(Portal da USP, 16/04/2014) Pesquisa realizada na Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (EERP) da USP aponta que a maioria das gestantes que sofrem Violência por Parceiro Íntimo (VPI), quando questionadas, não se considera vítima, porém afirmam já ter sofrido violência por deixar de cumprir tarefas do lar, como lavar a louça ou fazer o jantar. Essa percepção dificulta a procura por ajuda e favorece a continuidade da violência.
Segundo a pesquisadora Driéli Pacheco Rodrigues, um dos fatores que pode levar a maioria delas a não classificar empurrões e socos como violência é o convívio precoce com a violência, como agressões entre familiares, gerando a ideia que essa situação é algo “ruim”, mas comum. “Além disso, muitas acreditam que violência é só aquela que aparece no jornal, como assassinatos, estupros e roubos”, conta a pesquisadora.
Com 232 participantes, a dissertação Violência por parceiro íntimo contra a gestante: estudo sobre as repercussões obstétricas e neonatais, orientada pela professora Juliana Cristina dos Santos Monteiro, traz o perfil dessas mulheres bem como orientações sobre os mecanismos de defesa contra a violência feminina.
Com os dados coletados no Centro de Referência à Saúde da Mulher (CRSM-MATER) e no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (HCFMRP) da USP, nos meses entre maio e dezembro de 2012, os resultados da pesquisa apontam que mulheres negras ou pardas, que não têm mais parceiro e fazem, eventualmente, uso de bebida alcoólica, apresentam mais chances de sofrer VPI durante a gestação. O tipo de violência mais vivido por elas foi a psicológica, seguida por física e sexual.
Gestação e violência
Quando a gestação é indesejada tanto pela mulher quanto pelo atual parceiro, as chances de sofrer VPI aumentam 4,3 vezes. Se comparado com os parceiros que têm 30 anos ou mais, aqueles que estão na faixa etária de 15 a 18 anos têm 5,5 vezes mais chances de praticarem VPI contra a gestante.
“O estudo procurou analisar a violência e saber se ela estava relacionada com algum problema na gravidez e parto ou para o recém nascido”, conta Driéli, porém os resultados não apontaram ligação entre os dois aspectos. “Nessa população não foi verificada tal associação, mas outras variáveis se mostraram associadas à violência e outros estudos apontam seus efeitos prejudiciais para a mulher e a criança, assim os profissionais de saúde devem estar atentos para detectar e dar suporte às mulheres nessa situação.”
“Por que não manda esse homem embora?”, “Tem que ir na delegacia denunciar!”, “Ela apanha porque quer”. Comentários como esses são muito ouvidos por essas mulheres, porém, Driéli salienta que a questão não é tão simples assim. Além de muitas vezes não compreenderem que a agressividade de seus parceiros é violência, elas também acreditam que é direito do homem fazer isso, pois, segundo a enfermeira, a questão da desigualdade de gênero ainda é muito forte. “A maioria delas foi educada para aceitar qualquer atitude do seu marido”, completa. Na maioria das vezes a sociedade aponta apenas duas possibilidades: A mulher rompe com a violência pela denúncia ou continua apanhando. Já a pesquisadora vê novos caminhos que podem ser traçados por meio de orientação: “Precisamos mostrar os mecanismos de defesa e orientá-las, para que assim sintam-se fortalecidas e consigam mudar sua realidade”, diz a enfermeira.
Criada em 2006 e batizada como Maria da Penha, a lei nº 11.340/06 protege as mulheres da violência doméstica e acaba, teoricamente, com a impunidade dos agressores. Apenas a mulher pode denunciar a situação. “Não podemos tomar nenhuma atitude por ela, temos que apontar as possibilidades e fornecer apoio para que ela possa escolher o que quer fazer”, afirma a pesquisadora. “Ao contrário do que diz o senso comum, nenhuma mulher gosta de sofrer violência. Devemos tentar entender os fatores que fazem com que ela continue nessa situação para que possamos ajudá-la da melhor forma”, conclui Driéli.
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