(Rede Brasil Atual, 14/06/2016) Para professor de Relações Internacionais da PUC-SP, ataque à boate Pulse, em Orlando, resulta da radicalização do ódio em um país que abriga grupos violentos de direita há mais de um século
A violência doméstica é um dos fatores que está por trás das chacinas praticadas nos Estados Unidos, como a da madrugada de domingo (12), em Orlando, que deixou 49 mortos e 53 feridos da comunidade LGBT na boate Pulse. “O assassino nesse caso era violento com a mulher. Batia na mulher e chegou até a fazê-la de refém. Há um histórico de violência”, diz o professor de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP) Reginaldo Nasser sobre o autor do crime, Omar Mateen, 29. Mateen trabalhava para a empresa de segurança GS4. Essa empresa atua não só com segurança privada, mas também em conflitos armados como no Afeganistão e Iraque.
Nasser diz que os Estados Unidos passam por um processo de radicalização de grupos de direita “cuja extremidade lógica é matar alguém”. O pesquisador também refuta a tese de que a pessoa se torne violenta por conta apenas de ideias. “As crenças e as ideologias articuladas por um grupo podem canalizar a violência, mas elas não criam a violência no sentido de instaurá-la”, afirma. Ele considera também que no caso dos Estados Unidos há uma estrutura social que induz à violência: “Você tem crimes de ódio, homofobia, racismo e centenas de grupos que propagam sistematicamente essa visão de mundo. Isso inclusive proliferou depois da eleição do Obama, como se sua eleição estivesse perturbando a sociedade norte-americana”.
Para o professor, é um erro que a discussão se dê em torno das possíveis motivações. “E em vez de as pessoas ficarem buscando o que a pessoa lê, o que é doutrinado, conta mais a história de vida da pessoa”, defende Nasser. “Neste caso, é uma ação isolada, mas na medida que outros praticam essa ação isolada há uma regularidade. Portanto, é um fato social.” O professor lembra que o país tem um histórico de grupos radicais de direita e cita a Ku Klux Klan, que surgiu em 1865 como uma fraternidade de armas voltada a aterrorizar os negros. “Nos Estados Unidos, historicamente você vai achar grupos de ódio, de extermínio, é um negócio impressionante, isso sempre tem”, diz Nasser.
“Há uma cultura bélica nos Estados Unidos, alimentada por um imaginário, de ir ao mundo, atacar o mal, e você pega o histórico de envolvimento dos Estados Unidos nas guerras do mundo isso fica evidente. Tudo isso é muito ventilado na sociedade, como se fosse resolver o mal. É uma coisa meio missionária”, afirma o professor. Ele também diz que a pessoa que faz esses ataques assume uma posição de representar para si mesma e para a sociedade “o princípio moral absoluto”.
Um pesquisador norueguês chamado Johan Galtung estudou os conflitos sociais e concluiu que sob a violência visível, como a dos fatos criminosos por motivações de ódio, há uma violência invisível que pressiona a pessoa a tomar tais atitudes. “Nós só tomamos contato com a visível, mas a invisível tem duas variáveis, a estrutural e a cultural – essas são as que massacram a pessoa no dia a dia. E algumas pessoas diante disso reagem com violência física. É uma reação inadequada, claro, mas a pessoa está reagindo”, observa Nasser.
Helder Lima
Acesse no site de origem: Histórico de violência doméstica é fator comum em chacinas nos EUA (Rede Brasil Atual, 14/06/2016)