(Folha de São Paulo| 12/05/2021 | Por Cida Bento)
Nos últimos anos, foi possível acompanhar uma sequência de prisões de políticos da elite carioca, todos envolvidos em esquemas de corrupção. Em menos de cinco anos, foram cinco governadores e um prefeito.
Um desses ex-governadores se referiu à Rocinha, favela carioca, como “fábrica de produzir marginal”. No entanto, é ele quem está preso há anos, acusado de ter lavado milhões de reais, de propina obtida de fornecedores do estado, e ainda chegou a propor para a população favelada e negra o aborto como política de prevenção da criminalidade.
Governadores são administradores públicos que demandam ou aprovam planos para órgãos policiais “barbarizarem” as favelas, exercendo uma política da morte, com tantos assassinatos, conforme observamos no Jacarezinho.
No entanto, muitas vezes são eles, bem longe das favelas, que cometem os “crimes de colarinho branco”. Em sua grande maioria, esses crimes são praticados por homens, que não são jovens, com anos de experiência no ambiente em que praticam o crime. Não são pobres ou periféricos, são brancos, têm influência social e principalmente poder, como sinalizei nesta coluna, meses atrás. E raramente são punidos, pois, segundo estudiosos, a dificuldade está em enxergar esse perfil de pessoas como perfil de um criminoso.
“Temos uma Justiça tipicamente de classe: mansa com os ricos e dura com os pobres. Leniente com o colarinho branco e severa com os crimes de bagatela. Meninos da periferia com quantidades relativamente pequenas de drogas são os alvos preferenciais do sistema”, escreveu o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Luís Roberto Barroso em 2019.
Assim é que o tráfico lidera as imputações para o encarceramento, pois 54% dessas pessoas cumprem penas de até oito anos, o que demonstra que o aprisionamento tem sido a única política diante de pequenos delitos. E o foco são negros e negras: 64% da população prisional é negra, sendo que 2 em cada 3 mulheres presas são negras (67%), como nos mostra Dina Alves.
Cida Bento
Diretora-executiva do CEERT (Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades), é doutora em psicologia pela USP