ENTREVISTA: Silvia Camurça, socióloga, coordenadora da ONG SOS Corpo: Instituto Feminista para a Democracia e da Articulação de Mulheres Brasileiras

09 de julho, 2013

SilviaCamurca150(Agência Patrícia Galvão) Socióloga avalia que pesquisa pode ajudar os políticos, os parlamentares, os dirigentes partidários e a própria mídia a compreender que a população quer uma democracia muito mais democrática do que a que eles mesmos são capazes de propor

Gostaria que você comentasse a contundência com que a reforma política e a demanda por mais espaço para as mulheres no sistema político brasileiro aparecem na pesquisa, especialmente tendo em vista que o levantamento foi feito antes desse processo de manifestações que recolocaram esse tema na pauta nacional.
Silvia – Há uma grande decepção e incômodo da população em geral com a situação da política brasileira. Há também muita decepção de expectativas e críticas em relação às alianças dos partidos. Uma crítica cada vez mais presente sobre o poder econômico influenciando os resultados eleitorais. Acho que isso está na raiz da contundência desse desejo de que é preciso sim reformar o sistema político e o sistema eleitoral.
O valor que se deu à necessidade de aumentar a representação das mulheres, acho que é resultado de uma ação direta do próprio feminismo de que há uma sub-representação. E que, portanto, não nos sentimos representadas por um parlamento que não expressa a diversidade brasileira, tem poucas mulheres, poucos negros, pouca gente da classe trabalhadora e muita gente do setor empresarial, poucos trabalhadores rurais e uma bancada ruralista cada vez maior. Esse sentimento vai sendo construído como consciência social a partir das críticas que os movimentos sociais e também o feminismo vêm fazendo a essa democracia representativa que não nos representa inteiramente ou representa apenas alguns setores com muita força mas não o conjunto da população com a proporção que cada segmento populacional tem na realidade. Um crescimento da consciência social sobre a distância entre as regras da democracia representativa e a sociedade real que existe.

IPG – E como você avalia a visão crítica em relação aos partidos que aparece na pesquisa?
Silvia – Acho que a proposta que aparece na pesquisa das pessoas concordando com a punição aos partidos que não cumprirem, por exemplo, cotas eleitorais demonstra mais uma vez que o parlamento está muito aquém da sociedade que ele pretende representar. Porque outras pesquisas feitas por outros setores dentro do parlamento apontava um grande número de parlamentares contrários à punição aos partidos. Ou seja, os parlamentares têm uma opinião oposta à da sociedade. Ou seja, a população, no senso comum, reconhece que os partidos poderiam dar mais espaço às mulheres espontaneamente, mas reconhece também que não farão isso e vai precisar de uma legislação para regulamentá-los. E uma legislação que puna.
O senso comum que veio da pesquisa demonstra muito mais consciência crítica do que é o sistema patriarcal no contexto político, onde os partidos detêm o controle da política e os homens detêm o controle dos partidos. Como também me chamou a atenção o indicativo de que as mulheres tenham mais espaço dentro dos partidos.

IPG – Por que você avalia que existe essa expectativa pela valorização das mulheres na política?
Silvia – Acho que a base disso está no desejo de renovação da vida política. As pessoas estão muito cansadas de parlamentares que fazem das sucessivas reeleições a sua vida. Como a gente não tem no nosso sistema político o limite ao número de mandatos, que é uma das reivindicações populares, as pessoas estão cansadas de verem vereadores em suas cidades há mais de 25 anos. Quer dizer, um monopólio da política, que mantém uma ocupação de quase 70% os mesmos. E as pessoas estão pedindo a renovação, novos quadros, sejam mulheres, indígenas, quilombolas, homens, gays, lésbicas. Enfim, a diversidade da população. Mas o sistema facilita a vida de quem já é parlamentar e dificulta a entrada de pessoas comuns na vida parlamentar. E a população está cansada disso. E nós mulheres somos um indicador de renovação porque estamos quase excluídas da política institucional.
Também há, talvez, uma avaliação de que quem nunca esteve na política ao entrar tem a possibilidade de ser menos corrompido por ela e, portanto, de renovar positivamente as práticas políticas. E acho que isso é transferido às mulheres.

IPG – E como você avalia que esse resultado pode incidir sobre o debate que está sendo retomado no país, da reforma política e da ampliação do espaço às mulheres?
Silvia – Acho que essa pesquisa nesse momento veio a calhar porque mostra como a reforma política é necessária e como a sociedade está atenta à necessidade desta mudança. Inclusive, a reforma da maneira de pensar a política. Porque todas as propostas que foram aventadas e ajudam a democratizar o poder estão fora do debate neste momento. E o que eu chamo de democratizar o poder é mudar as regras de forma que mais gente possa participar dos espaços de poder institucionais, através das eleições. O que, sem dúvida, favorece isso é a mudança na forma de votar. A lista fechada e com alternância de sexo, já está demonstrado em vários países democráticos, há um amplo consenso, que efetivamente obriga a uma democratização do poder. A Argentina já está com 36% de mulheres no parlamento graças a esse tipo de votação. Então, penso que a pesquisa pode ajudar os políticos, os parlamentares, os dirigentes partidários e a própria mídia a compreender que a população quer uma democracia muito mais democrática do que a que eles mesmos são capazes de propor.

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