Assassinato de mulheres por armas de fogo cresce na maioria dos estados

11 de abril, 2019

Taxa de mortes de mulheres por armas de fogo aumenta em 17 das 27 unidades da federação entre 2006 e 2016, revela o Observatório da Mulher contra a Violência do Senado

(Agência Patrícia Galvão, 11/04/2019)

A taxa de mortes de mulheres por armas de fogo (homicídios e suicídios) no Brasil caiu em 2,4% entre 2006 e 2016. Embora pareça trazer uma boa notícia, a redução da violência letal contra mulheres com emprego de arma de fogo, esse número esconde uma situação preocupante: em 17 das 27 unidades federativas foi registrado aumento das taxas de homicídios de mulheres por armas de fogo no período analisado. Esse é o resultado do levantamento realizado pelo Observatório da Mulher contra a Violência (OMV) do Senado Federal, a pedido da Agência Patrícia Galvão.

Além de revelar uma grave disparidade regional nos registros desses assassinatos de mulheres, o resultado chama a atenção para a importância da análise de dados para orientar decisões relacionadas aos processos de formulação, implementação, avaliação e aprimoramento de políticas públicas.

No caso analisado pelo OMV, quatro dos cinco estados mais populosos do Brasil apresentaram uma considerável redução na taxa de mortes de mulheres por armas de fogo, seja em razão de homicídios ou de suicídios, entre 2006 e 2016. A queda dessas taxas em São Paulo (-59,2%), Rio de Janeiro (-41,3%), Minas Gerais (-26,5%) e Paraná (-32,2%) ajuda a explicar a redução na ordem de -2,4% do número de mortes por armas de fogo por 100 mil mulheres no Brasil no período considerado.

Contudo, esse dado esconde que a grande maioria dos estados apresentou um aumento alarmante dessas taxas. Em estados como Acre (+524,1%), Maranhão (+182,2%), Ceará (+165,2%), Rio Grande do Norte (+155,5%) e Roraima (+110,6%) verificou-se que a taxa de mortes de mulheres por armas de fogo em 2016 mais do que dobrou na comparação com 2006.

 


Mais armas, mais feminicídios

A análise desses dados é importante para subsidiar o debate em torno das possíveis consequências de decisões adotadas pelo atual governo para a segurança das mulheres. Isso porque a política de flexibilização da posse de armas de fogo, apregoada para dar maior segurança para a população, pode resultar em um aumento do assassinato e suicídio de mulheres em um contexto de violência doméstica e familiar, conforme mostra a campanha #ArmadasDeInformação.

Henrique Ribeiro, coordenador do Observatório da Mulher contra a Violência, lembra que estudo publicado em 2016 pelo Ministério da Saúde já apontou que mulheres identificadas como em situação de violência pelos serviços de saúde apresentaram 29 vezes mais chances de serem vítimas de assassinato ou de cometerem suicídio em comparação com a população feminina em geral. “Já li algumas reportagens que afirmam que estudo semelhante em vias de ser publicado pelo mesmo ministério trará um cenário ainda mais alarmante, em que mulheres vítimas de violência doméstica e familiar apresentam 150 vezes mais chances de sofrerem homicídio ou de cometerem suicídio.”

Essa reflexão leva a questionar se o maior acesso da população a armas de fogo não teria por consequência o aumento das mortes violentas de mulheres em situação de violência. Isso porque, em geral, o autor do homicídio no contexto de violência doméstica é o companheiro da vítima, aquele considerado um ‘cidadão de bem’ pela sociedade, e que, portanto, preenche o requisito para a posse de uma arma. E o coordenador do Observatório manifesta preocupação de que “o acesso à arma de fogo poderia levar a um aumento no número de suicídios de mulheres em razão de sofrerem violência doméstica”.

Importância dos dados para orientar políticas públicas

Dados confiáveis sistematizados em séries históricas são essenciais para dimensionar o fenômeno da violência contra as mulheres, permitindo contextualizar o debate e pautar as políticas públicas necessárias para enfrentar o grave quadro da violência de gênero no país.

Conforme aponta Henrique Ribeiro, o levantamento realizado pelo Observatório da Mulher contra a Violência, a pedido da Agência Patrícia Galvão, é apenas um exemplo simples de como a análise de dados pode ser útil ao desenvolvimento de ações governamentais mais efetivas. Na verdade, quanto mais informações puderem ser consideradas na análise, maiores as chances de se desenharem melhores ações. No caso das mortes de mulheres por armas de fogo, por exemplo, analisar informações em nível de município, ou mesmo de bairro, pode ajudar o poder público a evitar um maior número dessas mortes”.

Em março, o OMV lançou o Painel de Violência contra as Mulheres, uma ferramenta de consulta que sistematiza dados oficiais de homicídios, notificações de violência doméstica pelos serviços de saúde, ocorrências policiais e processos judiciais relacionados a casos de violência contra mulheres no Brasil e em cada estado nos últimos anos.

Nesse mesmo sentido, o Instituto Patrícia Galvão e o Instituto Avon lançaram em 2018 a plataforma digital Violência contra as Mulheres em Dados, que reúne pesquisas e dados recentes sobre a violência de gênero no Brasil, com foco na violência doméstica, sexual e online, no feminicídio e na intersecção com o racismo e a LGBTTfobia.

Embora estejam sendo produzidas cada vez mais pesquisas que reúnem evidências importantes sobre a urgência e gravidade da questão da violência de gênero, a subnotificação, que é um dos principais fatores que afetam a disponibilidade de dados e estatísticas sobre a violência contra as mulheres, e a disseminação de uma cultura de dados abertos ainda são grandes desafios no Brasil.

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