Uma breve reflexão sobre mulheres negras gordas e seus estereótipos, por Jarid Arraes

28 de março, 2014

(Portal Fórum, 28/03/2014) Ainda há muito para ser debatido e pesquisado sobre a relação entre as questões raciais e as de gênero. Entre as mulheres negras, há diversas especificidades sociais que variam de acordo com certos fatores, tais como orientação sexual, classe, religião, regionalidade e aparência física. Por isso, embora as mulheres negras sofram com uma série de estereótipos raciais e sexuais, elas têm experiências diferentes umas das outras de acordo com suas características.

As mulheres negras que são gordas, por exemplo, são vistas pela sociedade de um modo bastante específico. Na indústria do entretenimento há diversas personagens que exemplificam os estereótipos das negras gordas: desde filmes de drama até comédias americanas exageradas, é possível identificar uma frequente representação negativa. “Preciosa”, “Norbit”, “E o Vento Levou”, “Vovó…Zona” e até mesmo “O Sítio do Pica-Pau Amarelo” são alguns exemplos de produções que apresentam mulheres gordas e negras como pessoas de caráter duvidoso, compulsivas, descontroladas e inconvenientes, ou frequentemente reduzidas a papéis como cozinheira e empregada doméstica para desempenhar a função de serva.

(Imagem: Reprodução)

Essa percepção limitada e negativa a respeito dessas mulheres não se encontra exclusivamente na ficção, mas faz parte da realidade de muitas pessoas que precisam lidar diariamente com as facetas do racismo. Por se tratarem de valores muito naturalizados e pouco questionados, associar determinadas características a esse grupo de mulheres é tão comum que, de tanto se repetir, vira quase um axioma. É por isso que muitas gordas negras relatam experiências de violência física e psicológica, tanto na infância quanto na idade adulta.

Há muitos paradigmas para a mulher gorda negra: ela costuma ser vista como mais velha do que realmente é, pouco cuidadosa, sem higiene pessoal, ignorante e sem educação, além dos diversos episódios de ridicularização por causa de sua aparência física. Essa representação tem grande influência na percepção da sociedade com relação a essas mulheres e ocasiona em exclusão social, levantando barreiras para que consigam um trabalho ou mesmo frequentar ambientes diversos em liberdade. Os prejuízos psíquicos em ser considerada “nojenta” são imensuráveis; é quase impossível levar uma vida produtiva e feliz quando se sofre discriminação constante, a internalização desses preconceitos gera uma percepção de si extremamente negativa e distorcida.

É interessante que, embora a “obesidade” tenha sido afirmada como um “problema” generalizado nos Estados Unidos nos últimos anos, a população que compõe a maior parte das pessoas obesas são, ironicamente, as mulheres negras. É fato que o sofrimento causado pelo racismo pode resultar em transtornos alimentares, ansiedade e outros tipos de comportamentos que ocasionam em aumento de peso. Na verdade, uma pesquisa científica na Universidade de Boston indica que as mulheres negras são muito mais propensas a obesidade quando são vítimas constantes do racismo. Segundo os dados levantados, a exposição contínua ao racismo pode desregular as funções neuroendócrinas do corpo, o que influencia o acúmulo de gordura. Embora seja somente uma pesquisa e o assunto não possa ser limitado sob essa perspectiva, é importante refletir sobre o ciclo vicioso que muitas vezes se instala.

É importante salientar que não há nada de errado em ser gorda e isso é algo que diz respeito somente à própria mulher, seja ela negra ou não. Mulheres de outras etnias também sofrem com o preconceito e ridicularização contra pessoas gordas, não obstante um recorte de raça torna possível identificar os mecanismos pelos quais o racismo continua agindo em nossa sociedade, apontando as diferenças e similaridades entre cada grupo. As especificidades das questões raciais relacionadas a gênero precisam ser debatidas e estudadas com mais seriedade.

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