(O Globo) Mas aumento da escolaridade não iguala renda devido ao cuidado com filhos
Da família de nove filhos, dois deles mulheres, Liandra Caldasso foi a única que fez faculdade. Não parou. Depois que a gaúcha de Camaquã, cidade de economia agrícola a cem quilômetros de Porto Alegre, formou-se em Economia pela Universidade Federal de Rio Grande, veio para o Rio fazer mestrado na Universidade Federal Rural do Rio (UFRRJ). Novamente, não quis parar:
— Eu queria completar a etapa seguinte, de doutorado, até porque me interessava trabalhar na área acadêmica.
Tornou-se doutoranda na Pós-Graduação em Políticas Públicas (PPED) do Instituto de Economia da UFRJ. E um exemplo de outro destaque das tabulações feitas pelo GLOBO nos dados do Censo 2010 do IBGE: a proporção de mulheres cursando mestrado e doutorado subiu de 43% em 2000 para 53% em 2010, o que fez com que a presença feminina ultrapassasse a de homens nos níveis mais altos de ensino. A proporção de mulheres também subiu na graduação, de 53% para 57%.
— Minha mãe era dona de casa e foi criada para isso. Mas, por essa razão mesmo, sempre me mostrou a educação como alternativa ao caminho que ela tinha tomado — conta Liandra, hoje professora de Economia da UFRRJ, e que crê que não só a escolaridade influencia a renda: — Há o peso sociocultural de achar que o cuidado com filhos e a casa são tarefas femininas.
Afazeres domésticos e cuidado com filhos e outros dependentes tiram das mulheres boa parte de sua competitividade, e fazem com que o aumento da escolaridade não seja suficiente para igualar renda com homens, destaca Hildete Pereira de Melo, professora de Economia da UFF:
— É a diferença entre entrar no mercado de trabalho e fazer carreira — define Hildete, que, com Lena Lavinas, professora do Instituto de Economia da UFRJ, fez um estudo sobre renda feminina com base na Pnad de 2009: — Vimos que, mantendo-se o ritmo atual de aumento da renda feminina, levaríamos cerca de 50 anos para homem e mulher se igualarem. O aumento da escolaridade é importante, mas não suficiente para contrabalançar o fato de a mulher ser a responsável pela reprodução da vida. Isso só vai mudar com mais creches e escolas em tempo integral.
Essa sobrecarga da mulher no lar prejudica o tempo disponível que ela tem para se dedicar ao mercado de trabalho, o que faz com que a mulher trabalhe, em média, menos horas do que os homens. Quando se olha para o tempo dedicado dentro de casa, no entanto, a sobrecarga feminina é significativa, mesmo quando se considera apenas pessoas que têm uma ocupação.
A Pnad, outra pesquisa do IBGE, mostra, por exemplo, que homens ocupados dedicam apenas cinco horas semanais para atividades como cozinhar, limpar a casa ou cuidar dos filhos. Entre mulheres igualmente ocupadas, a média sobe para 21 horas semanais.
Frente a isso, um caminho encontrado pelas mulheres para entrar no mercado tem sido o trabalho precário, seja pela informalidade ou pelo tempo parcial. Segundo estudo inédito da professora Lena Lavinas, da UFRJ, “as mulheres dominam o emprego de tempo parcial em praticamente todos os países.
— Além disso, na maioria das nações desenvolvidas, as mulheres são mais numerosas entre os altamente escolarizados. Porém, as áreas em que se encontram são dominantemente de serviços, e não produtivos — diz Lena. — Elas estão ainda fora da área de ciência e tecnologia, e isso muda tudo.
Acesse em pdf: Mulheres ultrapassam homens em cursos de mestrado e doutorado (O Globo – 13/05/2012)
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