(Folha de S. Paulo| 30/03/2021 | Por Católicas pelo Direito de Decidir)
Está para ser votado no Senado o Projeto de Lei (PL) 5435/2020, intitulado Estatuto da Gestante, apresentado pelo senador Eduardo Girão (Podemos-CE). Ao contrário do que o nome aponta, contudo, o PL é completamente desfavorável aos direitos reprodutivos das mulheres: institui a chamada “bolsa-estupro” e elimina o direito ao aborto legal já permitido em lei há 80 anos.
Dentre os muitos pontos problemáticos do PL, destacamos dois em particular. O primeiro é o que define a proteção da criança desde a concepção, pretendendo conferir um status jurídico ao feto, o que, na prática, significaria que seria um sujeito de direitos, tal qual uma criança nascida com vida. Nunca houve, contudo, consenso na comunidade científica definindo a concepção como sendo o início da vida humana. É claro que há vida mesmo antes da concepção, nos espermatozóides, no óvulo. Mas não se sabe quando essa vida passa a ser pessoa. Há cientistas que consideram que isso só ocorre no quinto mês de gestação, quando o cérebro é formado, já que só aí pode haver consciência – usando esse raciocínio é que determinamos que a pessoa humana deixa de ser pessoa quando há morte cerebral. Tampouco entre teólogos é consenso que a vida se inicie na concepção.
Essa proposta, na prática, inviabiliza toda e qualquer possibilidade da realização do aborto legal, independentemente de sua motivação e do tempo de gravidez. Ou seja, retira alguns dos poucos mecanismos de proteção da vida, da saúde mental e da saúde física com que podem contar as gestantes brasileiras, uma vez que proíbe a interrupção da gravidez sob qualquer circunstância. Coloca as mulheres e meninas na condição de meras receptoras e reprodutoras de embriões, como se não tivessem vínculos emocionais com sua gestação, e as sujeita a todo tipo de arbitrariedade e sofrimento que essa condição pode lhes trazer.