(Brasil 247, 05/12/2014)Preocupado com a gravidez precoce e indesejada nas favelas, Davison Coutinho entrevistou, para o Jornal do Brasil, a professora Marina Moreira, diretora do Núcleo de Estudo e Ação Sobre o Menor da PUC-Rio e o advogado e pedagogo Audir Bastos Filho, da mesma instituição. “É triste a realidade da quantidade de jovens que engravidam na adolescência nas favelas de nossa cidade. No Brasil, cerca de 19,3% das crianças nascidas vivas em 2010 eram filhas de adolescentes. Em nossa concepção a gravidez precoce reflete a pobreza, falta de acesso à escola, ensino de baixa qualidade, problemas sociais das favelas, falta de estrutura familiar, falta de informação e violência sexual”, disse Coutinho.
Para os entrevistados, a escola é um dos fatores determinantes para esse quadro que vivemos: “Nos tempos atuais, o que ocasiona esse desajuste familiar é uma escola desestimulante e sem método que não atende as ansiedades dos jovens frequentadores, criando um vazio muito grande dentro do binômio família-comunidade”, que concluem com uma saída: “Educação plena em todos os sentidos, sem rodeios, sofismas: clara. Que aposte nos jovens um futuro promissor e visível num momento de crise existencial. Afinal, esse jovem abandonado à incerteza do amanhã busca um hoje melhor conflitando e antecipando etapas da vida.
Ter ou não ter, eis a questão: gravidez, adolescência e favela
A gravidez indesejada, do ponto de vista biopsicossocial, traz a adolescência à tona de um discurso já, sabido e reconhecido. Nas favelas, a gravidez indesejada tem ocasionado uma série de barreiras e dificuldades na vida de mães e pais que ainda não estão preparados para cuidar de um novo ser. A adolescência é um período do contraste entre ser criança e ter corpo de adulto. É o momento de experimentar novas experiências, e normalmente nesta fase que os adolescentes começam a entrar em contato com a sexualidade.
É triste a realidade da quantidade de jovens que engravidam na adolescência nas favelas de nossa cidade. No Brasil, cerca de 19,3% das crianças nascidas vivas em 2010 eram filhas de adolescentes. Em nossa concepção a gravidez precoce reflete a pobreza, falta de acesso à escola, ensino de baixa qualidade, problemas sociais das favelas, falta de estrutura familiar, falta de informação e violência sexual. Apesar da diminuição dos casos, os números continuam sendo altos em favelas (UNFPA). Essa gravidez faz com que as adolescentes tenham seus projetos de vida modificados, o que pode contribuir para o abandono escolar e a perpetuação dos ciclos de pobreza.
Com o objetivo de entender melhor a problemática dessa realidade na educação, entrevistamos dois especialistas preocupados com a temática. Professora Marina Moreira, diretora do Núcleo de Estudo e Ação Sobre o Menor da PUC-Rio e o advogado e pedagogo Audir Bastos Filho, da mesma instituição.
A gravidez na favela é diferente de outras?
A gravidez da favela estabelece uma afirmação masculina de ser o homem e feminina de poder ter o domínio do parceiro. Passa, nitidamente, uma forma preconceitual, até de concepção: de gestar um ser novo para um mundo que se descortina desta forma. Difícil tarefa para se resolver em uma comunidade onde faltam objetivos, escolas e perspectivas de futuro.
Como discorrer sobre gravidez em um ambiente com diversos problemas sociais?
A criança espera um ar puro e uma família e não um ambiente contaminado de resquícios e preconceito social. Espera-se que esta mesma criança não só cresça, mas apareça em outro cenário: mais humanizado, mais transformado, mais informado.
A favela dificulta o ambiente familiar, colocando a gravidez como um acidente que desestrutura o pouco que ainda existe. A menina mulher, também, não reconhece os atributos que o corpo oferece que não passam pela relação amorosa desestruturante e se auto afirma nessa relação. É chegada a hora de encarar o sexo com consciência e prevenção, não obstante as doenças sexualmente transmissíveis que estão ainda tirando vidas que se perdem na fragilidade.
Quais as implicações da gravidez na adolescência?
Em um primeiro momento a família, quando existe, assume a paternidade de criação afetiva de aquele ser. O abandono da escola, a vergonha, a baixa estima: o se esconder e o se arrepender de um passado presente.
Nos tempos atuais, o que ocasiona esse desajuste familiar é uma escola desestimulante e sem método que não atende as ansiedades dos jovens frequentadores, criando um vazio muito grande dentro do binômio família-comunidade. Daí a busca que confunde afeto com realização, o casal que ora busca entretenimento nos bailes e eventos sociais traduzem uma ansiedade incontrolável que acaba gerando uma falsa relação de realização que atribuir a mulher o atributo de oferecer satisfação.
Qual o caminho?
Educação plena em todos os sentidos, sem rodeios, sofismas: clara. Que aposte nos jovens um futuro promissor e visível num momento de crise existencial. Afinal, esse jovem abandonado à incerteza do amanhã busca um hoje melhor conflitando e antecipando etapas da vida.
Davison Coutinho, 24 anos, morador da Rocinha desde o nascimento. Bacharel em desenho industrial pela PUC-Rio, Mestrando em Design pela PUC-Rio, membro da comissão de moradores da Rocinha, Vidigal e Chácara do Céu, professor, escritor, designer e liderança comunitária na Comunidade.
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