(Luciana Araújo/Agência Patrícia Galvão) Em seu pronunciamento na tarde desta terça-feira (13) na Conferência Regional sobre População e Desenvolvimento da América Latina e do Caribe, a ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República, Eleonora Menicucci, destacou três tarefas que precisam ser assumidas pelos governos da região. Promover a autonomia econômica das mulheres, fomentar políticas que alterem a tradicional divisão sexual do trabalho e enfrentar de maneira decisiva o tema da violência de gênero.
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A conferência teve início na última segunda-feira em Montevidéu, no Uruguai. Organizado pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) e o governo uruguaio, o evento tem como objetivo avaliar os progressos do Programa de Ação da Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (CIPD), realizada na capital do Egito em 1994.
Eleonora citou ações do governo brasileiro que visam, como ressaltou a representante do Palácio do Planalto, transpor esses desafios. A Lei Maria da Penha (11.340/2006), que acaba de completar sete anos, a Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, a sanção à lei de atendimento às vítimas de estupro e o Programa ‘Mulher Viver Sem Violência’ foram destacados por Menicucci. Conheça aqui os “Compromissos do Governo Brasileiro com a Plataforma da Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento: Rumos para Cairo + 20”.
“O Brasil está convencido de que, embora seja considerável o progresso em diferentes áreas, ainda temos desafios para tornar realidade, em nossos países e região, a visão acordada no Cairo. Os progressos alcançados trouxeram novos desafios que compõem a agenda a ser enfrentada após 2014”, ressaltou.
Direito ao aborto – A ministra também falou sobre uma das principais reivindicações do movimento feminista na Conferência e afirmou que o governo brasileiro vem buscando garantir o direito da mulher ao seu próprio corpo. “No campo dos direitos sexuais e dos direitos reprodutivos, em consonância com o Plano de Ação do Cairo, a partir da noção de integralidade da atenção à mulher, buscamos garantir o direito ao livre exercício da sexualidade, ao planejamento reprodutivo, a atenção humanizada ao pré-natal, parto, puerpério e ao abortamento. Em 2012, por decisão da Suprema Corte, o Brasil estendeu a possibilidade de as mulheres interromperem a gravidez para os casos de anencefalia.”
Como caminho trilhado pelo governo Dilma para atingir tais objetivos, Menicucci citou a reativação da Comissão Nacional de População e Desenvolvimento, que reúne governo e sociedade civil para formular políticas que visem atender o Programa de Ação do Cairo (agenda de compromissos resultante da CIPD para promoção do desenvolvimento com respeito aos direitos humanos).
Leia abaixo a íntegra do discurso da ministra:
Em nome da delegação brasileira, gostaria de agradecer ao povo e ao governo uruguaio pela calorosa e solidária acolhida.
Gostaria ainda de parabenizar nossos países pela acertada decisão, tomada em 2012 em Quito, de transformar a Comissão Especial de População e Desenvolvimento em Conferência Regional sobre População e Desenvolvimento. E a CEPAL por, em seu 34ª período de Sessões, acolher com entusiasmo este novo órgão.
Queremos registrar e reconhecer o apoio decisivo do Fundo de População das Nações Unidas, para a realização desta Conferência.
Agradecer a importante contribuição da sociedade civil, em especial ao Movimento Feminista pela parceria na elaboração dessa nossa apresentação.
A I Conferência Regional sobre População e Desenvolvimento, além de aprofundar o compromisso da Região com o Programa de Ação de Cairo, será a contribuição de nossos países para a celebração do vigésimo aniversário da Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (CIPD), que acontecerá em 2014 na Sessão especial da Assembleia Geral nas Nações Unidas. O desenho de Conferências regionais deve servir para fortalecer a dimensão universal dos temas de população e desenvolvimento.
Nesses quase vinte anos, o Brasil, como nossos vizinhos da América Latina e do Caribe, tem-se empenhado para promover crescimento econômico com justiça social e assegurar o bem-estar comum, por meio do reconhecimento pleno das inter-relações entre direitos humanos, população, recursos, meio ambiente e desenvolvimento sustentável.
O Programa de Ação do Cairo dá sentido a esses objetivos e oferece-nos uma agenda de desenvolvimento integral e ainda atual, firmemente apoiado na perspectiva da promoção e da proteção dos direitos humanos. É esta agenda que nos une hoje.
