É a primeira vez que o governo fará um alerta sobre esta forma de contágio; campanha integra pacote de medidas que serão lançadas no dia 28
(O Estado de S. Paulo, 09/11/2016 – acesse no site de origem)
O Ministério da Saúde vai lançar uma campanha de prevenção da zika voltada para o risco de transmissão sexual do vírus. Embora relatos sobre essa possibilidade de contágio tenham sido reunidos nos últimos meses, esta é a primeira vez que o governo fará um alerta sobre a possibilidade de contaminação por meio de relações sexuais desprotegidas. Até agora, todas as campanhas tinham como único foco a prevenção do Aedes aegypti, mosquito transmissor da doença.
Até junho, 10 países já haviam relatado à Organização Mundial da Saúde (OMS) a ocorrência de transmissão de zika por via sexual. Os casos comprovados se deram por meio da transmissão de homens com sintomas da infecção para suas parceiras. A contaminação pode ter ocorrido antes, durante ou depois do início do sintoma do vírus.
Diante da constatação, a OMS recomendou na época que parceiros sexuais de mulheres grávidas que vivessem ou regressassem de zonas com transmissão de zika deveriam adotar medidas de prevenção: o uso de preservativos masculinos ou femininos ou sexo sem penetração. A OMS recomendava ainda que homens em idade reprodutiva que vivessem em áreas com transmissão do vírus (o caso do Brasil), considerassem o adiamento da gravidez e usassem de forma sistemática preservativos.
A campanha voltada para a transmissão sexual do zika integra um pacote de medidas que o governo prepara para lançar no dia 28. Além da peça, o Ministério da Saúde vai lançar um protocolo para atendimento de casos suspeitos de zika, dengue e chikungunya, um manual para acompanhamento de gestantes com suspeita de contaminação por um desses vírus e novos parâmetros para definição de microcefalia – agora considerada como um dos sintomas da síndrome congênita do zika. “Não será um cavalo de pau, uma mudança drástica na definição, mas ajustes necessários”, definiu Woanderson Oliveira, coordenador geral de Vigilância e Reposta às Emergências de Saúde do Ministério da Saúde.
O diretor do departamento de Doenças Transmissíveis do Ministério da Saúde, Eduardo Hage, afirmou que a equipe está monitorando o número de casos de nascimento de bebês com microcefalia. Até o momento, afirmou, não houve registros de aumentos expressivos de casos.
“A proporção de bebês com a má-formação está abaixo de dois casos a cada 10 mil nascidos vivos”, disse. “Isso em todos os Estados do País.” O indicador, completou, está bem abaixo dos 48 casos por 10 mil nascidos vivos registrado no Nordeste no auge da epidemia de microcefalia, no fim de 2015.
O comportamento destoa daquilo que era esperado por epidemiologistas. A expectativa era de que nascimento de bebês com microcefalia aumentasse principalmente no Rio, onde foi registrada uma epidemia de zika no início do ano. O receio era de que os casos começassem a aumentar a partir de junho. Não foi o que ocorreu. Nem no Rio nem em outros locais onde houve também um registro importante de casos de zika, como Mato Grosso.
Embora o comportamento esteja estável e já tenha passado o prazo de seis meses depois do aumento de casos de zika nessas regiões, a vigilância continuará intensa. “Consideramos o período de maior risco de nascimento até fevereiro, quando deve se completar um ano do início do aumento de casos de zika nessas regiões”, disse Hage.
Quanto mais o tempo passa sem que o número de casos de microcefalia aumente de forma expressiva nesses locais, mais ganha corpo a hipótese de que haja outros fatores relacionados à infecção da gestante por zika. “São várias as suspeitas, várias linhas investigativas. Mas até agora, nada foi comprovado”, completou.
O que se sabe, no entanto, é que a área compreendida entre Pernambuco, Rio Grande do Norte, Paraíba e Sergipe apresenta uma prevalência de crianças com anomalia muito superior do que o restante do País. Uma análise feita por Fátima Marinho de Souza, do Ministério da Saúde, mostra que no Nordeste, sobretudo nessa região, houve um aumento significativo da prevalência de anomalias congênitas no sistema nervoso. Entre 2006 e 2014, o indicador era de 0,8 no Nordeste. Em 2015, ele passou para 2,2, uma variação de 178,8%.
A análise mostra ainda que, das crianças diagnosticadas com microcefalia em 2015, 37% tinham baixo peso e 26% tinham 37 semanas ou menos de gestação. Filhos de mães jovens (51% tinham até 24 anos), com baixa escolaridade e predominantemente negras (pretas e parda). Diante desses casos, a equipe do Ministério da Saúde se prepara agora para estudar outras causas possíveis que possam estar associadas ao maior risco de microcefalia na região. Entre os fatores avaliados estão a qualidade da água, questões ambientais como esgoto e lixo e determinantes socioeconômicos.