(Opera Mundi, 24/05/2014) “O debate eleitoral em torno de políticas para as mulheres não existe na Colômbia”. A afirmação feita pela politóloga colombiana Lina María Cabezas a Opera Mundi revela uma das faces da campanha presidencial em um país em que mais da metade dos eleitores é do sexo feminino. Pela primeira vez em sua história, duas candidatas disputam o máximo cargo no país e outras duas concorrem à vice-presidência.
Mas, “as mulheres continuam tendo enormes obstáculos para construir carreiras políticas exitosas, pelo menos no plano eleitoral”, completa Lina. A Colômbia só aprovou o voto feminino em 1954 e foi o último país na América do Sul a adotar uma política de cotas no Executivo e Legislativo, em 2011.
Embora representem quadros da esquerda e da direita, respectivamente, as candidaturas de Clara López, em quarto lugar, e Marta Lucía Ramírez, em quinto, não ultrapassam 10% das intenções de voto, segundo as últimas pesquisas divulgadas.
Candidaturas
Aída Avella disputa a vice-presidência na chapa do Polo Democrático encabeçada por Clara. Ambas participam ativamente da política colombiana desde a década de 1980, quando militaram na União Patriótica, nascida de um acordo entre as FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) com o governo de Belisario Betancur (1982-1986). Na ocasião, mais de quatro mil militantes da UP foram mortos em ações realizadas pelo Estado e grupos paramilitares.
Marta Ramírez, se eleita, vai criar um Ministério para a Mulher e a Família, além de lutar pela equidade de salários. Foto: Campanha/ Reprodução
Marta Lucía Ramírez, candidata pelo Partido Conservador, também é uma política experiente. Foi vice-ministra de Comércio, embaixadora da Colômbia na França e a primeira e única Ministra de Defesa da história do país.
Já Isabel Segovia concorre junto com Enrique Peñalosa da Aliança Verde, como vice. Apesar de ocupar o terceiro lugar nas pesquisas, a chance de os verdes chegarem ao segundo turno não é descartada, frente às recentes denúncias que abalaram a candidatura de Óscar Iván Zuluaga e do presidente Juan Manuel Santos, que concorre à reeleição.
Lina ressalta que a presença feminina no Congresso aumentou, passando de 19,8% em 2010 para 32,7% nas eleições parlamentares de 2014. Apesar disso, no Índice de Desenvolvimento de Gênero criado pela ONU, o país aparece atrás de Cuba — país com maior quantidade proporcional de mulheres na política —, Costa Rica, Argentina e Brasil.
Violência de gênero
Na região com a maior quantidade de mulheres chefes de Estado do mundo, “a Colômbia ainda dá pouca importância ao voto das mulheres”, diz a doutora em Ciência Política. As postulações, no entanto, são um “claro avanço”. “A visibilidade de uma candidata a presidente e a vice-presidente tem um poder simbólico e prático que não pode ser ignorado”, ressalta Lina.
O avanço verificado no campo simbólico, no entanto, não se observa no debate em torno de políticas públicas para as mulheres. “Basicamente o debate não existe, nem em torno das mulheres, nem em torno de muitos outros temas”.
Na América Latina, embora tenha maior participação na força de trabalho, são as mulheres que apresentam os maiores índices de analfabetismo, a menor representação política e uma participação ainda incipiente na ciência e tecnologia. Também são as principais vítimas de violência doméstica e familiar. Segundo estimativas da OMS (Organização Mundial de Saúde), uma em cada quatro mulheres é vítima de abusos sexuais cometidos por seu parceiro ao longo da vida.
A Colômbia ostenta um dos maiores índices de violência de gênero da região, agravado pela existência do conflito armado que já dura mais de 50 anos. De acordo com a Unidade para a Atenção e Reparação Integral das Vítimas, quase três milhões de mulheres foram mortas no contexto da luta armado no país, o que equivale a 49,7% do total de vítimas. Além disso, até novembro de 2013, as mulheres representavam 84,9% das vítimas de violência sexual no marco do conflito armado.
De acordo com dados do Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses, a cada 11 minutos uma mulher é agredida por seu companheiro ou ex-companheiro. A cada meia hora uma mulher é vítima de violência sexual. Somente em 2012, 138 mulheres foram assassinadas por motivação de gênero.
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