Relatório mostra que elevação da temperatura global piora gravidade e prevalência de agressões por parceiros íntimos; estudo aponta aumento de 28% nos casos de feminicídio durante ondas de calor; outras consequências incluem taxas mais altas de casamento infantil, tráfico de pessoas e exploração sexual.
As mudanças climáticas podem ser responsáveis por um em cada dez casos de violência de gênero entre parceiros íntimos até o final do século.
Esse é o alerta de um novo relatório da Iniciativa Spotlight das Nações Unidas, que aponta que a crise do clima está intensificando fatores sociais e econômicos que alimentam o crescimento da violência contra mulheres e meninas.
Elevação da temperatura contribui com aumento de casos
Segundo o estudo, a cada aumento de 1°C na temperatura global, há um acréscimo de 4,7% nos casos de violência entre parceiros íntimos.
Em um cenário de aquecimento de 2°C, estima-se que 40 milhões de mulheres e meninas adicionais passem a sofrer esse tipo de violência a cada ano até 2090. Em um cenário de 3,5°C, esse número mais do que dobra.
O relatório identifica que eventos climáticos extremos, deslocamentos, insegurança alimentar e instabilidade econômica aumentam a prevalência e a gravidade da violência baseada em gênero, especialmente em comunidades onde as mulheres são mais vulneráveis.
Esse tipo de agressão já é considerado uma epidemia global, segundo o relatório. Mais de um bilhão de mulheres, pelo menos uma em cada três, já sofreram abuso físico, sexual ou psicológico em algum momento da vida. Apenas 7% registram denúncia formal à polícia ou aos serviços de saúde.
Desastres aumentam riscos de violência
A Iniciativa Spotlight identificou um padrão de aumento da violência no período posterior a desastres climáticos.
Somente em 2023, cerca de 93,1 milhões de pessoas foram afetadas por desastres climáticos e terremotos, e mais de 423 milhões de mulheres sofreram violência por parceiro íntimo. À medida que os choques climáticos se tornam mais frequentes e severos, o risco de violência tende a aumentar de forma expressiva.
Por exemplo, um estudo citado no relatório apontou um aumento de 28% nos casos de feminicídio durante ondas de calor.
Outras consequências incluem taxas mais altas de casamento infantil, tráfico de pessoas e exploração sexual, especialmente após deslocamentos causados por enchentes, secas ou desertificação.
Comunidades marginalizadas
O levantamento indica que mulheres e meninas em situação de pobreza, incluindo agricultoras familiares e residentes de assentamentos urbanos informais, enfrentam vulnerabilidades maiores.
Mulheres indígenas, com deficiência, idosas ou que fazem parte da comunidade Lgbtq+ também sofrem riscos sobrepostos, com acesso limitado a serviços, abrigos ou proteção.
Na África Subsaariana, projeções indicam que a violência entre parceiros íntimos poderá quase triplicar, passando de 48 milhões de mulheres em 2015 para 140 milhões até 2060, caso as temperaturas aumentem em 4°C.
No entanto, sob um cenário que limite o aquecimento a 1,5°C, a proporção de mulheres afetadas poderá cair de 24% em 2015 para 14% em 2060.