Violência contra a mulher e a cobertura da imprensa, por Maíra Liguori

13 de agosto, 2024 Meio&Mensagem Por Maíra Liguori

O jornalismo mira no engajamento e acerta na banalização do ódio

Ao abrir um portal de notícias, assistir um telejornal ou ouvir um podcast, existe uma alta probabilidade de se deparar com um caso de violência contra as mulheres. A cada 6 horas, 1 delas sofre com agressões que vão de ofensas a torturas, de estupro a feminicídio – na maioria dos casos, pelas mãos do próprio companheiro. E infelizmente, as chances da barbaridade desse crime ser banalizada pela cobertura midiática sem nenhum debate sobre o problema também é grande.

O estudo “Desfocadas: como opinar e informar melhor sobre a violência de gênero”, feito pela LLYC, analisou mais de 3 ,4 milhões de notícias que abordavam a violência de gênero e concluiu que cerca de 20% delas justificam as agressões sofridas pelas mulheres. Além disso, 1 a cada 50 notícias traz alguma inclinação negacionista relativizando o fato e/ou suas consequências, enquadrando os casos como isolados e transmitindo a ideia de serem episódios de exceção ao invés de um problema comum. Como se não bastasse, 1 a cada 6 expõe os dados da vítima, o que é uma violação à sua privacidade. O estudo olhou ainda para 14 milhões de mensagens publicadas no X (ex-Twitter) em 12 países, incluindo o Brasil. Por aqui, a taxa de notícias que justificam a agressão foi de quase 14%.Fonte: LLYC, 2024

Entre as práticas negativas está o foco sensacionalista em atributos da vítima como a sua idade ou comportamento. O estudo da LLYC constatou que há 75% mais menções aos atributos da vítima do que do agressor. O enfoque importa porque, como resultado, temos histórias contadas com um holofote em quem sofreu ao invés de uma responsabilização no criminoso.

Além dos motivos listados, a escandalosa e insistente cobertura midiática sobre a violência contra a mulher gera um efeito paisagem, que provoca a exaustão emocional em quem lê e que aos poucos normaliza o absurdo como forma de se proteger. Outro efeito dessa espetacularização é a influência no comportamento dos leitores em seus próprios contextos. Uma síntese reuniu 284 estudos sobre o tema e concluiu que há evidências robustas de que a exposição prolongada a programas policialescos durante a infância está associada a comportamentos violentos na vida adulta. De acordo com o estudo, a cada 10 pessoas que consomem estes conteúdos, 3 têm comportamentos agressivos influenciados por eles.

Para avançarmos na ação e responsabilização coletiva, é necessário sensibilidade e cuidados específicos na divulgação dos casos. Proteger a privacidade de crianças, omitir informações socioeconômicas e a raça do agressor ou da vítima, não expor ou questionar a saúde mental da vítima e evitar elementos que gerem empatia com o agressor são algumas das práticas recomendadas. O debate não é novo, tanto que há alguns anos a Think Olga lançou o Minimanual de Jornalismo Humanizado, com orientações para a cobertura midiática sobre violência contra as mulheres.

Vale destacar que há demanda por esse conhecimento e conversa qualificados. Nos últimos 5 anos, houve um aumento expressivo de buscas sobre a “Lei Maria da Penha”. No Instagram, apuramos mais de 464 mil publicações com a #violenciadegenero e mais de 453 mil com #violenciadomestica. As pesquisas e conversas demonstram interesse na pauta ao longo de todo o ano.

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