Renda de brancos e negros só deve ser equiparada no Brasil em 2089

25 de setembro, 2017

Igualdade seria alcançada mais de dois séculos após a abolição da escravatura, diz Oxfam

(O Globo, 25/09/2017 – acesse no site de origem)

O Brasil deve levar dois séculos, desde a abolição da escravatura, no fim do século XIX, para equiparar a renda de negros com brancos, isso se a tendência de redução da desigualdade dos últimos 20 anos for mantida. A conclusão é do relatório “A Distância Que Nos Une”, que a organização não governamental Oxfam Brasil divulga nesta segunda-feira, com dados sobre a desigualdade socioeconômica no país. Os dados serão detalhados em entrevista coletiva no início desta tarde de segunda-feira.

De acordo com o estudo, negros e brancos terão rendas equivalentes apenas em 2089 — a Lei Áurea, foi promulgada em 1888. Em relação à disparidade de salários entre gêneros, as mulheres tendem a passar a ganhar como os homens um pouco antes, em 2047.

Os números obtidos pelo estudo mostram que os negros recebem menos que os brancos mesmo com a mesma escolaridade: enquanto brancos com diploma de nível superior recebem R$ 4,1 mil, em média, negros com o mesmo nível de graduação escolar ganham. “Para a população negra, avançar na escolaridade não significa equalizar a renda com brancos”, observa a Oxfam. Segundo um estudo, um médico negro ganha aproximadamente 88% do salário de um médico branco.

A diferença salarial também está presente entre mulheres e homens: na faixa de ensino superior, as mulheres recebem 63% em média do que ganham os homens.

— Em todos os cortes feitos, seja de renda, seja de riqueza, seja de acesso a serviços, seja de mercado de trabalho, as mulheres e os negros estão sempre em desvantagem. E não é uma questão de meritocracia, porque a comparação é feita com indivíduos com a mesma escolaridade — ressalta Kátia Maia, diretora-executiva da Oxfam Brasil, que liderou as pesquisas.

SITEMA TRIBUTÁRIO MANTÉM DESIGUALDADE

A desigualdade por gênero e por raça foi apenas um dos recortes feitos pelo relatório da Oxfam. Segundo o índice de Gini, que avalia a disparidade de renda, o Brasil é o 10º país no ranking dos mais desiguais do mundo. A diferença de renda entre os mais ricos e os mais pobres aqui é maior que em países africanos, como Ruanda e Quênia.

O estudo da Oxfam também aponta os principais fatores para a manutenção da desigualdade no Brasil: o sistema tributário, que pesa mais sobre os pobres que sobre os ricos; a discriminação de gênero e raça; e o que o estudiosos chamaram de “falta de espírito democrático e republicano no sistema político brasileiro”.

— Temos uma democracia privatizada, capturada pelos interesses privados de distintas formas. Temos um Congresso, hoje, que ‘representa’ porque foi eleito, mas que não retrata o que é a nossa sociedade. O Congresso é formado majoritariamente por homens brancos, em um país de maioria formada por mulheres em relação ao gênero, e por negros e pardos, do ponto de vista racial — observa Kátia Maia.

Decisões recentes do Congresso, como a implementação do teto de gastos e a reforma trabalhista são vistos com pessimismo pela coordenadora do relatório. Maia cita um estudo do Banco Mundial que aponta que que, apenas neste ano, o Brasil terá 3 milhões de pessoas retornando à condição de pobreza.

Para Kátia Maia, a adoção das medidas como estas pelo Congresso Nacional afetam as pessoas que mais dependem das políticas sociais, ao passo que um dos principais fatores de aumento da desigualdade, o sistema tributário, permanece intocado.

— Os super ricos pagam menos imposto de renda do que deveriam, a carga dos tributos indiretos recaem mais sobre os mais pobres e classe média e, por fim, temos uma evasão fiscal e renúncias de impostos que o governo abre mão. Nossa política tributária é totalmente injusta e reforça a concentração — afirma.

Dimitrius Dantas, estagiário sob coordenação de Ronaldo D’Ercole

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