(Pastoral Carcerária, 29/06/2015) Em 1997, quando a Pastoral Carcerária intensificou seu trabalho específico com as mulheres encarceradas, percebeu-se que era como se não houvesse mulheres no sistema prisional. Era como se houvesse somente 200 mil homens presos e que alguns deles precisavam de absorvente de vez em quando.
As especificidades femininas não eram (e ainda não são) minimamente respeitadas no cárcere. A única garantia: unidades precárias. O sistema prisional e o sistema de “justiça” foram desenhados por homens, para homens e são administrados por homens. Não se considerou a possibilidade de que as mulheres podem ter necessidades diferentes, desejos diferentes, responsabilidades diferentes, e até o que as leva ao delito pode ser diferente em relação aos homens.
A Pastoral Carcerária, assumindo a questão das mulheres encarceradas, questionou essa realidade: quem são as mulheres encarceradas? O que as motiva? O que as angustia? E como fazer uma pastoral mais adequada e efetiva com elas?
Nestes anos, fomos descobrindo que não há uma condição homogênea que defina “a mulher encarcerada”. Segundo o Departamento Penitenciário Nacional (Depen), havia cerca de 36.000 mulheres nos presídios do Brasil em 2014, um aumento de 256% nos últimos 12 anos. Há uma diversidade de necessidades, problemas, motivações e culturas entre elas. Como sempre na Pastoral Carcerária, procuramos acompanhar as mulheres numa maneira que apoia e, às vezes, contribui para a reconstrução da pessoa. Além de buscar a justiça, procuramos garantir os direitos da pessoa e provocar o Estado, a sociedade e a Igreja a enxergar as mulheres como seres humanos, cidadãs e sujeitas de suas próprias vidas.
Em comum com a população prisional masculina, a população feminina é majoritariamente jovem, com escolaridade baixíssima (a maioria com o ensino fundamental incompleto) e presa por tráfico de drogas. Enquanto o delito mais comum entre os homens ainda é o roubo, no caso das mulheres, mais de 60% responde à acusação de tráfico de drogas, ou já estão presas por tráfico. Importante chamar atenção ao fato de que a grande maioria dos delitos é de crimes não violentos, especialmente crimes contra o patrimônio ou tráfico de drogas, nos quais a mulher é somente a chamada “mula”.
E passados estes 18 anos de um trabalho mais intenso da Pastoral junto às mulheres encarceradas, podemos listar algumas inquietações e angústias comuns entre as presas: quem está cuidando do meu filho? Como cuidar dele à distância? Corro risco de perder a guarda? Que assistência teria na gravidez e durante a amamentação dele quando nascer? Tudo isso sem falar da falta de assistência médica e acesso à assistência de saúde mental; da superlotação das unidades prisionais femininas e com estruturas precárias das unidades mistas – com homens e mulheres; a distância da própria família que dificulta mais ainda as poucas visitas que recebem. Isso sem falar na falta de acesso à justiça em geral, que é uma doença crônica no sistema penal no Brasil, tanto para homens quanto para mulheres.
Irmã Petra Silvia Pfaller
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