Os países europeus terão que incluir a prostituição no cálculo do PIB

08 de junho, 2014

(El País, 08/06/2014) O Eurostat, o instituto estatístico europeu, está trabalhando para medir uma parte da economia ilegal, como a prostituição, o tráfico de drogas e o contrabando, para incorporá-la ao produto interno bruto (PIB) de cada país da União Europeia. Outros países europeus já o fazem. É o caso da Estônia, Áustria, Eslovênia, Finlândia, Suécia e Noruega, que incluem em suas contas públicas o impacto destes setores ilegais. O Reino Unido, por exemplo, já tem os resultados. Os números indicam que a prostituição, o tráfico de drogas e o contrabando supõem cerca de dez bilhões de libras da riqueza nacional, (37 bilhões de reais), 6% de seu PIB, segundo informou na semana passada a Oficina Nacional de Estatística britânica (ONS). “Há um regulamento da União Europeia (UE) que determina que uma parte da economia ilegal — prostituição, tráfico de drogas e contrabando — deve estar incluída no cálculo do PIB obrigatoriamente antes de 2016”, explica o Instituto Nacional de Estatística espanhol (INE).

Outros países nunca agregaram esta parte da economia em suas estatísticas oficiais. “É verdade que antes alguns países calculavam e não incluíam a informação. Mas agora será obrigatório”, explica o INE. A Espanha, a Itália ou a Bélgica aproveitarão a profunda mudança na forma de calcular o PIB — o censo será revisado e o regulamento contábil, o Sistema Europeu de Contas, aplicado em sua última versão, de 2010 — para agregar o impacto das atividades ilegais. Fontes governamentais asseguram que Bruxelas quer que os países repassem uma estimativa sobre o impacto de todas estas mudanças no PIB antes de agosto. A Espanha já informou que a mudança contábil e a revisão do censo terá um impacto positivo entre 1% e 2% sobre o PIB. A essa conta temos que acrescentar o efeito da economia “não registrada”.

Outdoor de um clube de prostituição em Valência. / JESÚS CÍSCAR

Dois técnicos do INE foram há alguns meses à sede da associação espanhola Hetaira. Esta organização, que defende os direitos das prostitutas no país, está situada em um pequeno local na rua Fuencarral, no centro de Madri. Ali conversaram com Elisa Arenas, trabalhadora social da fundação, porque queriam conhecer se tinha alguma estimativa sobre quantas meretrizes havia na Espanha. “É muito difícil fazer esse cálculo. Não há nenhum estudo sério sobre o número de pessoas que exerce a prostituição. Não existe”, respondeu Arenas, que reconstrói a cena. Os técnicos do INE foram embora com as mãos vazias, ou quase. Hetaria confirmou que atende cerca de 1.000 mulheres por ano. “Mas este dado não é comparável. É algo muito residual”, adverte Arenas.

No final do ano passado, José Roca, representante de Anela, a associação espanhola dos clubes de prostituição, recebeu um telefonema em seu escritório de Valência. Era o INE. Queriam saber se ele tinha dados de faturamento, custo e outras cifras do setor. A princípio, Roca pensou que era uma piada. Mas ao receber um e-mail com do INE viu que era sério. Pouco depois recebeu um questionário com algumas perguntas: “Quanto cobrava em média uma prostituta por serviço em 2002/2007/2012? Qual foi o número médio de serviços de prostituta por dia em 2002/2007/2012? Qual foi o faturamento médio em 2012 de um clube normal/pequeno (menos de 50 prostitutas) por alugar quartos?”. Roca respondeu o que pôde. “50/70/40”, à primeira pergunta. “6/8/4”, à seguinte. E “50 euros dia/prostituta por número de prostitutas”, sobre o faturamento médio de 2012 (153 reais).

“É impossível calcular”, explica Roca. “Qualquer cifra que dê é aleatória e subjetiva. Não há censo de clubes, nem de prostitutas, nem de custos médios, nem de serviços”, aponta este representante da associação dos clubes de prostituição. “É melhor que inventem a cifra”, conclui. Não existem cifras fiáveis sobre o número de prostitutas que há na Espanha.

Um porta-voz da Eurostat assegura que “todos os países da UE incluem estimativas da economia não-observada dentro de sua estimativa do PIB, a fim de proporcionar uma medida exaustiva do tamanho de sua economia”. E acrescenta: “Fazem isso há anos. A abrangência desta parte da economia ilegal foi requerida desde que o Sistema Europeu de Contas de 1995 (SEC 95), que entrou em vigor em 1999, foi aprovado”.

Não é nada fácil quantificar o impacto destas atividades sobre a economia, admitem fontes oficiais europeias, que justificam que, no entanto, existem metodologias para conseguir os dados. Por exemplo, explicam, para o tráfico de drogas, se levará em consideração a quantidade de estupefacientes apreendidos pela polícia. Se fará um cálculo aproximado sobre a percentagem do tráfico total e se extrapolará o número para obter uma aproximação do impacto da produção e do tráfico de drogas na economia. Desde o escritório estatístico europeu reconhecem a dificuldade para medir estes setores opacos. “Há alguma variação nas metodologias entre os países sobre como conseguir esta meticulosidade, mas, com o tempo, estão se harmonizando mediante o intercâmbio de boas práticas e as recomendações da Comissão Europeia”, explica a Eurostat. E lembram também que existe um acordo sobre os critérios metodológicos para estimar a prostituição e o tráfico de drogas. De fato, existe um documento na Eurostat chamado Como medir e estimar as atividades ilegais, que explica como atuar e dá fórmulas para fazer o cálculo.

Em 2012, a polícia espanhola apreendeu 21 toneladas de cocaína, 325 de maconha e 229 quilos de heroína com um valor aproximado de 2,7 bilhões de euros (8,8 bilhões de reais), quase 3% do PIB, segundo o valor não oficial que a polícia considera para cada substância. Fontes policiais consideram que a quantidade de droga apreendida supõe entre 10% e 15% do que este setor move, mas não existe nenhum relatório oficial nem extraoficial com dados sobre o assunto. Este cálculo, na verdade, é pouco rigoroso porque depende da pureza da droga e de como se valoriza: no atacado ou varejo. Para o contrabando, o método é parecido ao da droga. E na prostituição se calculará o número de pessoas que exercem a prostituição através das redes de clubes.

“Será difícil conseguir um dado que se ajuste à realidade. Terão que fazer hipóteses e valorações com as dificuldades que isso implica”, aponta Ángel Laborda, diretor da Fundação das Caixas de Poupança (Funcas em suas siglas em espanhol). “Não são mercados transparentes onde os preços se conhecem”, aponta. “O PIB é calculado trimestralmente e a estatística terá que refletir o valor do que foi produzido e as rendas geradas. Será muito complicado, porque não há forma de medir estas atividades trimestralmente”, diz Laborda.

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