Lei de Alienação Parental desestimula denúncias de abuso sexual e violência doméstica, apontam debatedores

28 de novembro, 2018

Participantes de seminário na Câmara dizem que na prática lei está sendo usada contra mães que denunciam abuso sexual e violência doméstica, levando muitas vezes à perda da guarda dos filhos

(Agência Câmara, 28/11/2018 – acesse no site de origem)

A promotora de Justiça Valéria Fernandes, do Núcleo de Gênero do Ministério Público do Estado de São Paulo, denunciou nesta quarta-feira (28), em debate na Câmara dos Deputados, que a Lei de Alienação Parental (12.318/10) está sendo usada na prática contra mães que denunciam casos de abuso sexual ou violência doméstica e está protegendo os abusadores e agressores.

Conforme ela, em regra, as denúncias de abuso sexual são verdadeiras, e não falsas, como vem pressupondo a Justiça. “O Brasil está se tornando o paraíso da pedofilia, o paraíso dos violadores dos direitos das mulheres”, disse. Ela defendeu a reformulação da Lei de Alienação Parental pelos parlamentares e disse que ela está dificultando a aplicação da Lei Maria da Penha (11.340/06). “Hoje as mulheres não podem procurar a Justiça porque há um risco de inversão de direitos”, acrescentou.

A promotora lembrou que o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) já recomendou a revogação de partes da lei. A norma define a alienação parental como “a interferência na formação psicológica da criança ou adolescente” e prevê que, caso haja indícios de difamação, a Justiça poderá determinar a alteração da guarda para compartilhada ou a inversão da guarda.

As declarações foram dadas no seminário internacional sobre guarda compartilhada, promovido pela Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher e pela Comissão Mista de Combate à Violência contra a Mulher.

Guarda compartilhada
Uma das deputadas que pediu o seminário, Luizianne Lins (PT-CE) é contrária à guarda compartilhada quando tiver havido abuso sexual por parte do genitor e no caso de violência doméstica contra a mãe. Ela defende a mudança na Lei de Guarda Compartilhada (13.058/14), para que esse tipo de guarda não seja automático, conforme prevê a norma. Para ela, é preciso uma análise detalhada antes de esse tipo de guarda ser concedida.

Na visão da deputada, quando a separação foi gerada por violência doméstica, os filhos devem ficar com as mães enquanto elas correrem risco, já que a mulher não deve ficar em contato com o agressor e uma vez que a violência contra a mãe gera consequências também para os filhos.

Abandono afetivo
Diretor da Associação Brasileira Criança Feliz, o advogado Rodrigo Ricardo defendeu tanto a Lei da Alienação Parental quanto a Lei da Guarda Compartilhada. Conforme ele, há muitas realidades distintas, como o caso de mães que dificultam que pais vejam os filhos e de pais que não querem ver o filho. Ele ressaltou que o abandono afetivo – em geral do pai em relação ao filho – é um problema no Brasil e que muitas vezes a Justiça é acionada para fazer com que os pais cumpram rotina de visitas.

“A guarda compartilhada veio para dividir não só os direitos, como os deveres. Pais negligentes, que não cuidam dos filhos, são uma realidade no Brasil há séculos, mas hoje existe um grande número de pais que querem participar”, disse.

A juíza Flávia Pessoa, auxiliar da Presidência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), também considera a Lei de Alienação Parental importante, alegando que pode haver má-fé dos dois lados: da parte da mãe ao acusar falsamente o pai de violência sexual; e do pai, ao acusar falsamente a mãe de alienação parental.

Casos de denúncias
Mas Ariane Leitão, assessora da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, afirmou que o órgão já computou mais de mil casos de denúncias de alienação parental. Em regra, segundo ela, a Lei de Alienação Parental foi utilizada para afastar mães e filhos e para encobrir situações de abuso sexual das crianças. “Todos os casos são praticamente iguais”, destacou. Apenas um desses casos foi, segundo ela, de denúncia contra o pai.

Conforme Ariane, na maioria dos casos recebidos pela comissão, as autoridades rotularam as mães como “loucas” e houve imposição de guarda compartilhada ou reversão da guarda. “Denunciar violência contra seu filho pode render guarda compartilhada imposta ou reversão da guarda”, alertou, pedindo a mudança na lei.

Reportagem – Lara Haje

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