Psicólogo, psiquiatra e delegada comentam a violência contra a mulher

11 de julho, 2016

(Terceira Via, 11/07/2016) Nem de longe a violência doméstica se limita aos pobres e sem educação formal

No Brasil, uma em cada cinco mulheres considera já ter sofrido alguma vez “algum tipo de violência de parte de algum homem, conhecido ou desconhecido”. Segundo o Ministério da Saúde, em 2015, uma média de 49 mulheres foram atendidas por dia na rede pública e privada de saúde após serem vítimas de estupro.

Este mês, a atriz e ex-modelo de 54 anos Luiza Brunet registrou queixa contra o companheiro, Lírio Albino Parisotto, por agressão. Já uma aposentada de 72 anos nunca registrou na delegacia as agressões sofridas pelo marido por um período de 30 anos.

Segundo especialistas, quando celebridades tornam a violência doméstica pública, encorajam outras mulheres a denunciarem também. Em contrapartida, a maioria das vítimas não acredita nas penalidades da Lei Maria da Penha – que completou 10 anos na última sexta-feira (8).

A violência doméstica atinge todas as classes sociais e escolaridades e é, talvez, a violência mais democrática desse país. Luiza Brunet é bem sucedida, rica, famosa e com uma família bem estruturada. Maria Alice tem 72 anos, nasceu em uma família pobre. Porém, formou-se professora, fez pós-graduação e mestrado. Casou-se aos 35 anos com um advogado conhecido da cidade onde moram. Ganhava  quatro vezez mais que o marido. Luiza e Maria pertencem a mundos completamente diferentes. Mas as duas concordam em uma coisa: é constrangedor ir a uma delegacia denunciar o companheiro agressor.

Maria conta que chegou a ir a uma delegacia denunciar o marido após uma agressão que resultou na fratura do nariz. “Minha filha estava disposta a denunciar o pai. Já meu filho chorava copiosamente. Depois da denúncia eu sabia que teríamos que nos mudar. Mas, pra onde? Além do mais, eu ajudei a comprar a casa onde moramos. E se ele alegasse abandono de lar? E se meus filhos deixassem de amar o pai? Pesei isso tudo e desisti de denunciar”. Maria destaca que, na delegacia, os funcionários olhavam pra ela como se tivesse merecido aquela surra.

“Não era uma delegacia especializada para mulheres. Os investigadores e policiais de plantão passavam e me olhavam como se me condenassem. Eu via nos olhos deles ‘alguma coisa você fez para merecer’. Meu marido não dava um motivo que justificasse as agressões. Chegava bêbado, acendia a luz do quarto, mandava eu levantar e começava a sessão de xingamentos, socos e chutes”, relata Maria. Atualmente, o casal vive junto e a aposentada sofre agressões verbais e psicológicas. “Aguentei até aqui. Não é agora que vou largar”, afirma.

Para o psicólogo Rony Rangel, nem de longe a violência doméstica se limita aos pobres e sem educação formal – isso é um mito que perpetua um preconceito de classe. “A mulher foi e ainda é muito educada a ser amável, dócil, submissa e supõe-se disso que apanhe porque fez algo de errado. Inclusive, nós tendemos a ser preconceituosos e, muitas vezes, ao ouvirmos um caso de violência doméstica, pensamos automaticamente que a vítima fez por merecer, pensamento esse que precisa ser desconstruído, pois ele acaba por fortalecer os agressores e aqueles que os defendem”.

Rangel ainda ressalta o medo que a mulher desenvolve de possível represália por parte do agressor, aliado à falta de credibilidade na Lei Maria da Penha. “A vítima não confia nas instituições. Ela não acredita que o juiz ou a polícia vá manter o agressor preso e ela permanecerá exposta”.

A violência cometida contra as mulheres de classe baixa é mais visível, não só pelo testemunho de vizinhos, que com frequência ouvem as agressões, mas também porque as famílias pobres “resolvem” o problema nas delegacias.

O psiquiatra campista Gabriel Escoccard reforça que é importante que os casos cheguem ao conhecimento da polícia para que o agressor seja penalizado.  “As mulheres precisam acreditar no poder da lei Maria da Penha que veio trazer maior demanda de denúncias pela ideia de se frear a impunidade e tornar cidadãos de qualquer nível social alcançáveis pelos braços da justiça. Ainda vive-se em um mundo onde a cultura machista insiste em manter-se de pé”.

A titular da delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (Deam), Ana Paula,  reforça que a mulher não pode conceber a ideia de que as agressões tenham um limite. “Um tapa na cara ou um empurrão. Independe se ele (agressor) estava alcoolizado ou nervoso. Não interessa. Na primeira agressão, na primeira ameaça, é preciso denunciar”, disse Ana Paula lembrando que as denúncias de casos de violência contra a mulher podem ser feitas através do telefone 180.

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