O Ministério Público do Estado de São Paulo lançou a cartilha “Namoro Legal” para ajudar e até evitar que as mulheres se tornem vítimas de agressão. O material está disponível online e qualquer pessoa pode acessar.
No documento há dicas para ajudar a identificar uma relação saudável ou abusiva. Uma adolescente vítima de um relacionamento abusivo conta que no começo o namorado era carinhoso, mas depois começaram as agressões física e psicológica, do jeito que costuma ocorrer na maioria dos casos.
“Eu gostava dele e sentia que ele gostava de mim também. Mas ao longo do tempo ele foi mostrando a verdadeira identidade dele, o caráter, se mostrando ciumento, não queria que eu tivesse contato com homem, que saísse sozinha”, relata.
Essa adolescente, que prefere não se identificar, diz que demorou para perceber o que estava acontecendo e, depois, ainda relutou a aceitar.
“Eu também não conseguia levar adiante o término, a gente terminava e depois de alguns dias reatava. Ele dizia que iria mudar, que me amava. Mas infelizmente quando a gente está envolvida com sentimento, a gente fica cega. Eu era cega no relacionamento. Eu enxerguei que aquilo não era normal e que eu não merecia passar por aquilo quando eu percebi que ele não gostava de mim, que aquilo não era amor”, conta.
Segundo a psicóloga Silvia Adelaide de Martini, relacionamentos abusivos têm ficado cada vez mais comuns, principalmente entre as mulheres, e muitas vezes elas nem percebem que estão passando pela situação.
“As pessoas estão acostumadas, acham às vezes até por falta de informação, que relacionamento abusivo está ligado à agressão física. Essa, muita das vezes, é a última parte. Até chegar na agressão física, os homens já deixaram a autoestima reduzida a zero, já machucaram de maneira mais profunda, já isolaram dos amigos e da família, e colocaram essa em constrangimento, porque o relacionamento acaba e elas ainda se culpam”, destaca a psicóloga.
Diante deste cenário, O Ministério Público decidiu lançar a cartilha, com uma linguagem simples, o material é separado em sete tópicos de como um namoro saudável deve ser.
A ideia é que a cartilha seja compartilhada em grupos ou nas redes sociais, como forma de prevenir relacionamentos abusivos.
A promotora de justiça do Ministério Público de São Paulo que produziu a cartilha “Namoro Legal”, Valeria Scarance, diz que para ela as dicas trazem mensagens muito importantes.
“A expectativa da cartilha, da campanha, é destacar esses comportamentos de dominação, ainda no caminho da dominação, antes de uma violência. Ensinando mulheres jovens e adolescentes a impor limites, a reconhecerem suas bases de segurança e a saberem diferenciar as condutas normais das abusivas”, explica Valeria.
Uma pesquisa realizada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostra que 42% das mulheres brasileiras que têm idade entre 16 e 24 anos sofreram algum tipo de violência no ano passado. Por isso, para a promotora, ações como essa são essenciais.
“Nós temos percebido que a violência tem atingido mulheres cada vez mais jovens, que essa violência tem evoluído rapidamente para a morte, o que não acontecia antes. Essa constatação foi uma das inspirações para a cartilha. O último levantamento, também do Fórum de Violência Pública, revelou a ocorrência de 1133 feminicídios, que é um número muito alto, e o Brasil segue como 5º país que mais mata mulher no mundo e o 4º em número absoluto de casamento infantil”, destaca.
A psicóloga ressalta ainda que as pessoas precisam aprender a identificar quando estão passando pela situação, mas é preciso estar aberto pra isso.
“É importante observar cadê os amigos, a roupa, se é assim que eu sou. É dessa maneira que eu me comporto, se eu posso ser eu mesma na companhia dessa pessoa. Eu posso falar como eu falo naturalmente. São pequenos comportamentos que, quando você junta, não sabe se a pessoa é verdadeiramente quem ela é. Então elas chegam muitas vezes no consultório totalmente perdidas, sem referencial de uma pessoa que foi lá atrás e se perdeu em nome do falso amor”, enfatiza a psicóloga.
O delegado Eliardo Jordão explica que qualquer pessoa pode e deve ajudar parentes e amigos que estão passando por essa situação. “A gente tem caso de denúncias que são feitas por terceiros”, ressalta.
Ele destaca ainda que, quando a pessoa for à delegacia registrar o boletim de ocorrência, pode ser solicitada a medida protetiva para a vítima. “Esses dados com os elementos a gente encaminha ao poder judiciário. Uma vez que ele decreta, a gente dá o cumprimento”, diz o delegado.