(Veronica Heringer, para o Blog do Noblat) “São as mulheres consideradas humanas? Se o são, por que somos exploradas comercialmente e enviadas da Tailândia em containers para trabalhar em bordéis em Nova Iorque? Por que nossas genitálias são cortadas para nos “purificar”? Quando mulheres serão realmente consideradas humanas? Quando?” Catherine A. Mackinnon, feminista, advogada e ativista pelos direitos humanos em Are Women Human?
Durante os anos em que vivi no Brasil, nunca me considerei uma feminista. O Canada mudou isso em mim.
O feminismo moderno está bem distante da imagem das mulheres que “odeiam” homens. Muito pelo contrário. A discussão é em torno da igualdade entre seres humanos e como anos de desigualdade transformaram a vida daquela do sexo feminino mais complicada do que a de seu contraparte.
Na última semana, o primeiro-ministro do Canadá Stephen Harper anunciou o corte de dezenas de programas da saúde feminina e demonstrou suporte à legislação que transforma a prostituição em crime.
Além disso, contrário a promessas de campanha, Harper declarou apoio a um estudo que tem como objetivo determinar o momento do início da vida humana no útero da mãe. Iniciativa vista como uma tentativa de trazer a discussão da criminalização do aborto de volta ao Parlamento.
O posicionamento do governo Harper não é motivo de surpresa para os canadenses. Os partidos políticos daqui tem ideologias muito bem definidas.
O Partido Conservador de Harper é o que o seu próprio nome diz, conservador. Durante anos lutou contra a legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo, e sempre negou qualquer iniciativa fora dos padrões tradicionais.
No entanto, mesmo sem surpreender seus constituintes, Harper foi surpreendido pela reação do seu eleitorado. Na quarta-feira, dia em que as últimas decisões foram anunciadas, protestantes se reuniram em Ottawa (capital do país) para demonstrar repúdio ao governo vigente.
Contrário à tradicional educação canadense, eleitores vêm discutindo o assunto de forma acalorada nas mídias sociais e jornais locais não poupam palavras na cobertura dos fatos.
Sempre ouço canadenses comentando os anúncios de Harper como It’s just politics (é só política). Por isso, surpresa ao perceber que o Canadá está interessado em acompanhar de perto o que acontece em Ottawa e discutir as decisões do primeiro-ministro à exaustão nos últimos dias.
Gradualmente, o país está se mobilizando na defesa do direito de escolha de suas mães, irmãs e filhas. Alguns mencionam a manutenção de um Estado laico, outros a liberdade de escolha.
Numa sociedade em que valores culturais estão sendo definidos e influenciados por diversas culturas, direitos fundamentais parecem ser o fator em comum entre muitos.
Veronica Heringer é jornalista formada pela PUC-Rio, estrategista em marketing digital e mestranda em Media Production pela Ryerson University. Atualmente desenvolve pesquisa em audiência e mídias digitais e escreve o blog Madame Heringer.com de Toronto. Escreve para o Blog do Noblat aos domingos.
Acesse em pdf: Cartas de Toronto: Sobre Feminismo e Política Canadense, por Veronica Heringer (Blog do Noblat – 29/04/2012)