(Terra, 21/07/2016) Quando você passa por uma banca de revistas ou assiste a comerciais na TV, você se identifica? Se a sua resposta for negativa, saiba que você faz parte de 65% da população feminina brasileira. Este dado, resultado de uma pesquisa do Instituto Patrícia Galvão, mostra que a maioria das mulheres do país não se reconhece na publicidade. Mas, quando elas foram ouvidas para saber quais elementos realmente as definem? A coordenadora do curso Gênero na Publicidade da ESPM de São Paulo, Ana Paula Passarelli, prontamente responde: “nunca”.
Para Ana Paula,os estereótipos são caixas de referência usadas pela publicidade, pelas empresas e mesmo pelas pessoas para contextualizar a ideia de como alguém é ou supostamente deveria ser. “Passamos décadas construindo um imaginário de mulheres donas de casa, ou extremamente sexualizadas ou em busca da beleza ideal”, reflete.
Ela lembra que o Brasil, atualmente, é recordista em cirurgias plásticas no mundo. Isso indica que a mídia pode ter contribuído enormemente na cultura pela modificação corporal, do ajuste ou da correção. “Nos tornamos uma fábrica de corpos perfeitos. Mas o que é ser perfeita? Para a sociedade, é ser magra, alta, pele clara, cabelos lisos e traços aristocráticos. Mas pergunte às mulheres a sua volta! Quantas se encaixam nesse modelo? Quantas se chateiam por não serem esse modelo?”, questiona a paulista.
Ana Paula acredita que apenas quando houver mais diversidade na publicidade será possível reverter este quadro. Para ela, o reforço que a mídia faz para a construção desse ideal de beleza já deveria ter ficado no passado. “A publicidade tem um papel pragmático muito definido: ser um conjunto de mensagens persuasivas para formar opinião sobre determinada marca ou produto. As agências pareciam ter encontrado o conjunto perfeito: transferir características de algo que o consumidor gosta para a mensagem principal. Logo, o que mais se vê na publicidade é o imaginário masculino orientando a construção do que é ideal para o homem.”
Na maior parte das peças publicitárias, as mulheres são estimuladas diariamente a acreditar que devem se encaixar em referências. “Na verdade, somos diversas em cores, cabelos, comportamentos, carreiras e desejos. A roda do estereótipo só quebra se aqueles que a alimentam mudarem”, acredita.
Marcas evidenciam a beleza natural
Para conversar com uma mulher nos dias de hoje é preciso, primeiramente, entender suas posições e crenças e falar a mesma língua. E isso significa acompanhar as mudanças dos últimos anos. A mesma pesquisa do Instituto Patrícia Galvão mostrou que 60% das entrevistadas consideram que as mulheres ficam frustradas quando não se veem neste padrão.
Logo, colocar uma mulher sexualizada não é mais a receita perfeita ao lado de qualquer produto. Usar o corpo feminino com o único intuito de sedução também não é mais fórmula de resultado. Ana Paula acredita que as marcas que respeitam as diferenças estão ganhando cada vez mais espaço.
“E vamos ter recortes ainda melhores pela frente, especialmente sobre as questões de gênero e a não-binariedade. Quem ainda divide o público-alvo essencialmente entre homens e mulheres precisa rever urgentemente o próprio modelo de negócios, porque nem mulheres, nem homens, nem gays, nem transexuais e tantas outras possibilidades de gênero podem ser colocadas em caixas de referência daqui pra frente”, afirma Ana Paula.