Trabalho doméstico pode reduzir pena de mulheres, decide justiça

21 de fevereiro, 2024 Revista Piauí Por Felippe Aníbal

Cuidar da casa e da família não é um trabalho como outro qualquer? A pergunta foi feita por duas servidoras da Defensoria Pública do Paraná, e a resposta abriu um precedente para o país

No dia 29 de janeiro, uma segunda-feira, Ana Maria* estava em casa, em Guarapuava, no interior do Paraná, quando seu celular tocou. Do outro lado da linha, uma assistente social vinha trazendo boas novas: a Justiça havia concedido a ela uma remição de pena de catorze dias. Era uma ótima notícia para a paranaense de 47 anos, presa em regime domiciliar desde 2022, condenada a catorze anos de prisão. Mas era também uma novidade para o Brasil.

A lei brasileira determina que presos têm direito a remição de pena por trabalho ou estudo. O objetivo é ressocializar os detentos e garantir sua reinserção no mercado de trabalho. Três dias de trabalho (ou doze horas de estudo) equivalem a um dia a menos de prisão. Mas o conceito de trabalho é restrito: para os presos em regime semiaberto ou domiciliar, a Justiça costuma levar em conta apenas empregos formais, com patrão e carteira assinada. Casos como o de Ana Maria – uma dona de casa que passa os dias cuidando da filha de 11 anos e dos cinco netos – não são contemplados pela lei. Agora, pela primeira vez, estavam sendo.

A decisão pioneira, publicada em 26 de janeiro pela juíza Liliane Graciele Breitwisser, da Vara de Execuções Penais de Guarapuava, abre um precedente para que outros tribunais do país considerem o trabalho doméstico tão importante quanto um trabalho formal. O novo entendimento pode ajudar a diminuir a desigualdade de gênero no sistema carcerário. Presas, diferentemente de presos, não costumam ter tempo para um emprego fora de casa.

Quem teve a ideia de flexibilizar a Lei de Execuções Penais não foi a juíza. Foram duas servidoras da Defensoria Pública do Paraná: Nilva Maria Rufatto Sell e Mariela Reis Bueno.

Tudo começou em novembro de 2022. Na Universidade Tecnológica Federal do Paraná, onde faz mestrado, Sell, uma assistente social de 40 anos, assistia a uma aula sobre “economia do cuidado”. O termo é usado para se referir ao trabalho doméstico, sublinhando seu caráter social. Enquanto ouvia as discussões em sala, Sell se deu conta: as mulheres que ela atendia cotidianamente na defensoria de Guarapuava tinham, sim, um trabalho. Eram, em sua maioria, presas em regime semiaberto ou domiciliar que passavam o dia em casa, cuidando de filhos e netos. Além de não serem remuneradas, não reduziam suas penas.

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