Com dois movimentos, novo Governo redireciona política de direitos reprodutivos

A ministra da Saúde, Nísia Trindade, durante cerimônia de investidura no cargo.

Ministra da Saúde, Nísia Trindade. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

20 de janeiro, 2023 Gênero e Número Por Giulliana Bianconi e Vitória Régia da Silva

Atuação conjunta dos Ministérios da Saúde, das Relações Exteriores, das Mulheres e dos Direitos Humanos e Cidadania retira país de aliança conservadora e tem aprovação da sociedade civil, enquanto desperta indignação da extrema-direita no Congresso

A retirada do Brasil da Declaração do Consenso de Genebra nesta semana e a revogação pelo Ministério da Saúde da Portaria vigente no país desde 2020 que obrigava médicos a informarem o aborto à autoridade policial são atualizações de posicionamento vigorosas diante das redes nacionais e internacionais. Informam ao mundo que o Governo Lula está disposto a garantir os direitos das mulheres, incluindo o direito ao aborto nos casos previstos na legislação brasileira.

O Consenso de Genebra é uma aliança consolidada em 2020 por 32 países, após a publicação de documento assinado por todos eles que exclui o aborto como opção para as mulheres e defende o “fortalecimento do papel da família”. A abordagem conservadora da extrema-direita que tenta colocar em oposição família e direito ao aborto é um recurso narrativo central do grupo que se define “pró-vida” e nega qualquer possibilidade de interrupção de gravidez. Por isso, ao desligar o Brasil esta semana do Consenso de Genebra, o governo defendeu, por meio de nota oficial assinada por quatro ministérios, o respeito às diversas configurações familiares. A saída da aliança veio com a pressão e com o acúmulo de informação da sociedade civil e de organizações feministas. Desde 2021, nove organizações repercutiam relatório, que detalha a gravidade do Consenso. A publicação serviu de referência para o Governo de Transição nos últimos meses.

“A nota conjunta informando que o Brasil deixa de ser signatário do chamado Consenso de Genebra é muito importante em vários sentidos porque sinaliza para a sociedade brasileira e para os atores internacionais, inclusive para as Nações Unidas, que o Brasil está retornando aos seus compromissos com os parâmetros estabelecidos nas Conferências dos anos 90 sobre as matérias relativas à saúde reprodutiva, incluída a definição do aborto como grave problema de saúde pública e a recomendação do artigo 106K da Plataforma de Ação de Pequim sobre a Mulher, que pede a revisão de legislações punitivas, mas também a definição do programa sobre o reconhecimento das várias formas de família”, analisa a pesquisadora e co-coordenadora do Observatório de Sexualidade e Política (SPW), Sonia Corrêa. Ela, que esteve nas conferências dos anos 90 e segue acompanhando e pesquisando políticas sexuais e de direitos reprodutivos, destaca que o Brasil foi um dos protagonistas nas negociações que décadas atrás levaram a esses consensos e definições.

A aliança internacional que seguirá na ativa buscando restringir os direitos reprodutivos das mulheres e defendendo um conceito de saúde da mulher distante da autonomia sexual foi liderada em 2020 por seis países, entre eles Brasil e Estados Unidos. A articulação por aqui se deu com o Ministério das Relações Exteriores, à época do ministro Ernesto Araújo, e com o agora já extinto Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Damares Alves, então à frente da pasta, enviou vídeo para a cerimônia que selou o Consenso.

“A saída do Brasil do Consenso de Genebra é um movimento importante para marcar um novo posicionamento do Brasil na agenda internacional dos direitos humanos que no Governo Bolsonaro estava alinhada a países ultraconservadores e que são reconhecidamente violadores de direitos humanos, como Arábia Saudita e Hungria, que agora está liderando o Consenso. É uma sinalização muito positiva para dentro e para fora de que a gente está novamente comprometido com os direitos humanos e sexuais reprodutivos. A partir de agora vamos conseguir caminhar melhor para seguir internalizando esses compromissos internacionais com políticas públicas voltadas para garantia dos direitos humanos”, avalia a coordenadora-executiva do coletivo Nem Presa Nem Morta, Laura Molinari.

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