(Jornal Nacional) Aborto e eutanásia serão considerados crimes, mas terão penas mais brandas que a do homicídio.
Esta semana, o Jornal Nacional está exibindo uma série de reportagens sobre a reforma do Código Penal Brasileiro. Nesta quinta-feira (26), Flávio Fachel mostra como propostas que envolvem o início e o fim da vida dividem opiniões.
Há 20 anos, a diarista Elizângela Laurindo, ainda adolescente, engravidou. Ela estava se separando e achava que não era a hora de aumentar a família. Decidiu pelo aborto. “Eu não me arrependo, não seria o momento de ter aquela criança, então eu mesmo tomei a iniciativa de tirar. As pessoas deveriam ter uma escolha, uma ajuda. Deveria ser legal, e não ser um crime como é”, opina.
A mãe do assistente financeiro Donizete Ferreira tem câncer incurável e, segundo os médicos, poucas semanas de vida. Muitas famílias já se viram diante deste dilema. Donizete acredita que a decisão de usar aparelho ou medicamentos para prolongar a vida de alguém deve ser da família.
“Só quem está do lado da família sabe o sofrimento da pessoa. Você vê os picos das dores, momentos de sofrimentos. Eu tenho certeza de que ela não gostaria de ficar em estado vegetativo”, afirma Donizete.
Pode parecer difícil de entender, mas os conceitos de “início” e “fim” da vida não são tão simples e diretos como parece. Na verdade, são bem diferentes quando se observam as diversas sociedades mundo a fora. Dependendo de onde se vive, serão regras religiosas, culturais, científicas e até jurídicas que vão definir a vida e os seus limites. Quando ela começa? E quando alguém pode tirar a vida de outra pessoa? Tudo isso está em discussão no novo Código Penal.
Hoje, no Brasil, o aborto consentido é crime, punido com até quatro anos de prisão, exceto se for para preservar a vida da mãe ou se a gestação resultar de um estupro. E ainda se o feto não tiver cérebro, como decidiu recentemente o Supremo Tribunal Federal.
Pela proposta, o aborto continuaria a ser crime, mas com pena menor, de até dois anos de cadeia. E poderia ser admitido em mais casos:
– Se a gravidez fosse resultado do uso de técnicas de reprodução assistida sem consentimento
– Quando o feto tivesse anomalias graves e incuráveis que inviabilizassem a vida fora do útero, desde que atestadas por dois médicos
– E o ponto mais polêmico: por vontade da mãe, até a 12ª semana de gravidez, se o médico ou psicólogo constatasse que a mulher não tem condições psicológicas de arcar com a maternidade
O médico César Eduardo Fernandes, da Associação Médica Brasileira.diz que falta definir que condições são essas.
E faz críticas à maneira como o texto permite o aborto. “Da forma como ele está ele oferece fragilidade para que equívocos de decisão médica possam ocorrer. O ideal seria que nós tivéssemos uma junta médica absolutamente independente em que o médico propositor do abortamento ou aquele que fosse realizar o abortamento não pudesse compor a junta médica”, diz ele.
E faz críticas à maneira como o texto permite o aborto. “Da forma como ele está ele oferece fragilidade para que equívocos de decisão médica possam ocorrer. O ideal seria que nós tivéssemos uma junta médica absolutamente independente em que o médico propositor do abortamento ou aquele que fosse realizar o abortamento não pudesse compor a junta médica”, diz ele.
O presidente da comissão de reforma do Código, Gilson Dipp, acha que o texto está claro. “Isso é aquela chamada morbidez psicológica, ou seja, aquela tem um consumo alto de entorpecentes como aquelas gestantes que nós vimos na cracolândia em São Paulo. Quanto a ser uma junta médica, demos credibilidade aos profissionais na lei”, afirmou.
Outra questão que vai gerar controvérsia: a eutanásia, abreviar a vida de uma pessoa para aliviar o sofrimento. Como não está prevista pelo atual Código Penal, ela é considerada um homicídio. Pela proposta, o novo Código Penal passaria a tipificar o crime de eutanásia, com uma pena bem mais branda que a do homicídio: de dois a quatro anos. E o juiz teria o poder de decidir não punir quem a praticar.
“É a chamada morte piedosa, aquele que pratica um ato piedoso a pedido do paciente terminal que está sofrendo e que não tem mais condições de sobreviver, ou seja, a senhora morte já está chegando. E isso nós com isso damos um atenuante e até em alguns casos o juiz pode, dependendo do caso concreto, não aplicar a pena”, explica Gilson Dipp.
A Igreja Católica não aceita nenhuma medida que acelere a morte de um paciente, mesmo que em estado terminal. “Uma vida humana não pode ser abreviada em momento algum. Ela deve ter, segundo a igreja, um fim natural. E o fim natural implica dizer que você deve dar aquilo que é necessário até o último momento”, diz Dom Paulo Cezar Costa, da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil.
Na última reportagem da série, você vai saber por que algumas leis são tão temidas e outras não.
Leia em pdf: Proposta para novo Código Penal diminui pena para aborto e eutanásia (Jornal Nacional – 26/07/2012)