O que as feministas defendem?

16 de julho, 2014

(Carta Capital, 16/07/2014) Aí está uma pergunta em que cabem as mais variadas respostas. Mas a pergunta é importante e muito bem-vinda, especialmente para quem deseja entender melhor do que se trata, afinal, o feminismo. Se você está entre essas pessoas, espero que continue a leitura!

Eu poderia fazer um texto expondo as pautas feministas de um modo geral, mas isso não me cabe; há várias correntes dentro do feminismo, com pensamentos e posicionamentos distintos. Não há “o” feminismo, mas vários feminismos.

Leia mais: Feminismo para donas de casa (Revista Fórum, 15/07/2014)

Claro, não posso falar por todas as feministas. Somos um movimento diverso e em constante construção. Mas posso, ao menos, falar sobre o feminismo que tento construir diariamente, baseada em tudo que já ouvi, aprendi e continuo aprendendo com tantas feministas que admiro.

Abaixo, listo, de forma resumida, algumas ideias e pautas feministas (claro que não dá para falar de todas somente neste texto, né) que guiam a luta que escolhi – que, espero, possa também ser a sua:

– Mulheres são pessoas. Portanto, merecem direitos iguais;

– Mulheres devem ganhar salários iguais aos dos homens no desempenho da mesma função;

– Mulheres não devem ser discriminadas no mercado de trabalho e suas oportunidades não devem ser limitadas aos papéis de gênero que a sociedade impõe sobre elas;

– Não é obrigação da mulher cuidar da casa, dos filhos e do marido. Os afazeres domésticos e cuidado com as crianças devem ser de igual responsabilidade para homens e mulheres;

– Nenhuma mulher é uma propriedade. Nenhum homem tem o direito de agredir fisicamente ou verbalmente uma mulher, ou ainda determinar o que ela pode ou não fazer;

– O corpo da mulher é de direito somente da mulher. A ela cabe viver a sua sexualidade como bem entender, decidir como vai dispor de seu corpo e da sua imagem, com quem ou como vai se relacionar;

– Qualquer ato sexual sem consentimento é estupro. Nenhum homem tem o direito de dispor sexualmente de uma mulher contra a vontade dela;

– Nunca é culpa da vítima;

– Assédio de rua é uma violência. A mulher tem o direito ao espaço público (e também ao transporte público) sem ser constrangida, humilhada, ameaçada e intimidada por assediadores;

– A representação da mulher na mídia não pode nos reduzir a estereótipos que nos desumanizam e ajudam a nos oprimir;

– Mulheres não são produtos. Não podem ser tratadas como mercadoria, isca para atrair homens, moeda de troca ou prêmio;

– A representação das mulheres deve contemplar toda a sua diversidade: somos negras, brancas, indígenas, transexuais, magras, gordas, heterossexuais, lésbicas, bi, com ou sem deficiências. Nenhuma de nós deve ser invisível na mídia, nas histórias e na cultura;

– A voz das mulheres precisa ser valorizada. A opinião das mulheres, suas vivências, ideias e histórias não podem ser descartadas ou consideradas menores pelo fato de serem mulheres;

– O espaço político também é um direito da mulher. Devemos ter direito ao voto, a sermos votadas, representadas politicamente e a termos nossas questões contempladas pelas leis e políticas públicas;

– Papéis de gênero são construções sociais e não verdades naturais e universais. Nenhum papel de gênero deve limitar as pessoas, homens ou mulheres, ou ainda permitir que um gênero sofra mais violência, seja mais discriminado, tenha menos direitos e considerado menos gente;

– Mulheres trans são mulheres e, portanto, são pessoas. Todas as pessoas merecem ter sua identidade respeitada;

– Se duas mulheres decidem viver juntas (ou dois homens), isso não é da conta de ninguém e o Estado deveria reconhecer legalmente essas uniões;

– Não existe tal coisa como “mulher de verdade”. Todas as mulheres são bem reais, independente de se encaixar em algum padrão;

– Mulheres não existem em função de embelezar o mundo. Muito menos em função da aprovação masculina;

– Amar o próprio corpo e se sentir bem com a própria aparência não deve depender dos padrões de branquitude e magreza que a sociedade racista e gordofóbica determinou como “beleza”;

– Mulher não “tem que” nada, se não quiser. Isso vale para ser “amável” ou falar palavrão, fazer sexo ou não fazer, se depilar ou não depilar, usar cabelo grande ou curto, “encontrar um homem” ou ficar solteira, sair com vários caras ou preferir mulheres, ter filhos ou não ter, gostar de maquiagem ou não (e por aí vai em todas as regras que cagam ou possam vir a cagar sobre nossas vidas).

***

Certamente há muitas outras coisas que cabem aqui. Só para você ter ideia de quanto trabalho tem o Escritório Feminista: são muitas frentes para lutar e a cada dia surgem novas.

Acredito que por esses poucos itens já dá pra ter uma ideia de que o feminismo não é nenhum monstro comedor de criancinhas.

Uma pena que quem esteja de fora, muitas vezes, não seja capaz de ver a importância dessas transformações e tenha mil ideias erradas sobre as feministas (a começar achando que somos todas iguais e pensamos do mesmo jeito).

O movimento, por mais diverso que seja, parte de uma ideia simples e, convenhamos, mais do que justa: mulheres também são pessoas.

Então é possível resumir dizendo que as feministas defendem a humanidade das mulheres.

Não seria nada de mais, se não fosse em um mundo onde tanta gente luta diariamente justamente para tirar isso de nós.

***

Para tirar outras dúvidas sobre feminismo, leia meu FAQ Feminista.

Acesse no site de origem: O que as feministas defendem? (Carta Capital, 16/07/2014)

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