Expressão tem origem racista, e maioria das pessoas acusadas de transportarem drogas é negra
O termo “mula”, no contexto brasileiro, vem carregado de uma forte ligação com o tempo colonial, em que o ato de nomear as mulheres negras de mulatas fazia referência ao animal mula. Este animal é resultado de uma mistura de raças e, por conta da miscigenação da população brasileira no período, essas mulheres multirraciais também sofriam a mesma representação. Além de, segundo análises históricas, elas serem animalizadas de outras formas e objetificadas sexualmente.
No campo da Justiça Criminal, a maioria das pessoas que recebem o nome “mula”, segundo a advogada Kaelly Silva (2018), acabam não apresentando nenhum histórico de envolvimento com crime organizado. Logo, essa mulher presa por tráfico, por transportar drogas, deveria ter uma diminuição de pena. Geralmente, são pessoas que não participaram “de nenhum delito anterior”.
Os homens negros em condições de transportadores de drogas também são atravessados pelo processo de desumanização, contudo, é sobre a mulher que o peso do processo desumanizador e misógino acontece.
O uso do termo para se referir às mulheres negras não se restringe ao Brasil. Nos Estados Unidos, por exemplo, chamar uma mulher de “mula do mundo” refere-se à mulher negra ser considerada capaz de aguentar todas as atrocidades, como trabalho árduo e abuso sexual. Rupe Simms (2001) acrescenta que as mulheres escravizadas naquele país eram vistas como “brutas, insensíveis e sub-humanas, que deveriam ser reconhecidas apenas por seu trabalho”. Além disso, “a imagem da mula justificava a superioridade masculina branca e validava a inferioridade das mulheres africanas e sua exploração na unidade de trabalho”.