As mulheres e as eleições, por Elena Landau

08 de setembro, 2014

(Folha de S. Paulo, 08/09/2014) Há duas semanas, Jandira Magdalena, carioca, 27 anos, saiu de casa e não voltou. Foi vista pela última vez entrando num Gol branco com placa ilegível. Seu destino: uma clínica de aborto clandestina.

Infelizmente não é um caso isolado. Dados da PNA (Pesquisa Nacional de Aborto) indicam que, ao fim de sua vida reprodutiva, mais de um quinto das mulheres no Brasil urbano fez aborto, com alta concentração entre as mais pobres e de baixa escolaridade. Não precisa ser um especialista para pensar em melhorar a informação sobre reprodução e sexualidade. Prevenindo o que nem sempre dá para remediar.

Três mulheres são candidatas à presidência, duas com chances reais, mas a cada debate me frustro com o desinteresse sobre política de gênero.

Eu não sou uma feminista e tive o privilégio de ter sido contratada grávida e ouvir do futuro chefe que “gravidez não é doença”. Trinta anos depois isso não deveria surpreender mais. Mas não é bem assim.

Mulheres não são minoria e querem igualdade de oportunidade. A agenda é ampla: discriminação salarial, violência, saúde, livre escolha, gravidez na adolescência e planejamento familiar. Assunto não falta. O que falta é interesse. Ou as candidatas estão aprisionadas à parcela conservadora do eleitorado. Lamentável.

No quesito violência, a Lei Maria da Penha foi um avanço inquestionável. Mas não tanto na prevenção dos abusos: ainda acontecem 4,4 assassinatos para cada 100 mil mulheres. Estamos na vergonhosa posição de 7º lugar do ranking mundial. Os casos de estupro são também assustadores. Segundo o Ministério da Saúde, em 2011 foram mais de 12 mil casos, conhecidos. A realidade deve ser muito pior porque é sabido que nem sempre a vítima de violência sexual faz qualquer denúncia, por medo ou vergonha. Elas têm motivo. Pesquisa do Instituto Patrícia Galvão e Data Popular revela que 85% dos entrevistados acham que denunciar parceiros gera ainda mais riscos de vida.

Terrível, não? Mas nossas candidatas parecem não se incomodar.

No trabalho, a discriminação continua. Lá se vão 20 anos desde o dia que ouvi “Ganha feito homem, mas trabalha feito mulher”. 28% das mulheres brasileiras não ganham feito homem, mas trabalham feito eles. Isso quando acham função equivalente. A taxa de desemprego em todo o país é maior entre elas. Com o silêncio das candidatas, não há razão para celebrar a presença feminina na corrida presidencial. É apenas simbólico.

Mas tanto faz, candidato ou candidata, presidente ou presidenta, todos deveriam abraçar essa agenda. Já dizia Ruth Cardoso: “A questão das mulheres não é das mulheres, é dos homens também, é da sociedade, é um problema de igualdade”.

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