(Terezinha, Vicente, da Ciranda de Comunicação Compartilhada) “O feminismo antirracista e anticapitalsta, que luta pela igualdade e pelo fim da opressão das mulheres, tem propostas para a humanidade e é uma força organizada em todo o mundo”.
Infelizmente, pelas distâncias do espaço onde acontece a Rio+20, é impossível acompanhar as duas. Com um pé lá e outro cá, o governo brasileiro tem estruturas e programação intensa nos dois territórios. Já estamos vendo a propaganda da “economia verde” na mídia, e vamos prestar mais atenção, como os grandes meios de comunicação cobrirão o evento, como apresentarão os dois campos de idéias propostos aqui para o mundo. O nosso campo está bem servido de mídias livres e milhares de redes sociais e tentaremos popularizar as posições dos povos representados por seus movimentos sociais. Rádio e TV Cúpula, Laboratório de Comunicação Compartilhada estão presentes transmitindo tudo, acontece neste final de semana o II Fórum Mundial de Midias Livres, onde feministas de todos os continentes participarão.
Antiga divergência no FSM, que alguns tentam renovar nesta Cúpula, é o debate sobre tirar ou não resoluções politicas conjuntas. Entretanto, um dos principais objetivos estabelecidos deixa claro: “produzir agenda comum de lutas mundiais e posições convergentes, construídas a partir do que os movimentos sociais e organizações da sociedade civil trazem de acúmulo e processos em curso, que se traduzem durante o processo de preparação da Cúpula dos Povos e durante a Cúpula”. É um desafio, pois nem sempre a aprovação de datas, campanhas e mobilizações comuns se traduzem no mesmo empenho de todas as organizações para o sucesso das agendas. Mas é preciso construir alianças e diálogos entre temas que não se encontram normalmente, e entre organizações de mesmo tema, pois sabemos que as conquistas se darão num mesmo patamar.
Da organização local para a global
Para melhor atuarem na Cúpula, as principais organizações de mulheres estiveram preparando suas militantes nos últimos tempos. “Além da alegria, da irreverência, dos conteúdos para os debates políticos, da energia, da criatividade, do espirito de construção coletiva”, como nos conta Analba Brazão, da AMB – Articulação de Mulheres Brasileiras -, “a lista de coisas para trazer na mala não foi pequena”. Colchonetes, roupa de cama e banho, chapéus e bonés, protetor solar, calçado bom para caminhar, garrafa para água e caneca para não aumentar a poluição de descartáveis estão também na lista enviada nas instruções da MMM – Marcha Mundial das Mulheres. São as duas maiores redes brasileiras de mulheres preparando suas ativistas para ficarem bem no RJ e terem energia para as muitas atividades, dentro e fora do Território das Mulheres.
Agora é reta final, a preparação feminista foi muito além disso, com a realização de seminários, oficinas, rodas de conversa, debates a respeito dos temas da Rio+20, por ambas as organizações. “Fizemos atividades de preparação das militantes da Marcha em pelo menos nove estados (SP, MG, RN, RS, PB, PE, CE, RJ, TO)”, nos conta Tica Moreno, da MMM/SP e sua representante no Grupo de Articulação da Cúpula. “Foram atividades de formação, mas também de preparação de materiais, da batucada, etc.”, explica a jovem ativista, contando que no dia 5 de junho (um dos dias de manifestação global), dia do meio ambiente, “fizemos colagem de lambe lambe com os dizeres ‘pro feminismo, o capitalismo não tem eco’, ‘não a violência: nem no lar nem nuclear’, entre outras”. Além das brasileiras, a Marcha terá representantes das Filipinas, Moçambique, Argentina, Chile, Peru e Cuba.
Aproveitar as viagens, às vezes bem longas, para “enriquecer a nossa agenda política rumo à Rio+20, fazendo mini-oficinas e rodas de diálogos, ensaiar as ‘palavras de desordens’ do caderninho da AMB”, recomenda a ativista da região amazônica. 250 mulheres da AMB e da AMNB (Articulação Mulheres Negras Brasileiras) viajaram para o Rio desde o dia 14, em cinco Caravanas: Pará, Ceará e Paraíba; Rio Grande do Norte e Pernambuco; Goiás e Brasília ; Mato Grosso do Sul e Mato Grosso, para se unirem as outras tantas do Rio e adjacências. Elas ficarão “hospedadas” numa escola – CIEP Tancredo Neves – e compartilharão esse espaço com 260 ativistas da Via Campesina e do MST, homens e mulheres, e 40 mulheres da África do Sul.
