(Folha de S.Paulo) Para os cidadãos, a mudança radical será na compreensão de que podem solicitar dados quando lhes aprouver, e sem precisar explicar suas razões
No último dia 5 de dezembro, a ANJ (Associação Nacional de Jornais), o Consulado dos Estados Unidos em São Paulo, a Unesco e a CGU (Controladoria-Geral da União) realizaram no auditório da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing), na cidade de São Paulo, o Seminário Internacional de Acesso à Informação Pública.
Especialistas brasileiros debateram a nova Lei de Acesso à Informação Pública, recém-sancionada pela presidente Dilma Rousseff, e convidados estrangeiros analisaram as experiências sobre o tema em diversos países. Assim como aconteceu lá fora, podemos antever no Brasil uma revolução com a implantação da nova legislação, que começa a vigorar em maio de 2012.
O Estado precisará ter grande transparência diante da sociedade que o custeia, colocando à disposição dos cidadãos todas as informações de interesse público.
Sabemos que não será um processo fácil, pois as mudanças se referem ao governo federal, aos Estados e aos municípios, bem como aos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Como bem lembrou a diretora de prevenção da corrupção da Controladoria-Geral da União, Vânia Vieira, serão necessários investimentos e treinamento de pessoal.
E será fundamental, acima de tudo, uma profunda mudança de cultura dos agentes públicos, a serem conscientizados do dever que têm de informar os cidadãos.
Para eles, a mudança radical estará na compreensão plena de que as informações públicas não pertencem aos órgãos públicos.
Não estando taxativa e justificadamente classificadas como sigilosas, as informações não poderão ser negadas, e ao solicitante não será exigida a explicação sobre o uso de tais dados. Para os cidadãos, a mudança radical será na compreensão de que eles podem solicitar dados quando lhes aprouver, sem a necessidade de explicar a razão dessa solicitação. As informações pertencem aos cidadãos.
Para a imprensa, trata-se também de uma nova perspectiva. Esta Folha, por exemplo, já foi obrigada a entrar em juízo para obter informações públicas, de interesse dos cidadãos. Mas -é importante deixar claro- para a ANJ, muito mais do que a possibilidade de que jornais e jornalistas tenham maior acesso às informações de interesse público, a luta por essa legislação sempre esteve relacionada ao direito de todos os cidadãos.
Assim como a ANJ defende a plena liberdade de expressão como um direito da sociedade, e não apenas de jornais e jornalistas, lutamos pelo pleno acesso às informações públicas porque esse é um princípio básico da democracia.
Os especialistas estrangeiros presentes ao seminário, cada um falando sobre a experiência de implantação de legislações de acesso às informações públicas em seus países, deixaram claro que é um processo gradativo, com muitos obstáculos, mas que tudo depende da capacidade de mobilização da sociedade.
Na África do Sul, por exemplo, embora há mais de dez anos exista uma legislação específica para o acesso às informações públicas, cerca de 70% dos pedidos dos cidadãos são ignorados. Já o México criou órgão especializado em atender a esses pedidos, e tudo é feito com grande eficiência por meio da internet.
Cabe então agora a todos nós -imprensa, entidades representativas dos diversos setores da sociedade, academia etc.- cobrarmos a implantação efetiva da nossa legislação de acesso às informações públicas. Somos nós, cidadãos, os maiores interessados.
Somos nós que faremos acontecer essa verdadeira revolução cultural no Estado brasileiro.
JUDITH BRITO é presidente da ANJ (Associação Nacional de Jornais) e diretora-superintendente da Empresa Folha da Manhã S.A., que edita a Folha.
Acesse em pdf: Acesso à informação, revolução cultural, por Judith Brito (Folha de S.Paulo – 12/12/2011)