Desde 2016, a lei determina que mulheres em prisão preventiva grávidas ou com filhos de até 12 anos podem cumprir a pena em casa
A ministra Maria Thereza, do Superior Tribunal de Justiça, acolheu na sexta-feira (24) uma liminar para que a ex-primeira-dama do Rio de Janeiro Adriana Ancelmo passe a cumprir prisão domiciliar. A esposa do ex-governador Sérgio Cabral (PMDB) estava detida preventivamente em Bangu 8, zona oeste da capital do Estado, desde dezembro de 2016.
(Nexo, 27/03/2017 – acesse a íntegra no site de origem)
A decisão, sob a justificativa de que os filhos do casal estavam sem os cuidados do pai e da mãe (ambos presos), foi antecedida por um vaivém jurídico. No dia 17 de março, o juiz da 7ª Vara Federal Criminal do Rio, Marcelo Bretas, permitiu a ida de Adriana Ancelmo para casa. A liminar foi revogada em seguida por um desembargador do Tribunal de Justiça do Rio, sob o argumento de que a prisão domiciliar representava uma “quebra de isonomia com as milhares de mães presas que não recebiam o mesmo benefício”. Agora, o STJ confirmou a liberação.
Em meio às decisões, veio à tona o debate sobre a impunidade no Brasil e a situação das mulheres encarceradas – a maior parte delas negra, pobre e sem acesso aos mesmos direitos que a ex-primeira-dama.
O que diz a lei sobre prisão domiciliar para mulheres
Desde 2016, com a implementação do Marco Legal da Primeira Infância, a lei brasileira autoriza que grávidas e mães com filhos de até 12 anos tenham a prisão provisória convertida em prisão domiciliar – Adriana Ancelmo tem um filho de 11 anos e um de 14. O direito é também estendido a homens que comprovem serem os responsáveis pela criação das crianças. Na prática, no entanto, o código não é aplicado como deveria pelo Judiciário.
São hoje 34 mil mulheres presas no Brasil, o que representa 7,4% do total de presos do país, segundo o relatório “Mulheres sem Prisão”, feito pelo ITTC (Instituto Terra, Trabalho e Cidadania). Cerca de 80% delas são mães e cumprem pena em regime fechado – embora não haja informações que precisem a idade dos filhos e sobre quantas mulheres deveriam estar em prisão domiciliar.
Segundo o relatório “Mulheres sem Prisão”, há nos boletins de ocorrência uma supressão de informações sobre a maternidade, o que dificulta a implementação da lei.
Entre 2000 e 2010, houve um aumento de 261% da população feminina presa, mais que o dobro da população masculina. A maioria dessas mulheres não possui antecedentes criminais, têm dificuldade de acesso a empregos formais, é jovem, negra e foi presa devido a algum envolvimento com o tráfico de drogas.
Perfil das mulheres encarceradas no Brasil
50% tem apenas o ensino fundamental
50% tem entre 18 e 29 anos
68% são negras
57% são solteiras
O caso de Adriana Ancelmo
A ex-primeira-dama do Rio de Janeiro está presa preventivamente desde dezembro de 2016, no Complexo Penitenciário de Gericinó, em Bangu, zona oeste carioca.
Ela é ré em seis processos da operação Lava Jato, acusada de participar de um esquema de corrupção liderado por seu marido, Sérgio Cabral Filho (PMDB), governador do Estado entre 2007 e 2014. Mas ainda não está condenada. Ancelmo responde por corrupção, lavagem de dinheiro, pertencimento a organização criminosa e evasão de divisas.
No dia 17 de março, Bretas concedeu o benefício da prisão domiciliar com o argumento de que os filhos do casal estavam sendo privados simultaneamente do convívio do pai e da mãe – Cabral também está preso em Bangu. As crianças estão atualmente sob cuidados do irmão, filho mais velho do ex-governador, o deputado federal Marco Antônio Cabral (PMDB).
A condição para que Ancelmo volte para a casa é a de que ela não tenha acesso a telefone, nem internet. Visitas devem ser autorizadas pela Polícia Federal e deixarem seus próprios eletrônicos na portaria, antes de entrar no apartamento – que passou por uma inspeção.
No dia 20 de março, no entanto, o desembargador federal Abel Gomes suspendeu a liminar, dizendo que a decisão poderia “criar expectativa” para outras mulheres presas. A defesa de Ancelmo então recorreu ao STJ (Superior Tribunal de Justiça), que reafirmou a decisão inicial de Bretas.
Beatriz Montesanti