Oito anos da Lei Maria da Penha: mulheres estão mais confiantes para denunciar agressores

07 de agosto, 2014

(Sul21, 07/08/2014) Nesta quinta-feira (7), a Lei Maria da Penha completa oito anos de existência. A legislação é considerada um marco nas conquistas de direitos das mulheres e um passo importante no combate à violência doméstica no país, que vitimiza dez mulheres a cada dia, segundo o IBGE. A cada ano, mais de um milhão de mulheres são vítimas de violência doméstica no Brasil.

A farmacêutica bioquímica Maria da Penha | Foto: ABr

A farmacêutica bioquímica Maria da Penha foi agredida pelo marido e inspirou o nome da lei (Foto: ABr)

A Lei 11.340, de 2006, recebeu o nome da mulher que se tornou símbolo de resistência após sofrer diversas agressões de seu ex-marido, que tentou matá-la duas vezes e em uma delas a deixou paraplégica. Ele passou dois anos na cadeia e ela atualmente se dedica ao combate à violência contra as mulheres.

O texto foi formulado a partir de uma proposta elaborada por diversas ONGs (Advocacy, Agende, Cepia, Cfemea, Claden/IPÊ e Themis) e depois redigido por um grupo interministerial do governo federal, coordenado pela Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM), e enviada ao Congresso Nacional.

Dentre as inovações da Lei, está a tipificação das formas de violência doméstica, divididas em física, psicológica, sexual, patrimonial e moral. O texto possibilita prisão preventiva quando houver riscos à integridade da mulher; torna obrigatório que o agressor compareça em programas de recuperação e reeducação; determina a criação de juizados especiais de violência doméstica e familiar contra a mulher; permite prender o agressor em flagrante; prevê ações de conscientização e prevenção à violência; entre outras medidas.

No Rio Grande do Sul, a implantação da Lei é feita por meio da Rede Lilás, que coordena ações com a participação de instituições de acesso à segurança, à saúde, à educação, à assistência social. As ações acontecem a partir de Coordenadorias, Centros de Referência, Casas-abrigo e da Patrulha Maria da Penha, que atua fiscalizando o cumprimento da medida protetiva de urgência quando solicitada pelas vítimas de violência doméstica, fazendo visitas regulares à casa da vítima e prestando atendimento no pós-delito. Se necessário, também a encaminha para uma casa-abrigo e monitora o agressor.

Nesta terça-feira (5), o governo do Estado implantou a Patrulha em Santana do Livramento, a 16ª cidade a receber o serviço. A Patrulha também existe em Alvorada, Cachoeirinha, Canoas, Caxias do Sul, Charqueadas, Cruz Alta, Esteio, Novo Hamburgo, Passo Fundo, Pelotas, Porto Alegre (seis Patrulhas), Santa Cruz do Sul, Uruguaiana e Vacaria. No estado, são 24 centros de referência em 23 municípios, dos quais três estão em fase de instalação  até o final de 2014.

Patrulha Maria da Penha em ação na Lomba do Pinheiro, em 2013 | Foto: Claudio Fachel/ Palácio Piratini

Patrulha Maria da Penha em ação na Lomba do Pinheiro, em 2013 (Foto: Claudio Fachel/ Palácio Piratini)

Segundo os dados do Centro Estadual de Referência da Mulher “Vânia Araújo Machado” (CRMVAM), os índices de denúncia de violência aumentaram em torno de 300% nos últimos dois anos, o que para a coordenadora Maria do Carmo Bittencourt representa a grande publicização da Lei, da Rede Lilás e do telefone 0800 541 0803.

“Com os anos, foi reforçado que existe uma rede de proteção por elas, onde elas podem acessar a assessoria psicológica, apoio de assistentes sociais e assessoria jurídica, o que faz com que mulher chegue no sistema de justiça com mais poder, porque já chega sabendo dos seus direitos”, acredita.

A secretaria de Políticas para as Mulheres do estado, Ariane Leitão, lembra que segundo pesquisa do Instituto Patrícia Galvão, 98% dos brasileiros e brasileiras conhece a Lei Maria da Penha, o que a torna a lei mais conhecida no Brasil. “A Lei Maria da Penha, junto com a inscrição da Secretaria de Política para Mulheres nacional, são os maiores avanços em direitos humanos para mulheres do último período o estado brasileiro. Cria um espaço institucional de aplicação das políticas para mulheres e então possibilita a criação da lei”, aponta.

Maria do Carmo ressalta que a própria lei prevê que os governo realizem constantes campanhas de conscientização contra a violência doméstica, para que mulheres percebam que “são sujeitos portadores de direitos e não têm que necessariamente aceitar a agressão, que não é uma coisa natural e não faz parte dos relacionamentos ser agredida, humilhada e mal tratada”.

