Estudo divulgado recentemente pela agência de pesquisa de mercado e inteligência Hello apontou que o interesse das mulheres por política cresceu desde últimas eleições presidenciais, em 2014, até agora. Segundo o documento, quando questionadas sobre o assunto, em 2014, apenas 9% se diziam muito interessadas pelas eleições. Em 2018, o percentual chegou a 20%. O interesse masculino aumentou também: em 2014 foram 10%, e em 2018, foram 30% dos homens os que se declararam com muito interesse.
(Universa, 22/09/2018 – acesse no site de origem)
“Isso se deve muito a um processo histórico. A história do Brasil nunca foi muito favorável à participação feminina na política. Desde o interesse simples ao voto, até a candidaturas ou ocupar cargos altos”, explicou o filósofo político Luiz Bueno. Atualmente, as mulheres somam mais de 52% do eleitorado brasileiro.
Para a cientista social Thaís Grencevicius, trata-se de uma questão cultural. Ela acredita que a mulher ainda é vista como a principal responsável por cuidar da família e acaba preferindo se afastar de temas gerais como política, que ainda é tida como “assunto de homem” para muitos. Ela disse que há, também, uma preocupação em conseguir e manter a posição no mercado de trabalho:
“Lembremos que as mulheres ainda estão em condições desfavoráveis em relação aos homens, tendo menos oportunidades de promoção e menores salários. Tivemos, também, nos últimos anos, a ampliação do número de mulheres chefes de família, unindo muitas vezes o papel de principal de mantenedora financeira e mãe solteira. Isso demanda maior tempo e foco, ao meu ver”, disse a socióloga.
“Além disso, o ingresso das mulheres na política não tem sido tão eficaz quanto se esperava com as cotas para os partidos: temos ouvido notícias sobre mulheres que são lançadas como candidatas, mas tem sua verba eleitoral destinada a um homem, candidato indicado pelo próprio partido”, denunciou Thaís.
Socióloga especializada em psicologia, Elaine da Cruz, discorda que as mulheres sejam menos interessadas em política do que os homens. “Mulheres têm tantas outras preocupações…Se preocupam com a vida, a ética, as relações, segurança, a mobilidade para ir e vir – e tudo isso é política – com suas carreiras e suas famílias”, esclareceu. “Assim, diante de outras tantas demandas, essa política das instituições parece ser a discussão do sexo dos anjos e não leva a nenhuma prática que elas percebam como positiva para suas vidas, algo que não
as ajudam no dia-a-dia, ao contrário: dificulta.”
A pesquisa, chamada de “Mapa Político”, ouviu 1.993 pessoas em 75 cidades das cinco regiões do Brasil. A margem de erro é de 2,2 e o índice de confiança, de 95%. Os dados foram coletados em julho e agosto de 2018.
Uma vez que as mulheres sempre tiveram maior escolaridade – 16% das eleitoras pelo menos iniciaram o ensino superior, contra 12% dos homens – o interesse delas por política deve continuar a crescer, diz Bueno, que também é professor de filosofia contemporânea e ética na FAAP. “A tendência é que esse interesse siga crescendo. Pela minha experiência política, os temas relacionado à mulher estão sendo bastante dialogados nesse momento, trazendo maior interesse delas por essas questões”, opinou. “Acredito que esse interesse foi despertado também com o auge da crise política de 2016, especialmente com o impeachment da Dilma. Bem representadas ou não, tínhamos uma mulher como presidente, a primeira do Brasil. Isso também faz parte desse conjunto.”
Mulheres de esquerda ou direita?
O conjunto a que ele se refere contempla a maior instrução das mulheres, maior debate público sobre questões femininas e maior acesso à informação por parte delas — causas do crescimento do interesse feminino nas eleições. “O que me chama a atenção no crescimento desse interesse é que não há concentração dessas mulheres na esquerda ou na direita. Elas estão razoavelmente empatadas. Isso é excelente, é assim que se constrói uma democracia e a torna mais rica”, comemorou o filósofo.
Thaís Grencevicius concorda e acrescenta outro fator que pode ter que pode ter influenciado nesse interesse: deixá-las mais próximas do assunto. “Creio que as redes sociais, em parte, facilitam esse acesso da mulher ao debate, pois tratam de redes abrangentes com as quais temos contato todos os dias – diferentemente de um fórum de discussão de um partido político, por exemplo”, observou.
Entre os homens é o oposto: uma minoria é sem posicionamento político — apenas 17%. Eles se assumem mais de direita, 33% dos homens contra 24% das mulheres. Na esquerda, um empate: 26% se identificaram com a ideologia – tanto do eleitorado feminino quanto do masculino. Já em relação às idades, é possível dizer que a partir dos 45 anos há uma forte tendência de ampliação do campo da direita e daqueles que declaram não ter posição política, além de uma tendência de diminuição daqueles que se dizem de centro. Já a partir dos 60 anos, aumenta ainda mais a quantidade de eleitores sem posição política, além de uma tendência forte de queda dos simpatizantes da esquerda.
Preocupação com os problemas do país
Elas são “menos interessadas em política do que os homens, mas mais atentas aos problemas do País”, diz o mapa. Mudaram sua principal preocupação de Saúde, em 2014, quando 91% das mulheres deram essa resposta, para Violência e Criminalidade em 2016, com 70%. Em 2018, 77% das eleitoras voltaram a responder que a Saúde no Brasil é sua principal aflição. Em segundo lugar, está a Educação, com 57%, e logo após Violência e criminalidade, com 54%, e Desemprego, com 47%.
Quanto aos temas polêmicos, mulheres adotam posturas ainda mais conservadoras que as dos homens, e cresceram em quantidade de um período para outro. Na época das eleições de 2014, 6 das mulheres eram contra a descriminalização da maconha, contra 55% dos homens. Em 2018 elas já são 67%, versus 62%. Cerca de 73% das mulheres era contra a legalização do aborto em qualquer situação, frente a 71% dos homens. Em 2018, elas são 79%, contra 78% dos homens.
Os três especialistas ouvidos pelo Universa concordaram que a postura dessas mulheres continua conservadora como sempre foi. Na opinião de Bueno, uma das razões da revelação dessas posições é o aparecimento das mulheres de direita como figuras representativas de uma ideologia. Além disso, ele disse que as pesquisas atuais são mais assertivas nas questões, como não eram há alguns anos. “Isso tem a ver com valores morais sem os quais uma democracia não se sustenta. Muitas pessoas temem romper com valores básicos com medo de uma desestruturação da sociedade atual do jeito que é. Esses valores estão enraizados em sentimentos”, analisou. “Por serem valores morais, nem sempre são conscientes, mas a tendência é preservar o que nós conhecemos, porque temos medo de mudanças drásticas”, completou.
A única questão em que elas flexibilizaram as posições foi o caso da união civil entre pessoas do mesmo sexo. Em 2014, 46% das mulheres eram contra, e agora