Procuradora do trabalho Adriane Reis de Araújo é a convidada do primeiro episódio da série sobre a violência e o assédio contra mulheres no trabalho
Para 71% da população brasileira, as mulheres têm menos oportunidades que os homens no mercado de trabalho e também costumam ter salários menores que os homens, mesmo ocupando os mesmos cargos. É o que revela a pesquisa Percepções sobre violência e assédio contra as mulheres no trabalho, realizada pelo Instituto Patrícia Galvão e Instituto Locomotiva com apoio da Laudes Foundation. Segundo o levantamento online, as trabalhadoras brasileiras também são as principais vítimas de violência, assédio e constrangimento no ambiente de trabalho.
Para comentar os dados da pesquisa, o novo episódio do podcast da Agência Patrícia Galvão recebeu a procuradora do trabalho Adriane Reis de Araújo, atual titular da Coordenadoria Nacional de Promoção da Igualdade e Eliminação da Discriminação no Trabalho (Coordigualdade), do Ministério Público do Trabalho. Confira alguns trechos da conversa:
Sobre os desafios no enfrentamento à violência e ao assédio
A maior dificuldade que nós temos no enfrentamento da violência e do assédio em relação às mulheres é justamente romper com o silêncio dessas mulheres. Por isso que iniciativas como o #MeToo, em que se relatam essas violências, são tão importantes, porque a vítima, ao se deparar com esses relatos, percebe que ela não está sozinha, que aquele fato não é um fato isolado que ela vivenciou.
A sociedade brasileira é uma sociedade extremamente violenta contra as mulheres. (…) Essa sociedade violenta, para fora dos muros da empresa, continua dentro da própria empresa — a empresa está inserida dentro dessa sociedade. Então, o mais importante seria uma modificação da compreensão dentro das cortes trabalhistas brasileiras, de perceber que incumbe ao empregador demonstrar que ele adotou todas as medidas para evitar aquela violência e o assédio, que ele sancionou o agressor, que ele deu voz à vítima e evitou qualquer tipo de represália a essa vítima. Com essas medidas efetivas de repressão à violência e o assédio, certamente a mulher brasileira se sentiria mais tranquila em fazer essa denúncia.
Sobre remuneração menor e informalidade
As mulheres têm menos oportunidades no mercado de trabalho, seja menos oportunidade em setores [como o de tecnologia, por exemplo], seja maior dificuldade de promoção na carreira, que é o que nós chamamos de teto de vidro ou de labirinto de vidro. Tudo isso resulta em uma remuneração menor. Também, quando há uma dificuldade maior de compatibilidade da vida profissional e da vida pessoal, muitas mulheres são empurradas ao mercado de trabalho informal, que é mais precário e tem uma pior remuneração.
Sobre os impactos do racismo estrutural
Não é à toa que nós temos hoje um número bastante expressivo de trabalhadoras domésticas que são mulheres negras — cerca de 68%. E eu trago aqui o trabalho doméstico, porque dentro da nossa sociedade é o que tem 70% de informalidade. É um trabalho precário, muito mal remunerado e desvalorizado dentro da nossa sociedade.
Sobre a sobrecarga do trabalho doméstico e de cuidados
As mulheres não podem se vestir desse título de super mulher. O resultado disso é um desgaste mental acentuado às mulheres, é uma situação de stress acentuado e isso gera um impacto dentro das carreiras profissionais, seja com a interrupção dessa carreira, seja com a redução da produtividade dessa trabalhadora.
E esses fatores, que são domésticos, precisam ser levados em conta pelos empregadores como um mecanismo de redução da discriminação da mulher no ambiente de trabalho e essa é uma situação tão corrente, tão frequente, que há inclusive a Convenção 156 da OIT, que prevê os direitos dos trabalhadores com responsabilidades familiares, exigindo uma conciliação, um cuidado maior dos empregadores para a conciliação da vida doméstica e da vida profissional.
Saiba mais sobre a pesquisa
A pesquisa Percepções sobre violência e assédio contra as mulheres no trabalho foi realizada pelo Instituto Patrícia Galvão e Instituto Locomotiva, com apoio da Laudes Foundation, em outubro de 2020. O levantamento online contou com a participação de 1.500 pessoas, entre homens e mulheres maiores de 18 anos de todo o Brasil. Para saber mais, acesse aqui.
Veja também:
O vídeo e o webinário Violência e assédio contra mulheres no trabalho da Agência Patrícia Galvão.