Desafios a serem cumpridos

Patrulha Maria da Penha acompanha vítimas de violência | Foto: Claudio Fachel/ Palácio Piratini

Patrulha Maria da Penha acompanha vítimas de violência (Foto: Claudio Fachel/ Palácio Piratini)

Para que a violência contra mulher seja efetivamente combatida no estado, Maria do Carmo defende a criação de organismos do tipo em todos os municípios, com delegacias especializadas e centros de referência para mulheres. “A ideia é que mulheres realmente necessitam espaço delas e isso é dentro dos centros de referência. Um dos grandes trabalhos que fazemos é fazer assessoria com prefeituras para que entendam necessidade de ter centro de atendimento às mulheres”, ponderou, apontando que quando essas medidas são implantadas, parece que o número de casos aumenta num primeiro momento, mas na verdade as mulheres denunciam mais pois “passam a acreditar na resolução”.

Ariane observa que a lei é “extremamente revolucionária”, tratando também de relações homoafetivas e passando por diversas áreas do Direito. No entanto, ela aponta que os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário precisam lembrar da importância de destinar recursos para que o que está previsto possa ser cumprido. “O texto é muito bom, mas o que faz ser eficaz ou não é o comportamento social, compromisso que os poderes têm em dar eficácia para essa lei. Se a lei foi criada, existia uma demanda social, e nós confirmamos todo dia que ela é necessária”, destaca.

O poder Judiciário ainda tem “dificuldades em entender a importância” de destinar recursos para a aplicação da lei, segundo ela. Apesar de terem sido criadas mais oito varas específicas de violência contra a mulher, na prática elas ainda não foram implementadas. “Tinha o número vergonhoso de uma vara no estado. Conquistamos mais, mas vamos ter que fazer com que implementem. E isso é reflexo da sociedade brasileira, que é machista”, resume.

Maria do Carmo reitera sua fala, afirmando que o que falta para que a Maria da Penha tenha maior êxito é “enfrentar a cultura machista em que a gente vive, em tudo existe essa separação por sexo e as mulheres estão sempre colocadas de uma forma inferior”. Apenas quando isso acontecer, a Lei poderá deixar de existir. “Enquanto as mulheres não tiverem sua cidadania plena, precisamos da Lei Maria da Penha. Ela é necessária, é uma ferramenta de garantia da liberdade das mulheres”, observa Ariane.

Evento comemora os 8 anos

A SPM realiza, nesta quinta-feira (7), o Seminário Estadual 8 anos da Lei Maria da Penha, para discutir a aplicação da lei, além de a relação com outras ferramentas de direitos das mulheres. O Manual para o Uso Não-Sexista da Linguagem, que foi formulado pela própria Secretaria, também será debatido.

“O objetivo é comprometer todos os poderes em relação à aplicabilidade da lei e dar oportunidade para mulheres e homens que trabalham com a Lei Maria da Penha apresentarem quais dificuldades ainda existem, no que ainda precisamos avançar”, explica a secretária Ariane. Estarão presentes representantes de movimentos sociais, de delegacias e serviços especializados e de órgãos públicos.

*Com informações do Governo do Estado, do IBGE e do Conselho Nacional de Justiça 

Confira abaixo a programação completa:

Manhã
8:30– Inscrições

9:00 – Mesa de Abertura

9:30 – Painel “Cumprindo a Lei Maria da Penha: Políticas Públicas na perspectiva da Vida sem Violência”
Coordenação: Maria do Carmo Bittencourt – Coordenadora do Centro Estadual de Referência da Mulher “Vânia Araújo Machado” (CRMVAM)
Painelistas:
Secretária de Estado Ariane Leitão – SPM-RS
Juíza Dra. Ivortiz Marques Fernandes – Representante do Tribunal de Justiça
Dra. Rubia Abs – Coordenadora Nacional CLADEM
Promotor Dr João Pedro Xavier – Coordenador do CAOCRIM – Ministério Público Estadual
Dra. Miriane Tagliari- Coordenadora do Centro de Referência em Direitos Humanos – DPE
Inque Scheider Coordenadora Estadual de Mulheres da Fetag
Delegada Anita Klein – Coordenadora das DEAM’s /SSP/RS

11:15 – Debate

12:00 – Encerramento

Tarde:
“Uso Não Sexista da Linguagem – O que bem se diz bem se entende”

14:00 – Mesa de Abertura:
Secretária de Estado Ariane Leitão – SPM-RS
Secretário Alessandro Barcellos – SARH/RS
Anita Kieling – Ex Assessora da SPM/RS e Coordenadora do GT que construiu o Manual para Uso não sexista da Linguagem

14:30 – Apresentação Cultural:
Mari Martinez and The Soulmates Acústico.

15:00 – Oficina “Desdobramentos e Transversalidade da Lei Maria da Penha: uso da linguagem não sexista, enquanto promotora da visibilidade das mulheres e desconstrução dos papéis estereotipados de gênero” (Lei federal 11.340/2006 – Art. 8º, III e VIII).
Coordenação: Mauren Pacheco – Chefe de Gabinete SPM/RS
Painelistas:
Leslie Campaner de Toledo – Especialista responsável pela organização, pesquisa e revisão do Manual para uso não sexista da linguagem.
Telia Negrão – Especialistas convidada para participar da organização do Manual

16:00– Debate

17:00– Considerações finais das painelistas

17:30 – Encerramento

Débora Fogliatto

Acesse no site de origem: Oito anos da Lei Maria da Penha: mulheres estão mais confiantes para denunciar agressores (Sul21, 07/08/2014)

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