(Ancelmo Gois/ O Globo, 19/10/2014) Causou rebuliço nas redes sociais do movimento negro um texto do cineasta fluminense Flávio Leandro, 58 anos. Para ele, o último pleito eleitoral “revelou a exclusão total de uma bancada comprometida com a causa negra”. Flávio, que há 30 anos trabalha na produção de filmes dos principais diretores brasileiros, acha que “talvez seja utopia ou hipocrisia, mas gostaria de ver no Congresso uma bancada negra, verdadeiramente engajada na nossa luta.” Aqui, ele troca dois dedos de prosa com a coluna:
Como não existe uma bancada que defenda a causa? Afinal, os deputados Benedita e Vicentinho e os senadores Romário e Paulo Paim são negros.
Os parlamentares negros, eleitos empunhando a bandeira da causa negra, têm um apagão ideológico quando estão no Congresso. A motivação pela qual foram eleitos é relegada a segundo plano em detrimento dos interesses do partido e do governo a que servem. Um caso notório foi o do PT e do governo do PT. Parlamentares negros ligados a essas duas forças, obedecendo a ordens, voltaram-se contra Joaquim Barbosa. Sua Excelência, imbuído do espírito e da essência de justiça nunca dantes vistos neste país, comandou a condenação de parlamentares do PT, e de partidos aliados, no caso do mensalão. Parlamentares como Vicentinho e Paulo Paim questionaram a legitimidade das decisões do ministro. Os parlamentares negros fluminenses, se não tiveram a mesma postura, omitiram-se. Mas não se puseram a favor da legitimidade das ações do ministro.
E o Romário?
Ele não abraça a causa da negritude, mas desenvolve uma luta legítima em favor, principalmente, das crianças com necessidades especiais.
Mas a causa negra precisa de uma bancada negra? Não seria uma causa de todos, brancos e negros?
Se vivêssemos num país de igualdade racial e democrática, não haveria necessidade de uma bancada negra. Declaradamente, no Congresso existem as bancadas dos evangélicos, da diversidade sexual, dos ruralistas, da bala, dos militares, dos famosos e dos parentes, formada por filhos de políticos profissionais.
Todos empenhados na defesa dos temas pelos quais foram eleitos. E a bancada dos negros? São parlamentares que se elegem empunhando a bandeira da causa negra; eleitos, tornam-se votantes dos interesses dos governos aos quais estão encabrestados.
Acesse o PDF: ‘Não existe no Congresso uma bancada negra’, diz cineasta Flávio Leandro (Coluna Ancelmo Gois/ O Globo, 19/10/2014)