A CIPD estabeleceu, como compromissos, pontos necessários à construção de um mundo mais justo e melhor para nossas populações. Fez-nos compreender a necessária inter-relação entre dinâmica populacional, os desafios do desenvolvimento e a promoção da igualdade de gênero, geracional, regional, étnica e racial.
O Brasil está convencido de que, embora seja considerável o progresso em diferentes áreas, ainda temos desafios para tornar realidade, em nossos países e região, a visão acordada no Cairo. Os progressos alcançados trouxeram novos desafios que compõem a agenda a ser enfrentada após 2014.
É por esta razão que a Presidenta Dilma Rousseff reativou a Comissão Nacional de População e Desenvolvimento, que contribuirá para a formulação de políticas e para a implementação de ações integradas relativas à população e ao desenvolvimento. Sua composição, ao reunir 14 órgãos do governo federal e 9 entidades da sociedade civil, reconhece a transversalidade dos temas abordados e o engajamento que requerem.
Como em muitos outros países de nossa região, as últimas décadas marcam uma notável transição demográfica no Brasil. A sensível redução da fecundidade e a ampliação da expectativa de vida abriram uma janela de oportunidades para o aproveitamento do chamado bônus demográfica, com resultados positivos para um maior crescimento e desenvolvimento sustentáveis e para a redução das desigualdades sociais. Nosso governo não abre mão da tríade crescer-desenvolver-incluir, cada vez mais com a consolidação de direitos.
A transição demográfica apresenta novos desafios para nossos países. É preciso fortalecer as políticas tanto para a juventude como para o envelhecimento da população. O Brasil vem desenvolvendo políticas para a juventude, com características distintas e ações afirmativas que variam de acordo com aspectos sociais, culturais, econômicos e territoriais. Esta concepção é norteada pelas noções fundamentais de oportunidades e acesso aos direitos, para oferecer e garantir aos jovens e as jovens mulheres oportunidades na construção de uma sociedade mais justa e cidadã.
O envelhecimento afeta de forma diferente e desigual a população segundo a sua situação de classe, raça, etnia, gênero, bem como de acordo com sua inserção no mundo do trabalho, produtivo ou reprodutivo, formal ou precário. É muito diferente envelhecer nas cidades ou nas regiões rurais.
A contínua crise econômica nos países desenvolvidos e avanços logrados por nossas sociedades e governos têm contribuído para reversões importantes nos fluxos migratórios de alguns países de nossa região. No Brasil, por exemplo, temos atraído o retorno de emigrantes e a vinda de imigrantes estrangeiros em resposta à melhoria da situação econômica e social. Isso exige políticas adequadas que reconheçam os direitos e a dignidade humana dos migrantes. O governo brasileiro tem trabalhado em âmbito interministerial para definir ações e programas no sentido da melhoria das condições de vida e trabalho e garantia dos Direitos Humanos dos migrantes.
O governo tem trabalhado sem tréguas, para coibir o trabalho escravo e o tráfico de pessoas, particularmente de mulheres e crianças entre os países que fazem fronteira com o Brasil.
Para além de 2014, julgamos ser necessário aprofundar a discussão sobre as migrações internacionais, de maneira a reforçar o respeito aos direitos humanos. É, portanto, imprescindível incorporar as mudanças produzidas pela transição demográfica na formulação de políticas públicas de forma sistemática, tornando-as mais consistentes com o contexto populacional.
Nossa experiência nacional aponta para a importância de incluir a perspectiva de gênero e da igualdade no conjunto das políticas públicas e fortalecer os mecanismos nacionais de políticas para as mulheres. Na agenda da erradicação da pobreza são fundamentais as políticas de igualdade de gênero, pois o ônus da pobreza atinge as mulheres de maneira desproporcional. O Brasil tem fortalecido os programas de enfrentamento à pobreza e de garantia dos direitos ao trabalho. O Congresso Nacional aprovou em 2013, por unanimidade, mudanças constitucionais radicais que ampliam e igualam os direitos sociais e trabalhistas das Trabalhadoras Domésticas com todos os trabalhadores.
É necessário:
• promover a autonomia econômica das mulheres, reduzir as disparidades de gênero no mundo do trabalho e consolidar e articular a maior presença de mulheres nos espaços de poder e de decisão.
• fomentar políticas que alterem a tradicional divisão sexual do trabalho – diminuindo o tempo despendido pelas mulheres na reprodução da vida – é um passo essencial para a igualdade entre mulheres e homens.
