(Jornal do Senado, 28/05/2014) A humanização do parto foi tema ontem de audiência conjunta das Comissões de Direitos Humanos (CDH) e de Assuntos Sociais (CAS). Desatenção, agressões físicas e emocionais na hora do parto e a preferência dos obstetras por cesarianas são citados como exemplos da chamada violência obstétrica em hospitais públicos e privados.
A ministra da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência, Ideli Salvatti, lamentou o alto índice de cesarianas, que chega a 40% no Sistema Único de Saúde (SUS) e a 84% nos hospitais privados, contra um índice de 15% tido como aceitável pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Segundo ela, o número mais elevado na rede privada revela um “viés econômico”, devido ao custo mais alto do parto cirúrgico.
Para Ideli, o problema decorre ainda de comodismo, pois a cesárea dispensa o médico de ficar de plantão: a cirurgia pode ser feita fora dos fins de semana ou de qualquer data inconveniente para a equipe clínica. Porém, disse, a mulher é induzida a fazer um procedimento mais arriscado, só indicado para situações específicas.
— É algo invasivo, agressivo e que traz consequências para a mãe e criança — afirmou.
Ideli lembrou a lei que garante o direito a acompanhante na hora do parto, um projeto que ela apresentou quando senadora. Reconheceu, porém, que a lei, sancionada em 2005, ainda não vem sendo rigorosamente cumprida. Muitos hospitais, disse, alegam falta de condições para assegurar a privacidade das parturientes. Para ela, falta sensibilizar os profissionais para a importância do acompanhamento.
Saúde da Mulher
O debate foi sugerido por Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) e Ana Rita (PT-RS), que preside a CDH. A iniciativa foi motivada pela proximidade do Dia Internacional de Ação pela Saúde da Mulher e do Dia Nacional pela Redução da Mortalidade Materna e Infantil, em 28 de maio.
Vanessa destacou denúncias de violência obstétrica recebidas durante a CPI da Violência contra a Mulher, em 2012 e 2013. Ressaltou também medidas que o Ministério da Saúde vem promovendo em favor do parto humanizado. Portaria recente agora determina que a equipe médica assegure contato imediato do recém-nascido com a mãe, sem que o bebê seja levado imediatamente para exames complementares, a menos que haja necessidade efetiva.
— As medidas visam beneficiar a saúde materna e infantil, com diretrizes que agradaram aos setores que defendem o parto humanizado e a amamentação — comentou.
Rede Cegonha
Dário Frederico Pasche, do Ministério da Saúde, destacou que essas medidas se enquadram dentro de um programa amplo de atenção à saúde da mulher, o Rede Cegonha. São formadas parcerias com estados e municípios para que as mulheres tenham orientação sobre direitos reprodutivos e pré-natal e parto seguro.
A humanização do parto, conforme Pasche, é uma prioridade e também um desafio para o Rede Cegonha, pois envolve mudar a organização e a cultura vigentes nas estruturas de saúde. Segundo ele, historicamente a cultura do campo médico avançou para a “medicalização da vida”. Assim, a gestação, o parto e o nascimento se transformaram em um “ato médico”.
Pasche disse que uma estratégia é favorecer o parto natural, em centros de natureza não hospitalar, com acompanhamento de enfermeiros qualificados em obstetrícia. Segundo ele, o modelo é o sistema inglês, em que 85% dos partos são “absolutamente fisiológicos”.
Em 30% dos partos na Inglaterra, afirmou, não há nenhuma intervenção da equipe que acompanha as gestantes. Elas também não são submetidas à episiotomia, o corte entre o ânus e a vagina para facilitar a saída do bebê, prática que vem sendo feita de forma indiscriminada no Brasil, segundo denúncias.
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