O Dia Mundial da Água é celebrado todo 22 de março, desde 1993. A data foi lançada durante conferência da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre Meio Ambiente e o Desenvolvimento, a Eco-92. Com o intuito de fortalecer soluções para a crise hídrica e o saneamento, o Dia Mundial da Água é caminho obrigatório para o debate sobre racismo ambiental e as consequências geradas no cotidiano da população, principalmente às mulheres negras brasileiras – um dos principais grupos prejudicados pela falta dessas garantias, e que mais sofrem com os impactos que afetam o acesso à renda e à saúde.
A cada ano o Dia Mundial da Água traz consigo uma temática diferente. Em 2023 o tema abordado é: “Acelerando Mudanças – Seja a mudança que você deseja ver no mundo”, em referência à fábula do beija-flor que apaga o incêndio carregando gotas de água em seu bico, chamando atenção para a necessidade de uma colaboração mundial com o objetivo de reverter situações como a do Brasil.
Números
Apesar dos avanços obtidos ao longo dos anos, o país ainda continua ocupando rankings preocupantes no acesso à água tratada e ao saneamento básico. Dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), de 2020, apontou que 33,1 milhões de pessoas ainda não têm acesso à água tratada e 94 milhões não dispõem de acesso à coleta e tratamento de esgoto.
Já um levantamento do Instituto Trata Brasil mostrou que uma em cada quatro mulheres no país não tem acesso à água tratada ou ao acesso regular. O estudo também mostrou que o quantitativo de mulheres que moram em residências sem coleta de esgoto saltou de 26,9 milhões para 41,4 milhões no período entre 2016 e 2019, correspondendo a um aumento de 15,5% ao ano. Desse total, mulheres negras são as mais afetadas, realidade apontada através do perfilamento da privação do saneamento básico.
O estudo mostrou que um dos fatores que influenciam as chances de uma mulher não ter acesso a esses serviços diz respeito ao grau de escolaridade, sendo mulheres negras e indígenas os grupos com menores índices de escolarização, pertencendo, portanto, com mais incidência a famílias pobres em territórios periféricos. Contudo, o levantamento aponta que a universalização do saneamento básico é um caminho eficaz para retirar essas mulheres da situação de vulnerabilidade social. “Estima-se que 3 em cada 4 mulheres a deixar a condição de pobreza seriam pardas ou negras, o que ressalta o caráter inclusivo da universalização do saneamento”, diz trecho do documento.
Racismo ambiental
O cenário de desigualdade em que mulheres negras estão inseridas no Brasil é retrato de uma herança colonial que sempre puxou a população negra do país para um lugar de subalternização, o que dialoga diretamente com a questão do racismo ambiental vivenciada por esses grupos atualmente. “Costumo dizer que o conceito de racismo ambiental é relativamente novo para um problema muito antigo porque estamos denominando a falta de acessos a direitos e garantias fundamentais”, explica Juliane Lima, mestra em Desenvolvimento Urbano pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). “É um cenário muito antigo, desde o processo da abolição da escravatura, negando à população negra o direito à habitação, à educação, à saúde, saneamento”, continua.
O racismo ambiental diz respeito a práticas que, conduzidas por qualquer instância – seja ela governamental, política, econômica, etc – interfira racialmente de forma prejudicial o acesso “a condições ambientais de moradia, trabalho ou lazer de pessoas, grupos ou comunidades”. Ao que Juliane Lima complementa: “O racismo ambiental se configura pela ausência de direitos e garantias fundamentais da gestão pública em relação a determinado grupo social e racial. Os bairros periféricos pela dinâmica do racismo estrutural, por exemplo, têm menos acesso a direitos como à água potável e saneamento de qualidade”.
E quanto mais negro for o território mais se agrava a situação explicitando ainda mais a violência segregacionista ocasionada pelo racismo. Os dados trazidos pelo Instituto Trata Brasil mostraram que em 2019 15,8 milhões de mulheres declararam não ter acesso à água tratada, déficit elevado principalmente no Norte (40,7%) e Nordeste (19,8%), as regiões mais negras do Brasil.