Pesquisa revela como traumas de violência doméstica se manifestam fisicamente em mulheres entre 40 e 65 anos, com impacto na sexualidade, na saúde ginecológica e em doenças crônicas
Por trás de queixas comuns em consultórios de ginecologia — dor pélvica, ressecamento, perda urinária, queda de libido —, a psicóloga e pesquisadora Débora Krakauer começou a perceber algo mais. No ambulatório de ginecologia do Hospital das Clínicas, em São Paulo, onde atua como psicóloga hospitalar, muitas de suas pacientes traziam um histórico de violência doméstica.
A observação virou objeto de pesquisa. Em seu mestrado na Faculdade de Medicina da USP, Krakauer investigou como a violência doméstica repercute na saúde física e emocional de mulheres no climatério, período de transição entre a vida fértil e a não reprodutiva. O estudo, realizado com 100 mulheres entre 40 e 65 anos atendidas no HC e no Centro de Saúde Escola Geraldo de Paula Souza, comparou vítimas de agressões com aquelas sem histórico de violência.
O estudo descobriu que mulheres vítimas de violência apresentaram taxas muito mais altas de doenças ginecológicas e comorbidades crônicas do que o grupo controle. Casos de dor pélvica foram mais que o triplo (82% ante 26%), endometriose quase três vezes mais (28% ante 10%), e vaginismo, caracterizado pela contração involuntária da musculatura vaginal, apareceram em 42% das vítimas, ante 6% entre as que não sofreram agressão.
Além das sequelas ginecológicas, o impacto metabólico também surpreendeu. A incidência de diabetes foi nove vezes maior entre as vítimas (18% ante 2%), e a de hipertensão, quase o dobro (54% ante 32%).
“São mulheres que vivem em estado de alerta permanente, com níveis elevados de estresse e cortisol. Mesmo quando elas conseguem sair do quadro de violência, o corpo pode continuar reagindo ao trauma.”
— Débora Krakauer, psicóloga e pesquisadora