A diferença de cinco anos na idade mínima de aposentadoria entre homens e mulheres no Brasil pode afetar negativamente os salários femininos ao longo da vida profissional, assim como benefícios previdenciários, poupanças e perspectivas de carreira. A avaliação é do Banco Mundial, em relatório sobre impacto da legislação na inclusão econômica das mulheres.
(Valor Econômico, 14/05/2018 – acesse no site de origem)
“Quando se aposenta mais cedo, a mulher encerra a carreira mais cedo. Isso tem o efeito negativo no tempo de contribuição, assim como gera menor renda na aposentadoria”, disse Paula Tavares, especialista em gênero do Banco Mundial, durante apresentação do relatório na Fundação Getulio Vargas (FGV), no Rio.
Pesquisadora da FGV EPGE (Escola Brasileira de Economia e Finanças), Cecila Machado acrescentou que a diferença da idade mínima para a aposentadoria também pode reproduzir estereótipos. “Se as mulheres podem se aposentar mais cedo, talvez eles pensem que elas podem realizar mais trabalhos domésticos”, disse a pesquisadora, que também participou do evento.
Originalmente divulgado em março, o relatório comparou a legislação de 189 países em sete diferentes temas relacionados à desigualdade de gênero. Em 41 desses países, as mulheres podem se aposentar com benefícios integrais de um a dez anos antes dos homens. Em 13 países, incluindo o Brasil, as mulheres se aposentam com benefícios parciais antes dos homens, segundo o estudo.
A equiparação da idade mínima de aposentadoria para homens e mulheres chegou a ser proposta pelo governo na reforma da Previdência. O tema enfrentou, no entanto, resistências durante sua tramitação no Congresso. Parte da crítica é que a diferença de cinco anos de aposentadoria é uma forma de compensação pela desigualdade de gênero, como a dupla jornada feminina .
No relatório, o Banco Mundial deu notas à legislação brasileira — e à legislação dos demais países pesquisados — considerando seus impactos sobre inclusão econômica das mulheres. Foram sete eixos abordados: acesso às instituições, uso da propriedade, acesso ao emprego, incentivos ao trabalho, acesso aos tribunais, acesso ao crédito e proteção da mulher contra a violência.
Na escala de zero a cem pontos, o Brasil recebeu nota 64 no eixo “acesso ao emprego”, abaixo da média de países latino-americanos e caribenhos (68 pontos) e de integrantes da OCDE (90 pontos), grupo que reúne os países mais desenvolvidos do mundo. Essa nota baixa reflete não apenas a diferença na aposentadoria, mas também outros fatores relacionados às leis trabalhistas.
O documento menciona que não existe no país legislação prevendo a licença parental, que permite repartir a licença entre pai e mãe. No Brasil, a legislação prevê 120 dias de licença-maternidade, mas apenas cinco dias de licença-paternidade. “O sistema de licença parental é adotado em 58 economias, mas não no Brasil. Isso poderia incentivar a divisão de tarefas”, disse Paula Tavares.
Além disso, as leis brasileiras não estabelecem a igualdade de remuneração para homens e mulheres na mesma função, assim como não prevê jornadas flexíveis no mercado de trabalho, o que permitiria às mulheres melhor conciliar sua dupla jornada. “Também não existe lei que diga que o empregador não pode perguntar para uma mulher se ela pretende ter filho ou não”, disse a advogada.
A especialista do Banco Mundial defendeu a adoção de cotas para mulheres em conselhos de administração e cargos de direção de modo a ampliar a participação feminina no mercado de trabalho. “Ocorre melhora na participação de mulheres onde existem cotas.”
O Brasil recebeu nota baixa também no quesito “proteção da mulher contra a violência”. Na escala de zero a cem, o país teve nota 50, bem abaixo da média dos países da OCDE (70) e aquém dos demais países latino-americanos e caribenhos (61 pontos). Apesar do avanço do arcabouço jurídico com a Lei Maria da Penha, de 2006, a pesquisa apontou “lacunas” na proteção legal de mulheres e meninas.
Segundo o relatório, o Código Civil tem brechas que permitem o casamento de meninas com menos de 18 anos, idade legal para o matrimônio no Brasil. Além disso, a instituição lembrou que o Código Penal brasileiro dispõe sobre o crime de assédio sexual no trabalho, mas não trata especificamente do assédio sexual na esfera da educação.
Bruno Villas Bôas