(CFEMEA, 08/09/2015) A primeira semana de setembro de 2015 pode ser apontada até o momento como a conversão de esforços da bancada evangélica e conservadora para promover a criminalização do aborto de qualquer forma, e ao contrário do que defendem sobre “valorização da vida e da família”, os projetos tramitados possuem caráter discriminatório, machista e podem ser apontados como uma “caça às bruxas”.
Somente na quarta-feira, dia 3 de setembro, foram tramitados três projetos que trazem em sua ementa o fim dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres. O primeiro deles é já conhecido, trata-se do PL 478/2007 “que dispõe sobre o Estatuto do Nascituro”, que teve um requerimento para realização de uma audiência pública com a finalidade de debater o projeto, sugerida pelo atual relator, o Dep. Marcos Rogério (PDT-RO), que em falas anteriores já apontou seu voto ao dizer “que aborto é licença para matar inocentes”. Veja aqui
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Os próximos passos desse Estatuto é o de apresentação de parecer do relator e consequente votação do documento na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara Federal. Esse projeto ainda passará pelo plenário, onde os apelos dos conservadores liderados pelo presidente da casa, Eduardo Cunha, ganham ainda mais adeptos de membros das bancadas ruralista e da bala.
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O projeto do Estatuto da Família que a define a partir do núcleo bíblico homem e mulher foi o que mais teve repercussão na casa e na mídia. Em Comissão Especial formada só para debater e deliberar sobre esse Estatuto, PL 6583/2013, presidida pelo afilhado religioso, politico e financeiro de Silas Malafaia, dep. Sóstenes Cavalcante (PSD-RJ), que divide mesa diretora com Marcos Feliciano (PSC-SP), Rogério Marinho (PSDB-RN) e Silas Camara (PSD-AM), o projeto teve o parecer favorável do relator dep. Diego Garcia (PHS-PR) que afirma ver como “injustificável” o direito ao casamento civil igualitário e compara homossexualidade com o incesto, pedofilia e zoofilia.
E, para além do cerceamento do conceito de família e dos direitos conquistados pela comunidade LGBT, o Estatuto possui uma emenda, inserida ao final de 2014, que reafirma e reforça o acima citado, ao estender o direito à vida desde a concepção. Em voto separado na legislação anterior a ex-deputada federal Manuela D’avila disse:
“…a única emenda que o relator acatou atinge a nós mulheres e revela a insensibilidade do substitutivo para a violência sexual, como o estupro que vitima as mulheres. Ao inserir no art. 3º do substitutivo a expressão “direito à vida desde a concepção”, além de inocuidade manifesta de tal significado, contribui para a insegurança jurídica, pois está pacificado pelo STF o legítimo direito das mulheres interromperem a gestação quando decorrente de estupro, de fetos anencéfalos e quando põe em risco a vida da mãe, ao contrário do que faz a sugestão do relator.O substitutivo não se preocupa em adequar o projeto ao ordenamento jurídico sobre o tema, não só no que diz respeito aos direitos reprodutivos das mulheres, e do próprio conceito de família interpretado pelo STF, como nas outras conquistas jurisprudenciais e infraconstitucionais relacionadas à adoção, a direitos previdenciários, tributários etc.” (texto completo)
Mesmo com o pedido de vista, esse projeto deve ir à votação ainda nesse mês e tem caráter conclusivo. A ampla maioria conservadora e dependente do fiel evangélico Eduardo Cunha pode protagonizar uma vitória esmagadora mostrando a vontade de uma maioria fundamentalista.
Ainda, no dia 3 de setembro, foi apresentado o parecer do dep. Evandro Gussi relativo ao projeto de Eduardo Cunha que criminaliza a indução ao aborto, PL 5069/2013, modificando o código penal. Em seu relatório, ele diz “o objetivo de acrescentar o art. 127-A ao Código Penal, dotando o sistema jurídico pátrio de mecanismos mais efetivos para refrear a prática do aborto, que vem sendo perpetrada sob os auspícios de artimanhas jurídicas, em desrespeito da vontade amplamente majoritária do povo brasileiro”.
Importante destacar que este PL vai de encontro a toda a política regulamentada pelo governo, de Atenção as Meninas e Mulheres vítimas de Violência Sexual, e causa insegurança jurídica aos casos até agora previstos em lei para interrupção de gravidez, como nos casos de anencefalia, risco de morte materna e violência sexual.
Após a votação desse parecer, pela CCJC, a mesma comissão em que está o Estatuto do Nascituro, o projeto irá a plenário e provavelmente todos os apelos sobre a questão do aborto como crime à vida serão suscitados pela bancada conservadora.
Por fim e para mostrar que a articulação do projeto de sociedade conservadora da bancada evangélica é composta de várias frentes, o avanço da PEC 99/2011, do dep. evangélico João Campos (PSDB-GO) mostra como se é pretendido o efetivo retrocessos de direitos. Com essa PEC, as entidades religiosas poderão propor ação de inconstitucionalidade e ação declaratória de constitucionalidade de leis ou de atos frente ao Superior Tribunal Federal. Ou seja, casamento civil igualitário e aborto nos tipos previstos na lei podem sofrer retrocessos judicialmente.
Acesse no site de origem: Pautas conservadoras avançam no Congresso Nacional (CFEMEA, 08/09/2015)