(El País, 18/01/2015) O primeiro colégio em Reino Unido para estudantes lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros pode abrir suas portas em Manchester nos próximos três anos. A escola pública acolheria 40 alunos em período integral e 20 em meio período, que continuariam o grosso de sua formação em estabelecimentos de ensino convencionais. O anúncio foi feito pela organização beneficente LGBT Youth Northwest, que acaba de receber uma subvenção da Administração local para transformar em escola um centro comunitário que administra. Por enquanto, esclarecem, trata-se apenas de um plano em fase de consultas prévias.
“Abrimos um processo de consultas com a comunidade LGBT, entre outras coletividades, para determinar em que querem que transformemos nosso centro de Manchester no futuro”, explica por e-mail ao EL PAÍS a diretora operacional do LGBT Youth Northwest, Sally Carr. “Até a data, os próprios jovens homossexuais, bissexuais e transgêneros têm se manifestado a favor da opção de criar, no futuro, um centro educativo inclusivo, onde possam estudar livres do medo ao preconceito”.
A organização atualmente concentra sua atividade em estabelecimentos de ensino convencionais. “No ano passado, trabalhamos com mais de 10.000 escolas por todo o noroeste da Inglaterra”, explica Carr. “Qualquer centro educativo alternativo que criarmos no futuro estará aberto a alunos de todos os gêneros e sexualidades, e será um lugar livre de homofobia”.
Seria uma escola alternativa, financiada pela Administração local, para onde as autoridades educativas poderiam encaminhar os alunos para os quais a educação convencional não funciona. A ideia é oferecer um currículo sob medida para cada aluno, que incluiria técnicas de trabalho da auto-estima. O colégio seria especializado em jovens LGBT, mas estaria aberto a outros alunos. Um curso custaria cerca de 16.000 libras (64.000 reais), o mesmo que em outras escolas especializadas. Mas a organização defende que, em longo prazo, representaria uma economia para a Administração.
Pouco mais da metade dos alunos gays no Reino Unido sofreram bullying por sua orientação sexual, segundo um estudo realizado pela organização beneficente Stonewall, e 60% afirmam que os professores que presenciam os episódios de bullying nunca intervêm. Segundo o mesmo estudo, 99% dos jovens gays escutam linguagem homofóbica diariamente nas escolas britânicas.
Das pessoas que sofrem perseguição por sua orientação sexual, 60% consideram que isso tem um impacto direto em seu rendimento escolar. E até 41% declaram já ter tentado ou pensado em se matar como consequência dessas perseguições. No entanto, segundo Stonewall, nos cinco anos em que o estudo foi conduzido nas escolas britânicas (o último foi 2013), os dados melhoraram: a porcentagem de alunos alvo de bullying homofóbico baixou 10 pontos desde 2007.
O projeto é inspirado no modelo do instituto Harvey Milk, em Nova York, a primeira escola do mundo com essas características, batizada em homenagem ao ativista californiano assassinado em 1978. O instituto começou a funcionar em 1985, mas desde 2003, graças a uma subvenção do então prefeito Michael Bloomberg, o ensino que ministra é oficial e financiado com dinheiro público.
“O que estamos tentando fazer aqui é salvar vidas”, explica ao The Guardian a diretora estratégica da organização, Amelia Lee. “Apesar das leis que supostamente protegem os gays da perseguição homofóbica, o certo é que, sobretudo nas escolas, isso ainda é incrivelmente comum e faz os jovens se sentirem isolados e alienados, o que frequentemente leva à evasão escolar e, no pior dos casos, ao suicídio”.
Ainda está recente na memória de Manchester o caso de Elizabeth Lowe, a jovem de 14 anos que se enforcou em um parque da cidade em setembro, incapaz de superar o temor de reconhecer publicamente sua condição homossexual. “Não se trata de criar um pequeno enclave seguro, afastado do mundo real”, explica Lee. “Mas temos um sistema educativo que conduz entre 5% e 10% dos alunos ao fracasso, porque rotineiramente é incapaz de reconhecer e incorporar as necessidades dos jovens em conflito com suas identidades. Podemos esperar que todas as escolas se tornem inclusivas ou podemos reconhecer que ainda não chegamos aí e que, no momento, precisamos de escolas especializadas”.
Pablo Guimón
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