O que o desabafo de Jennifer Aniston nos diz sobre a imagem idealizada (e cobrada) das mulheres, por Juliana Domingos de Lima

13 de julho, 2016

(Nexo, 13/07/2016) Atriz de ‘Friends’ fala do assédio da mídia e das insinuações que ligam a felicidade feminina a filhos e casamento

“A perseguição e objetificação que eu venho sofrendo em primeira mão há décadas refletem o cálculo deturpado que fazemos do valor de uma mulher”, escreveu a atriz americana Jennifer Aniston em um artigo para o jornal digital “Huffington Post”, publicado na terça-feira (12).

No texto, ela trata do impacto simbólico dos tabloides sobre como as mulheres são vistas na sociedade e sobre quais padrões estão sendo ensinados aos jovens.

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Para que fique claro, por Jennifer Aniston (HuffPost Brasil, 13/07/2016)

Aniston diz que a mulher não deve ser cobrada por sua situação conjugal ou pela ausência de filhos. Defende que as mulheres sejam vistas como seres completos em si mesmos, com poder de decidir sobre sua aparência e felicidade.

A cobrança por uma gravidez acompanha Aniston há anos. Em 2004, o programa de humor americano “Saturday Night Live” ironizou a abordagem dos paparazzi em um esquete com a participação da própria atriz.

Em meio a outras celebridades assediadas no quadro de humor, a pergunta “quando você vai ter um bebê?” era direcionada repetidamente a ela pelo fotógrafo-ator.

A perseguição dos paparazzi e o escrutínio da vida privada da atriz já eram constantes no início dos anos 2000, mas ganharam outro tom depois do rompimento com o ator Brad Pitt, de quem se divorciou em 2005. Os tabloides passaram a explorar a narrativa de uma mulher abandonada e arrasada sem o companheiro.

O foco na aparência

Aniston ganhou visibilidade com a personagem Rachel Green, da série “Friends”, que interpretou durante as 10 temporadas, entre 1994 e 2004.

Protagonizou dezenas de produções em Hollywood como “Separados pelo Casamento”, de Peyton Reed, “Ele Não Está tão Afim de Você”, dirigido por Ken Kwapise, e “Marley & Eu”, do diretor David Frankel. Por “Cake: Uma razão Para Viver” (2014), de Daniel Barnz, papel que ficou conhecido por “desembelezá-la”, recebeu boas menções da crítica.

Na ocasião, a atriz se posicionou contra o sexismo em Hollywood: “Só quando deixa de ser fisicamente atraente em um papel uma mulher é reconhecida e ganha algum respeito”.

O foco na aparência e a assimetria no tratamento de homens e mulheres de Hollywood pela mídia voltam a aparecer no texto para o “Huffington Post”.

O ‘manifesto’ de Jennifer Aniston em 4 pontos

COMO AS MULHERES SÃO VISTAS

“Se para algumas pessoas aí fora eu sou algum tipo de símbolo, está claro que sou um exemplo da lente pela qual nós, como sociedade, enxergamos nossas mães, filhas, irmãs, esposas, amigas e colegas. A objetificação e a atenção minuciosa à qual submetemos as mulheres é absurda e perturbadora. O modo como sou retratada pela mídia é um simples reflexo de como enxergamos e retratamos as mulheres em geral, avaliando-as em comparação com algum padrão deturpado de beleza”

ADEQUAÇÃO A UM PADRÃO

“A mensagem é que as meninas não são bonitinhas a não ser que sejam magérrimas, que elas não são merecedoras de nossa atenção se não tiverem cara de supermodelo ou de uma atriz de capa de revista, e isso é algo que todos nós estamos reforçando conscientemente. Esse condicionamento é uma coisa que as meninas então levam com elas para a idade adulta”

EXPECTATIVA IRREAL SOBRE A APARÊNCIA

“Usamos as ‘notícias’ sobre celebridades para perpetuar essa visão desumanizadora das mulheres, uma visão focada unicamente na aparência física, uma coisa que os tabloides convertem em um placar esportivo feito de especulações. Será que ela está grávida? Será que anda comendo demais? Ela ficou desleixada, deixou de se cuidar? Será que o casamento dela anda mal, já que a câmera detectou alguma ‘imperfeição’ física?”

MATERNIDADE COMPULSÓRIA

“O dinheiro e os recursos que estão sendo gastos pela imprensa simplesmente para tentar descobrir se estou ou não grávida (pela enésima vez… mas que diferença faz?) mostram como está sendo perpetuada essa ideia de que as mulheres são de alguma maneira incompletas, malsucedidas ou infelizes se não forem casadas e não tiverem filhos”

“Somos completas com ou sem parceiro, com ou sem filhos. Quando se trata de nossos corpos, nós, mulheres, podemos decidir por nós mesmas o que é belo ou não. Essa decisão cabe a nós e a mais ninguém. Vamos tomar essa decisão por nós mesmas e pelo bem das mulheres jovens deste mundo que nos têm como exemplos”

Uma crítica ao desabafo

Em sua coluna para o jornal britânico “Daily Mail”, o jornalista Piers Morgan fez uma ressalva ao desabafo de Jennifer Aniston e um apelo para que ela mostre sua aparência real na capa das revistas, como forma de combater a indústria da beleza e a ansiedade de meninas com relação à aparência e imagem corporal.

“Estrelas como Jennifer Aniston perpetuam deliberadamente o mito da ‘perfeição’ ao posarem para infinitas capas de revista em que a foto foi tão retocada que a celebridade, em alguns casos, fica irreconhecível. Uma vez que se expõe o corpo para ganho pessoal, receio que algum nível de escrutínio e de debate que vem com ele tenha que ser aceito”
Piers Morgan
jornalista britânico, ex-editor do News of the World e The Daily Mirror

Em 2016, a atriz recebeu o título de mulher mais bonita do mundo segundo a revista “People”, pela segunda vez. Aniston afirmou estar “lisonjeada” e sentir uma “alegria adolescente” com a notícia, estampando a capa da revista do mês de maio.

Piers Morgan cobrou que atriz exiba aparência real na capa das revistas (Foto: Reprodução)

O sexismo em Hollywood

Recentemente, mais atrizes americanas de renome têm falado sobre os embates que enfrentam no cotidiano da profissão.

Em 2015, Jennifer Lawrence levantou a questão da diferença de salários entre homens e mulheres contracenando nas mesmas produções, um dado que reproduz a realidade da desigualdade de gênero no mercado de trabalho em geral.

A proporção de diretoras e a diferença de idade nos pares românticos são outros sintomas da desigualdade de gênero na indústria cinematográfica americana.

Em uma sequência de humor do programa “Inside Amy Schumer” que foi ao ar em 2016, as atrizes Tina Fey, Julia Louis-Dreyfus e Patricia Arquette (todas acima dos 40 anos) falam sobre a existência de um “last fuckable day” – uma espécie de “prazo de validade” para as mulheres de Hollywood serem consideradas atraentes e, por esse critério, elegíveis para um papel de destaque.

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