(Rodrigo Pedroso, do Valor Econômico) Em vigor desde o início do ano passado, a segunda fase do programa Minha Casa Minha Vida entregou, até a terceira semana de maio, 2% das 191 mil casas contratadas na faixa 1 do programa, que engloba famílias com renda mensal de até R$ 1.600. Nas faixas 2 e 3, onde não há subsídios diretos do governo para a construção das residências, metade das 490 mil pessoas que assinaram contratos receberam as chaves da nova casa de acordo com dados da Caixa Econômica Federal. A diferença entre os tipos de contrato e a paralisação das contratações na primeira faixa durante nove meses para a revisão de exigências técnicas ajudam a explicar a discrepância.
A segunda fase prevê 2 milhões de moradias, sendo 1,2 milhão para a primeira faixa, 600 mil para a segunda e 200 mil para a terceira. Desse total, 680 mil foram contratadas entre 2011 e maio de 2012.
Com o término das contratações de um milhão de casas na primeira fase do programa ao fim de 2010, o governo reavaliou algumas exigências para a segunda fase. Mudanças técnicas como o aumento do tamanho dos batentes, a exigência de cerâmica de melhor qualidade na obra e o incremento da área construída total foram discutidas com as construtoras.
O martelo do novo modelo foi batido em agosto de 2011, e os contratos para as famílias com menor renda começaram a ser assinados em setembro, segundo Teotonio Costa Resende, diretor de habitação da Caixa. “A faixa 1 ficou totalmente parada. Além disso, nas outras duas faixas, a necessidade é só de financiamento. As empresas começam a construir e depois procuram os clientes. Na primeira, tem que negociar parceria com o município, achar o terreno e o comprador, assinar o contrato e só depois o projeto sai do papel”, diz.
A maior demanda – o Minha Casa 2 tem previsão de contratação total de 2 milhões de unidades até o fim de 2014 – também aumentou a diferença de tempo entre quem espera uma casa comprada pela faixa 1 em relação às outras duas. Na primeira fase, a entrega ficava entre 12 e 15 meses. Agora, o prazo foi prolongado para 24 meses segundo o diretor da Caixa. “A experiência mostrou que não era possível construir 500, 700 unidades em até 15 meses. Só a burocracia entre assinar o papel e começar a construir consome 90 dias.”
A agilidade nas faixas 2 (renda familiar entre R$ 1.600 e R$ 3.100) e 3 (R$ 3.100 a R$ 5.000) fez a MRV Engenharia focar seus negócios quase que exclusivamente na segunda faixa. Construtora do Minha Casa com maior volume de operações até o momento, a empresa assinou contratos que somam R$ 5,8 bilhões de acordo com dados do Ministério das Cidades. Segundo a própria MRV, o programa governamental é responsável por 90% de seus negócios.
O contato direto com o comprador, tendo apenas a Caixa como avaliadora do financiamento e do projeto, sem a necessidade de negociações com outros órgãos do poder público, é um dos motivos que levaram a empresa a focar no segmento dentro do programa. “A rentabilidade na primeira faixa é muito baixa e mesmo assim você só viabiliza um projeto se tiver apoio do município”, afirma o presidente Rubens Menin. Apesar disso, foi justamente o aumento de contrapartidas ao poder público que fez a empresa a registrar lucro líquido menor do que o esperado pelo mercado no primeiro trimestre do ano. O aumento de custos também afetou o lucro, que atingiu R$ 113 milhões de janeiro a março de 2012, contra R$ 153 milhões em igual período de 2011.
Com tempo médio de entrega entre seis e oito meses a partir da assinatura do contrato nas faixas 2 e 3, a MRV tem como público-alvo a nova “Classe C”, segundo Menin. “A maioria da população hoje no Brasil está na segunda faixa. Uma família composta por uma empregada doméstica e um faxineiro já se enquadra nisso”, diz.
Essa percepção parece acertada. Apesar de as famílias de menor renda serem o alvo de 60% da meta de construção de casas na segunda fase do programa federal, o maior volume de contratação ficou até agora no perfil explorado pela MRV: 433 mil unidades (63% do total contratado), principalmente no Sudeste e no Nordeste, com 235 mil unidades já entregues.
Os municípios mais populosos do país estão encontrando dificuldades em contratar na primeira faixa, especialmente São Paulo, onde o terreno é mais caro. Mesmo com o subsídio de R$ 20 mil por habitação do governo do Estado, há menor “atratividade” nesse tipo de casa, que possui preço-teto de R$ 65 mil, de acordo com Sergio Watanabe, presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo (Sinduscon-SP). “O programa tem melhor desempenho na faixa 2. A questão do preço é fundamental para atrair construtoras. Aquelas que pegam a primeira faixa estão construindo fora das capitais.”
A Emmcamp Residencial, terceira construtora com mais negócios ligados ao programa, atua majoritariamente na primeira faixa. Apesar da rentabilidade menor, a empresa ganha na quantidade de unidades vendidas, que até agora renderam R$ 1 bilhão em contratos, segundo o ministério. Atualmente, ela está construindo 20 mil unidades, e prevê entregar 30 mil este ano. André Campos, vice-presidente comercial da Emmcamp, reconhece que há maior burocracia, mas afirma que ela acontece só até a aprovação do projeto. A diferença entre as entregas nas faixas se dá no modelo de negócios. “Na primeira fase assina-se quando só tem mato no terreno. Por isso que demora até dois anos.”
O descompasso nas faixas também é registrado no Minha Casa Minha Vida 1, onde não houve a paralisação na primeira faixa. Até maio, 38% das 418 mil unidades habitacionais contratadas na faixa 1 tinham sido entregues. Nas faixas 2 e 3, das 497 mil casas, 72% estavam prontas para ser habitadas.
A previsão de Teotonio Costa Resende é que praticamente todas as 404 mil unidades restantes do Minha Casa 1 estejam finalizadas até o fim do ano. “O que vai sobrar é residual”, diz, para depois considerar normal a extensão do prazo em alguns casos. “Até o momento foram contratadas 1,7 milhão de unidades em todo o programa. É natural haver atraso nas três faixas. Tivemos problemas com mão de obra e material de construção. Mas o importante é que está sendo tudo entregue até o prazo limite.”
Acesse em pdf: Minha Casa 2 só entrega 2% das casas para baixa renda (Valor Econômico – 06/06/2012)