O tratamento dado a mulheres negras e grávidas e o racismo enfrentado por elas dentro dos presídios foram alguns dos pontos levantados por Deise Benedito, advogada, especialista em relações de gênero e raça e em sistema prisional, ouvida nesta quarta-feira (4) no espaço “Tribuna das Mulheres” da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Câmara.
(Câmara Notícias, 04/07/2018 – acesse no site de origem)
De acordo com Deise, existem hoje 42 mil mulheres presas no Brasil. “Dessas, cerca de 70% são mulheres negras na faixa de 18 a 30 anos”, ressaltou. Segundo ela, esse número reflete uma questão histórica do país. “As mulheres indígenas, assim que foi invadido esse continente, principalmente o nosso território brasileiro pelos colonizadores portugueses, tiveram seus corpos aprisionados”, lembrou.
“Desde que a cadeia surgiu no Brasil, em 1549, sempre tem preto na prisão, só se vê negros na prisão. Então tem também a construção dessa identidade criminosa negra”, lamentou. “Bastou ser mulher, e negra, para ser nela colocado o estigma de ser uma mulher voltada à criminalidade”, completou Deise.
Grávidas
Deise destacou o tratamento desumano que mulheres grávidas recebem nos presídios. Segundo ela, os estabelecimentos penitenciários não são adaptados a elas. “A própria gravidez vira tortura e aquela criança que ela está esperando também é torturada. Quando elas dão à luz, muitas vezes a comida é reduzida para que seque o leite e a mulher se desfaça da criança mais rápido”, revelou.
A especialista disse que, dentro da prisão, as mulheres se relacionam através da dor. “Muitas mulheres abrem mão da sua cama, da sua cela, da sua grade para dar lugar para que as grávidas não deitem no chão, em colchões de péssima qualidade, com água reduzida”, afirmou. Mas, nada disso se compara à dor de deixar seus bebês. “É a dor maior de todas as mães que estão nas prisões”, ressaltou Deise.
A deputada Benedita da Silva (PT-RJ), membro da comissão das mulheres, foi a primeira negra a ocupar uma cadeira na Câmara de Vereadores da cidade do Rio de Janeiro e também a primeira a chegar ao Senado Federal. Ela foi eleita duas vezes deputada federal e, logo no seu primeiro mandato, ela garantiu às presidiárias o direito de permanecerem com os seus filhos durante a amamentação.
“Nós não vamos aceitar essa perversidade institucional. Vamos disputar pelo nosso espaço, vamos ter mulheres negras no Congresso Nacional, nas Assembleias Legislativas, na presidência da República. Nós vamos ter mulheres negras onde as mulheres negras quiserem estar”, declarou.
Tratamento desigual
A especialista explicou que o racismo institucional que existe no Brasil permite que as mulheres negras em privação de liberdade sejam tratadas de forma diferenciada em relação aos homens. É comum, por exemplo, que os homens presos escrevam muitas cartas para vários órgãos, mas as mulheres estão sujeitas a uma vigilância maior sobre o que escrevem.
Deise conta que o acesso à biblioteca também é diferente para homens e mulheres. “Quando os livros não são bíblicos, são revistas de romance; nunca é uma lei de execução penal ou o Código Penal, diferente do que é oferecido aos homens”.
Larissa Galli; Edição – Ana Chalub