16/07/2013 – Deficientes encaram estigma do sexo

16 de julho, 2013

(Folha de S.Paulo) Em suas fantasias sexuais, ela é uma loura forte e impetuosa, que domina seus parceiros. Na vida real, é uma virgem que depende de uma cadeira de rodas elétrica, e seu corpo só é tocado por cuidadores domésticos e profissionais de medicina.

“Uma pessoa incapacitada é vista como uma criança”, diz essa mulher, Laetitia Rebord, 31. “E, inevitavelmente, crianças e sexo não combinam.”

Uma atrofia muscular espinal genética a deixou paralisada, com exceção do polegar esquerdo e dos músculos faciais.

Rebord, que diz ter sensações físicas agudas, procurou relacionamentos sexuais entre amigos de amigos, sites de namoro e até com garotos de programa. Mas diz que agora está disposta a pagar por sexo na Suíça ou na Alemanha, onde os “parceiros sexuais substitutos” são legais.

O tema dos parceiros substitutos chamou atenção na França em março, depois que a Comissão Nacional de Ética, que assessora o governo sobre questões de saúde, criticou a prática como um “uso antiético do corpo humano para fins comerciais”.

Embora a prostituição seja legal na França, abordar possíveis clientes e servir de intermediário entre profissionais do sexo e clientes não o são. Mas algumas pessoas estão pedindo a legalização dos parceiros sexuais substitutos.

“A prostituição é um debate falso. Os objetivos são diferentes”, disse Pascale Ribes, que em 2011 fundou o Grupo de Deficiências e Sexualidades, associação que defende os terapeutas sexuais na França.

“O parceiro substituto permite que uma pessoa deficiente física, que não pode acessar a sexualidade de maneira satisfatória, reconecte-se com o corpo”, disse Ribes.

Sua associação está fazendo lobby por uma alteração na lei para permitir que pessoas com deficiência física, seus pais, amigos ou diretores de instituições aprovadas arranjem encontros com parceiros substitutos, que geralmente cobram cerca de US$ 130 por sessão.

Na França, a falta de debate sobre o assunto, as leis que regulamentam a prostituição e a recusa a legalizar os parceiros substitutos encorajaram práticas ilegais.

Aminata Gregory, 66, vem oferecendo ilegalmente assistência sexual na França há mais de um ano. Ela foi treinada como terapeuta sexual na Suíça, e seu trabalho envolve principalmente massagens e jogos eróticos, sem beijos na boca ou sexo.

Gregory, que é holandesa, tem cerca de dez clientes incapacitados na França e cobra honorários por meio de sua empresa na Holanda.

Gregory recentemente foi ao sul da França para conhecer um cliente, Daniel Doriguzzi, 49. Ele tem uma rara doença genética chamada ataxia de Friedreich, que o faz perder gradualmente a coordenação motora e a capacidade de falar com fluência.

Com uma prostituta, disse Doriguzzi, “dura um tempo limitado e mais nada”. Com Gregory, “nós nos colocamos em uma bolha e nos tornamos um casal normal. Conversamos, fazemos o que quisermos. Perguntamos um ao outro o que queremos. No final da sessão, estouramos a bolha”.

Os parceiros substitutos são legais na maioria dos países que permitem a prostituição, como Suíça, Alemanha e Dinamarca.

Em 2008, Catherine Agthe Diserens, uma educadora suíço-alemã, iniciou um programa de treinamento de parceiros sexuais substitutos durante seis meses, com ex-prostitutas, enfermeiras e fisioterapeutas.

As aulas tratavam de deficiências físicas, internamentos em instituições, colaborações com profissionais do sexo e cursos práticos explorando o que Diserens chama de “técnicas corporais”.

Para muitas feministas francesas, que associam o sexo indesejado à violência, a ajuda sexual é humilhante para as duas pessoas envolvidas.

“É como dizer às pessoas incapacitadas que, como elas nunca terão uma vida sexual ou amorosa, vamos prescrever a ajuda sexual como paliativo”, disse Anne-Cécile Mailfert, membro da Osez le Féminisme (Ousem ser feministas).

Ela também teme que ocorra dependência emocional nos terapeutas sexuais.

Mas a questão principal, disse Mailfert, tem menos a ver com a sexualidade do que com ensinar os profissionais de saúde a compreender as necessidades sexuais de pessoas deficientes e ajudá-las a encontrar outras pessoas.

Marcel Nuss, que tem dois filhos e respira com respirador artificial, é o autor de “I Want to Make Love” [Eu quero fazer amor].

O livro descreve sua realização pessoal por meio do amor com sua ex-mulher e uma vida sexual com acompanhantes.

“Alguém como eu não pode fazer nada sozinho”, disse Nuss. “O sexo ajuda os deficientes a renascer e a recuperar seu aspecto humano.”

Acesse o PDF: Deficientes encaram estigma do sexo (Folha de S.Paulo – 16/07/2013)     

 

 

 

 

Nossas Pesquisas de Opinião

Nossas Pesquisas de opinião

Ver todas
Veja mais pesquisas