Ciberdelinquência de gênero no Brasil: desafios e respostas legais, por Galtiênio da Cruz Paulino

14 de abril, 2025 Jota Por Galtiênio da Cruz Paulino

Legislação brasileira avança, mas ainda enfrenta lacunas na aplicação e na proteção efetiva de mulheres e meninas

A transformação da sociedade das últimas décadas, por meio da “revolução digital”, trouxe profundas mudanças nas formas de interação social, profissional e política. Junto aos benefícios da conectividade emergiram novas formas de violência, entre elas a ciberdelinquência de gênero, que atinge de forma desproporcional mulheres e meninas. Essa forma de violência é caracterizada por ataques realizados por meio de tecnologias da informação e comunicação, como redes sociais, aplicativos de mensagens e outras plataformas digitais, e engloba práticas como assédio, ameaças, divulgação de conteúdo íntimo sem consentimento, perseguição, humilhação e incitação ao ódio.

Dados internacionais evidenciam a gravidade do problema. Uma pesquisa realizada em 2020 pela World Wide Web Foundation com participantes de 180 países revelou que 52% das mulheres jovens e meninas já sofreram abusos online, como o compartilhamento não consentido de imagens, vídeos ou mensagens privadas, linguagem ofensiva, ameaças, assédio sexual e divulgação de conteúdos falsos. Além disso, 64% dos entrevistados afirmaram conhecer alguém que foi vítima dessas práticas.

Outra pesquisa, realizada em 2019 pela Delegación Contra la Violencia de Género, com 10.000 participantes, indicou que 7,4% das pessoas com 16 anos ou mais já haviam recebido mensagens inapropriadas, humilhantes ou intimidatórias por meio das redes sociais. Quando se consideram apenas os casos de assédio sexual, 18,4% das vítimas relataram que esse tipo de violência ocorreu no ambiente digital.

Tomando o Brasil como referência, constatou-se, segundo uma pesquisa realizada em 2020 pela ONG Plan International, que 77% das meninas e jovens mulheres brasileiras relataram ter sofrido algum tipo de assédio virtual. Esse percentual é significativamente superior à média global de 58%, indicando uma prevalência alarmante desse tipo de violência no país.

No Brasil, o enfrentamento da ciberdelinquência de gênero é feito com base em um conjunto de leis que, embora não unificadas sob uma legislação específica, oferecem respaldo jurídico para a responsabilização dos agressores e proteção das vítimas. A Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006), voltada à proteção das mulheres contra a violência doméstica e familiar, também tem sido utilizada em casos de violência no ambiente digital, especialmente em situações de violência psicológica e moral, como ameaças, chantagens e humilhações por meio de redes sociais e aplicativos. Com a promulgação da Lei nº 14.188/2021, a violência psicológica contra a mulher foi expressamente incluída no Código Penal, por meio do artigo 147-B, permitindo sua aplicação direta em contextos virtuais.

A Lei Carolina Dieckmann (Lei nº 12.737/2012), por sua vez, tipifica os crimes cibernéticos, como a invasão de dispositivos eletrônicos, sendo fundamental em casos de violação de privacidade, vazamento de dados ou fotos íntimas de mulheres. Já a Lei de Importunação Sexual (Lei nº 13.718/2018) criminaliza a divulgação não consentida de cenas de estupro, nudez ou sexo, prática recorrente nos casos de “revenge porn” (pornografia de vingança), com previsão de pena de 1 a 5 anos de reclusão, conforme o artigo 218-C do Código Penal.

A perseguição online, conhecida como stalking virtual, também é abordada pela Lei nº 14.132/2021, que criminaliza esse tipo de conduta, caracterizada por monitoramento constante, ameaças e invasões de privacidade por meio digital. Além disso, o Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014), embora não seja uma norma penal, estabelece princípios, garantias e deveres para o uso da internet no Brasil, incluindo a possibilidade de remoção de conteúdos ofensivos que violem direitos da personalidade, o que se aplica diretamente a casos de violência contra a mulher no ambiente virtual.

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