(Época) “Com a eleição de uma mulher, as garotas passam a considerar a política como uma opção viável de carreira”, afirma Mark P. Jones, professor do Departamento de Ciência Política da Rice University, em Houston, no Texas (EUA). “No Chile, a eleição de Michelle Bachelet teve um forte efeito sobre como as mulheres, particularmente as mais jovens, viam a política e participavam dela. Podemos ver algo parecido acontecer no Brasil”, acredita Jones, coautor do livro Women in executive power: a global overview (Mulheres no poder executivo: uma visão global).
Pode ser que a eleição de Dilma Rousseff possa incentivar mais mulheres a seguir a carreira política. Por enquanto, porém, o caminho para o poder ainda é muito mais difícil para elas.
Se ao entrar na escola, meninos e meninas começam em igualdade de condições, com o tempo as coisas começam a mudar. Hoje, as mulheres representam quase metade da população economicamente ativa do país e são maioria nas universidades. Mas ainda ganham, em média, 40% menos do que os homens, segundo levantamento divulgado pelo Fórum Econômico Mundial. Pior, elas são minoria no topo da hierarquia corporativa: de 61 empresas que compõem o índice da Bolsa de Valores de São Paulo, apenas uma é dirigida por mulher, apurou a reportagem da Época.
Segundo o índice de desigualdade de gênero do Fórum Econômico Mundial, o principal problema para as brasileiras é justamente a representação política. Considerando outros aspectos, como acesso à saúde, à educação e à igualdade salarial –, o Brasil está na 85ª posição entre 134 países. Olhando apenas para a presença das mulheres no Congresso, o país cai para o 108º lugar no ranking.
“Os partidos políticos ainda resistem a uma nova e necessária divisão do poder”, afirma Lourdes Bandeira, professora de sociologia da Universidade de Brasília e subsecretária de Política para as Mulheres.
A deputada Iriny Lopes (PT-ES), uma das 45 mulheres entre os 513 deputados da próxima legislatura, diz que é mais difícil para as mulheres fazer campanha porque as empresas costumam doar menos dinheiro para candidaturas femininas. Outra dificuldade é lidar com o ambiente predominantemente masculino do Congresso. “Certa vez, uma colega parlamentar teve uma crise epilética no plenário. Ouvi um deputado dizer: ‘É um chilique!’.”
“Cinco barreiras que dificultam a ascensão das mulheres na política
1 – Há poucos modelos de mulheres bem-sucedidas
“Se as mulheres não veem outras ocuparem posições de poder, têm menos probabilidade do que os homens de considerar seguir a carreira na política”, diz Karen Kampwirth, professora de ciência política do Knox College, em Illinois. Daí a importância simbólica da vitória de Dilma Rousseff
2 – Mulheres no poder são muito fortes ou muito fracas
Se uma mulher chora, é fraca; se é firme, é mandona. Para Ilene Lang, presidente da organização feminista Catalyst, exige-se das mulheres um comportamento ideal que não é cobrado dos homens. “Ou elas são muito fracas ou muito duronas. Parece que nunca estão certas”
3 – Simpatia e competência são incompatíveis?
Segundo Ilene, uma das principais barreiras para a ascensão das mulheres é a percepção de que, para ser competente na liderança, uma mulher não pode ser amada. É provável que essa seja a explicação para “damas de ferro”, como as ex-primeiras-ministras Margaret Thatcher, do Reino Unido, e Golda Meir, de Israel, na política mundial
4 – A máquina dos partidos é controlada por homens
Embora exista desde 1997 a Lei do Batom, que estabelece uma cota de 30% de candidaturas femininas à Câmara, nas últimas eleições só 22% dos candidatos eram mulheres. “A estrutura político-partidária continua sendo muito restrita, com escasso acesso das mulheres”, diz Lourdes Bandeira, professora de sociologia da UnB
5 – Mulheres são avaliadas com maior rigor
Estudos em empresas revelam que as mulheres precisam mostrar resultados melhores, por mais tempo e com mais frequência do que os homens para subir. Na política, esse rigor se traduz em críticas que não são feitas aos homens. Se Dilma fosse um homem, haveria a mesma ênfase na falta de mérito pessoal e biografia do presidente eleito?”
Acesse: Sim, elas podem. Podem? (Época – 06/11/2010)
Leia também: As semelhanças de Dilma Rousseff e a princesa Isabel, a mulher pioneira no poder no Brasil (O Globo – 06/11/2010)