumaia Villela; Edição: Lílian Beraldo
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