As 900 militantes da Marcha Mundial de Mulheres ficarão alojadas no Sambódromo, junto com outras delegações dos movimentos sociais, totalizando 10 mil pessoas. Por isso, nos vários ônibus a caminho, devem eleger companheiras para fazer parte das várias equipes de trabalho no alojamento, que será de responsabilidade coletiva. “Cada delegação também deve organizar coletivamente os símbolos de nossa luta, as bandeiras, estandartes, ‘pirulitos’, faixas, tambores, latas e batuques”, orienta a Marcha. “Assim, nossa atuação e visibilidade na cúpula será alegre, colorida, animada, irreverente e militante. Entre as manifestações massivas, faremos intervenções feministas na cidade, denunciando a mercantilização do corpo e da vida das mulheres que é parte da ofensiva do capital sobre nossos territórios”.
Tradição nos encontros onde está a AMB, a “CASA FEMINISTA” ocupará desta vez apenas metade de uma escola. É lá que as militantes desta Articulação se prepararão para participar das assembléias, plenárias, debates e mobilizações de rua. “Mas além das atividades de convergência e das grandes mobilizações gerais, também faremos outras manifestações nas ruas do centro do Rio de Janeiro, nos outros dias da Cúpula, com a presença das Loucas de Pedra Lilás e das Tambores de Safo”, nos conta Analba.
Feminismos e movimentos sociais
“Feminismo, Agroecologia e Soberania Alimentar: construindo um novo paradigma de sustentabilidade da vida humana” é a única atividade autogestionada proposta pela MMM, embora participe de outras. Será no dia 16 na tenda 10 – Dorcelina Folador. A organização feminista está também na coordenação da assembleia de convergência do eixo 5 – “Trabalho, por outra economia e novos paradigmas de sociedade”. Tica explica o motivo da escolha. “Nossa análise parte da economia feminista e da critica à divisão sexual do trabalho como estruturante desse sistema capitalista e patriarcal. Entendemos que nossa agenda feminista precisa ir além da visão dos impactos sobre as mulheres neste momento, estamos identificando como a opressão das mulheres é parte dos mecanismos de reprodução e implementação desse modelo”.
“Nosso corpo nosso território”, é talvez a insígnia mais identificada com a AMB, que tem priorizado o espaço só de mulheres. “Temos a convicção de que este tipo de ação fortalece e enriquece o feminismo e a nosso próprio movimento e por isso mesmo, fortalece a construção do poder popular e a rearticulação internacional das lutas por transformação social”, diz o seu manifesto.
Estamos cientes de que os movimentos de mulheres e o nosso campo feminista no Brasil, América Latina e no mundo, possui como riqueza e desafio a pluralidade de lutas e sujeitos, as possibilidades de fortalecer alianças e articulações baseadas na autonomia desde nossas diversidades”. No Território Global, haverá diariamente a “Tribuna das Mulheres”, onde se debaterão todos os eixos das plenárias de convergência.
Convergência feminista
Estamos aqui cobrando dos governos, e em particular do governo brasileiro, o compromisso com a mudança do modelo de produção que continua fomentando a intensificação da exploração capitalista do trabalho e a destruição da natureza”, diz o texto.
O direito à comunicação e à liberdade de expressão também são percebidos como estratégicos pelas feministas. “Agimos circulando informação e cultura para quebrar o bloqueio da comunicação concentrada nas mãos de poucas empresas que tentam impor uma ‘verdade’ única”. O fato é que boa parte do que é produzido hoje é totalmente desnecessário para uma vida humana digna e feliz.
A maioria das indústrias é prejudicial para o planeta e não pensa sua produção para a maioria da humanidade. Contra a mercantilização da vida e da natureza e em defesa dos bens comuns, as mulheres querem “um mundo pleno de igualdade, autonomia, dignidade e prazer”.