• Enfrentar, de maneira incisiva, o tema da violência de gênero. Nesse campo o Brasil tem avançado sistematicamente, desde a promulgação de Lei Específica sobre esta forma de violência – Lei Maria da Penha, até a implementação de Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres e, recentemente, a sanção pela Presidenta Dilma Rousseff da lei que garante o atendimento integral às vítimas de violência sexual, assegurando inclusive a oferta de contraceptivos de emergência. Em março de 2013 o governo federal lançou o Programa Mulher Viver Sem Violência com volumosos recursos, e está entregando duas unidades móveis para os estados, para enfrentamento a violência nas áreas rurais, campo e floresta.
No campo dos direitos sexuais e dos direitos reprodutivos, em consonância com o Plano de Ação do Cairo, a partir da noção de integralidade da atenção à mulher, buscamos garantir o direito ao livre exercício da sexualidade, ao planejamento reprodutivo, a atenção humanizada ao pré-natal, parto, puerpério e ao abortamento. Em 2012, por decisão da Suprema Corte, o Brasil estendeu a possibilidade de as mulheres interromperem a gravidez para os casos de anencefalia.
Para nós, tem sido uma prioridade a redução da morbidade e mortalidade materna. Programas do governo brasileiro reduziram a mortalidade materna em 51 por cento. Permanecemos comprometidos com o alcance da meta definida nos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio.
A saúde é um direito de todos e dever do Estado, garantido pela Constituição brasileira. Nesse sentido, temos trabalhado para ampliar e fortalecer o Sistema Único de Saúde – SUS, que é público, integral e universal, baseado na equidade de gênero, raça, etnia e de orientação sexual.
Ainda em consonância com o Plano de Ação do Cairo, o Brasil aprovou recentemente o Estatuto da Juventude que é um marco para o reconhecimento dos jovens como sujeitos de direitos universais, geracionais e singulares. O Estatuto adota o princípio da proteção integral, promove a autonomia e a emancipação dos jovens, valoriza sua participação social e política, e o diálogo e o convívio com as demais gerações. Garante, ademais, importantes direitos como a livre orientação sexual, a igualdade de gênero, raça e etnia e a liberdade religiosa.
Em nossa região, persistem sérios desafios para a eliminação da discriminação racial, étnica e por identidade de gênero e orientação sexual. Povos indígenas e população afrodescendente continuam a figurar entre os que mais sofrem com a pobreza e a violência. Mulheres negras permanecem em situação de maior desvantagem nos indicadores sociais, políticos e econômicos. Continuaremos enfrentando o racismo institucional no acesso ao ensino, no atendimento a saúde, no acesso ao mercado de trabalho, na melhoria da segurança publica, entre outros. Nesse contexto, a redução dos índices de homicídio entre os jovens negros constitui prioridade.
Em nome do Governo brasileiro, convido todos os países de nossa região a reafirmar o compromisso com todas as metas e ações acordadas na Conferência Internacional de População e Desenvolvimento, avançando.
Os progressos que conseguimos em matéria de população e desenvolvimento estão em sintonia com o Programa de Ação do Cairo. Não há como retroceder! Temos o compromisso de enfrentar os novos desafios com a determinação de avançar. Sabemos que para isso precisamos fortalecer a democracia, ampliar espaços de participação direta da sociedade, garantir a laicidade do Estado – condição necessária para uma sociedade plural.
O Plano de Ação do Cairo e sua implementação contou e conta com a contribuição decisiva e sistemática das instituições acadêmicas, das diversas organizações da sociedade civil e dos movimentos sociais. O governo brasileiro reconhece que avanços somente serão atingidos em parceria com a sociedade civil.
Os países das Américas, ao aprovarem a Convenção Interamericana Contra Toda Forma de Discriminação e Intolerância, reafirmaram o reconhecimento da diversidade, no campo da identidade de gênero e da orientação sexual. Esta é uma questão de direitos humanos e como tal deve ser tratada. Reforçaremos a promoção e a proteção dos direitos sexuais de mulheres e homens, crianças, jovens e adultos.
Acreditamos que as metas do Programa de Ação do Cairo não podem ser alcançadas sem justiça social. Sua implementação integral depende da construção de uma sociedade justa, igualitária e livre da miséria, da discriminação e da violência.
Posso assegurar-lhe, Senhor Presidente, o firme compromisso do Brasil na busca desses objetivos.
Muito obrigada.